Título: Cabral e Cesar já ensaiam um novo duelo
Autor: Vasconcelos, Fábio; Medeiros, Lydia
Fonte: O Globo, 05/10/2008, O País, p. 14

Governador aposta na eleição de Paes para crescer no cenário nacional; Cesar, derrotado, anuncia candidatura ao governo.

Quando as urnas eleitorais forem fechadas hoje à tarde no Rio, as atenções já estarão voltadas para o dia 26 de outubro, data do segundo turno. É a partida de uma contagem regressiva para a reorganização das forças políticas na capital, após 16 anos de hegemonia do grupo do prefeito Cesar Maia (DEM). Por enquanto, nessa corrida, o governador Sérgio Cabral (PMDB) sai na frente. Se as pesquisas estiverem corretas, seu candidato, Eduardo Paes (PMDB), chega com folga à segunda fase, depois de largar com 10% das intenções de voto. Já Cesar não conseguiu transferir seu capital político-eleitoral à sua candidata, a deputada Solange Amaral (DEM), que deve ficar fora do segundo turno.

- Para Cabral, a vitória é indispensável. Se Paes vencer de forma consistente, terá cacife para um vôo mais alto em 2010, a reeleição ou mesmo compor uma chapa para disputar a Presidência - diz Marly Silva da Motta, coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas do Rio de Janeiro da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Prefeito tenta evitar hegemonia de Cabral

Apesar da iminente derrota, Cesar também faz planos para 2010, num esforço para evitar a proeminência política de Cabral no Rio. Em entrevista ao GLOBO, o prefeito anunciou que vai disputar o governo estadual. E justifica a decisão com críticas ao desempenho de Cabral no Executivo:

- Com esse fiasco de Cabral, (a disputa será) para o governo do estado, compulsoriamente.

A batalha será dura para Cesar. Na avaliação do cientista político Ricardo Ismael, do Departamento de Sociologia e Política da PUC, o prefeito não conseguiu transferir a Solange, segundo os institutos, nem mesmo o percentual de votos dos cariocas que julgam como regular a sua administração (em torno de 30%).

- O prefeito sempre teve uma capacidade muito grande de apresentar alternativas de políticas públicas inovadoras, responsáveis por sua eleição e reeleição. Ele esgotou essa capacidade. Seu eleitorado está indo na direção de Paes. Até aqui, o seu desempenho surpreende e amplia a força do governador - diz o cientista político, Marcelo Simas, pesquisador do CPDOC/FGV.

O desgaste do prefeito após mais de uma década e meia de poder levou Cabral a apostar na capital, já amparado numa aliança com o presidente Lula. Comprou briga no PMDB, chegou a se unir ao PT, mas conseguiu o apoio do partido para indicar Paes, novato na legenda, oriundo do PSDB. Segundo Marly Motta, o último governador do estado a investir na prefeitura do Rio como plataforma para a política nacional foi Leonel Brizola (1983-87 e 1991-1994) - ele controlou e venceu as disputas de 1985 (Saturnino Braga) e 1988 (Marcello Alencar). Cesar foi eleito em 1992.

- Nem Marcello (eleito governador em 1994) e muito menos o casal Garotinho tiveram expressão política na capital - afirma a professora.

Para Ricardo Ismael, a passagem de Paes ao segundo turno golpeia o grupo de Cesar, especialmente porque ele era afilhado político do prefeito:

- Devemos aguardar os próximos passos do prefeito. Muitos ex-prefeitos conseguem voltar ao poder, mesmo após uma derrota política importante. Momentaneamente, pode-se dizer que Cesar é o grande derrotado, e agora se abre espaço para um novo grupo político na capital.

A briga de Cabral para se impor é também interna. Com uma vitória de Paes, ele reduziria ainda mais o espaço do ex-governador Anthony Garotinho no PMDB. Como Garotinho não é um político da capital, os esforços de Cabral chegam ao interior:

- O governador entrou para valer na campanha do Paes. Tem se exposto bastante não só na capital, mas nas cidades da região metropolitana. Existe um cálculo político muito claro nessa questão. Cabral está procurando ampliar seu poder político para 2010 dentro do PMDB com o claro objetivo de reduzir o peso do deputado estadual Jorge Picciani e do ex-governador Garotinho. Mas vamos aguardar o segundo turno, pois haverá outro grupo político também disputando espaço na cidade - observa Ismael.

O PMDB enfrenta dificuldades na Região Metropolitana. Em Duque de Caxias, o candidato Washington Reis luta para vencer José Camilo Zito (PSDB), líder das pesquisas de intenção de voto. Em Nova Iguaçu, o PMDB de Nelson Bornier está em desvantagem em relação ao prefeito, Lindberg Faria (PT). Em Niterói, onde se aliou ao PT, o partido sairá derrotado.

Se eleito, Paes terá o desafio de se impor no PMDB

O PMDB é desafio também para Paes despontar como líder. Filiado há dois anos, após perder a eleição para governador, ele terá, se eleito, de tourear os diversos grupos do partido.

- O PMDB não é lugar para amadores e tem dificuldade de se abrir a políticos novos - diz Marly. - Paes terá de furar o bloqueio e se capacitar a formar, ele próprio, novas redes de poder. Sem proeminência, será um peão nas ambições de Cabral.

Para a cientista política Lucia Hippolito, independentemente do resultado das urnas, uma nova geração de políticos emerge desta eleição, ainda que não seja novidade para os cariocas:

- Os dinossauros estão deixando a arena. O novo é bem-vindo; queremos erros novos.

Já Renato Lessa, professor de teoria política do Iuperj, discorda e adverte que o novo prefeito lidará com forças antigas:

- A renovação é ilusória.