Título: Partidos x pessoas
Autor: Tabak, Flávio; Menezes, Maiá
Fonte: O Globo, 08/10/2008, O País, p. 3
Paes faz aliança com siglas de esquerda e Gabeira recebe apoio isolado de políticos.
De um lado, os partidos. De outro, figuras tradicionais da esquerda. Com o apoio do PT, que será oficializado hoje, Eduardo Paes (PMDB) garante a terceira legenda em torno de sua candidatura, mas sem a certeza da presença do maior símbolo do partido, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Enquanto isso, Fernando Gabeira (PV), que recebeu ontem a adesão do prefeito eleito de Niterói, Jorge Roberto Silveira (PDT), e da deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP), consolida a estratégia de atrair nomes fortes da esquerda. O PSB fechou com Paes ontem e o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, já anunciou que o apoio do PDT ao peemedebista é "natural".
Um almoço de uma hora e meia com Lula ontem, na Base Aérea de Santa Cruz, não foi suficiente para o peemedebista atrair o presidente para a campanha, frustrando a expectativa dos petistas, que começaram a costurar a aliança já no fim do primeiro turno. Paes, que durante o escândalo do mensalão chamou Lula de "chefe da quadrilha", disse que no encontro estava em pauta apenas o apoio do PT.
A aliança com o partido de Lula já tinha sido tema de encontro entre o governador Sérgio Cabral, deputados e secretários de seu governo, anteontem. O apoio a Paes era dado como certo no partido.
- Eu não estou pedindo ao presidente Lula que venha para cá pedir voto. Disse a ele que estava procurando o partido dele. Não constrangi o presidente no primeiro turno e não vou constrangê-lo no segundo - disse o candidato.
No encontro fechado, organizado por Cabral, o presidente disse a Paes que aguardaria o pronunciamento oficial de seu partido. Em entrevista de manhã, ao participar, em Angra dos Reis, da cerimônia de batismo da plataforma P-51 da Petrobras, Lula deu uma pista sobre o tom da conversa com Paes:
- Não vou discutir eleição municipal. Acabou a primeira fase. Na segunda fase, quando o partido fizer as alianças que tiver que fazer e precisar que eu participe de campanha, eu participo de campanha. Vamos aguardar pelo menos o partido tomar a decisão que tem que tomar.
Paes, depois do encontro, reafirmou o plano de formar um "arco de alianças", longe do "varejinho de conversas", em uma alusão à estratégia de Gabeira. Além de atrair o PT, o peemedebista dedicou atenção ao PCdoB e ao PRB. Ligou anteontem para Jandira Feghali e Marcelo Crivella, derrotados no primeiro turno. O PCdoB, que tende a apoiar Paes, decide amanhã a posição no segundo turno.
A agenda de Paes começou cedo. Depois de dar entrevista para um canal de televisão e tirar fotos para uma revista semanal, por volta das 8h, foi fazer campanha no calçadão de Campo Grande, na Zona Oeste. Durante a caminhada, recebeu uma ligação, deu meia-volta e entrou no carro que o levaria para a Base Aérea. De manhã, Paes negou que se encontraria com Lula, dizendo que o momento era apenas de conversar com o PT carioca. O esforço para despistar a imprensa, porém, não surtiu efeito. O carro de sua campanha e o da segurança foram vistos entrando na área militar, onde Lula tinha um "almoço privado" marcado para as 12h50m. O peemedebista não falou com os jornalistas, mas teve que esperar por quase três horas pela chegada de Lula e Cabral, que estavam em Angra dos Reis. Presidente e governador só chegaram ao local às 16h porque o tempo chuvoso fez com que a comitiva presidencial fosse de carro para a base aérea.
Paes: "A conversa foi excepcional"
Na saída, às 17h30m, alegando pressa para chegar ao encontro com o PSB, Paes disse que, antes de saber se vai contar ou não com Lula, espera a decisão do PT. Ao responder se era concreto ou não o apoio do presidente, Paes foi vago:
- Acho que sim. O governador Sérgio Cabral me convidou para almoçar com o presidente. A conversa foi ótima, excepcional. O presidente Lula vai apoiar os candidatos que os partidos da base apoiarem. Terei essa conversa com o PT amanhã (hoje). A coisa está muito bem encaminhada - afirmou.
Ao falar sobre a conversa, a primeira entre os dois desde que a campanha começou, Paes preferiu esquecer o tempo em que fazia críticas a Lula como relator da CPI dos Correios:
- Não vamos perder tempo com coisas do passado. Estamos olhando para o futuro, a prioridade é o Rio.
Para falar de adversários, porém, o candidato do PMDB teve boa memória política. Em Campo Grande, agradeceu a Deus por não ter o apoio do prefeito Cesar Maia. O DEM, partido do prefeito, decidiu anteontem se aliar a Gabeira.
- Chega de governar com microcomputador no colo. Essa lógica de governar assim, graças a Deus, não está apoiando a minha candidatura - disse Paes, que pretende também ter o apoio de "forças do DEM".
Já a lista de nomes que se agregaram à campanha do PV inclui, além de Jorge Roberto Silveira e Luiza Erundina, o deputado federal Índio da Costa (DEM), que participou da coordenação da campanha de Solange Amaral, e Soninha, candidata derrotada à prefeitura de São Paulo pelo PPS, e Beto Richa (PSDB), prefeito reeleito em Curitiba. Gabeira tenta atrair ainda o prefeito reeleito de Nova Iguaçu, Lindberg Faria (PT), para quem já ligou quatro vezes.
Ao anunciar ontem apoio a Gabeira, o prefeito eleito de Niterói negou que sua posição vá dividir o PDT, que deve fechar a aliança com o PMDB.
- Não há divisão. Por gratidão, tenho que apoiá-lo. Sou um homem de partido, mas como pessoa física vou apoiar o Gabeira. Ele seria extraordinário, o melhor prefeito para o Rio.
Jorge Roberto vai almoçar com Gabeira amanhã. Ao não se posicionar sobre o apoio a Paes, Lula, na avaliação do candidato do PV, o apóia indiretamente:
- Com essa neutralidade, ele (Lula) demonstra que vai ser amigo do Rio em qualquer circunstância. Acho difícil que o Lula suba no palanque do Eduardo Paes. Se ele ficar neutro, muito bem. Se ele subir no palanque, muito bem também. A preocupação do Lula na campanha é muito mais da imprensa - disse Gabeira.
Por trás da estratégia dos aliados de Paes está a tentativa de antecipar, na eleição do Rio, a discussão em torno de 2010. O ex-ministro Roberto Amaral, vice-presidente do diretório nacional do PSB, disse que um dos motivos do apoio é impedir o que chamou de "rearticulação udenista-conservadora-oligárquica que se estrutura a partir de São Paulo":
- Vamos travar aqui o primeiro tempo da campanha de 2010.
Alexandre Cardoso, presidente estadual do PSB, também deu um caráter nacional à decisão do partido:
- Não podemos permitir que se coloque um tapete para mais uma vez os paulistas aterrissarem aqui. Essa é a disputa nacional do PSDB e do DEM que está em São Paulo e do PSDB e do DEM que está no Rio, agora travestido com roupagem nova.
O tom é diferente do de Paes:
- O eixo é defender a parceria entre o governo federal e o municipal. Não é 2010 - disse ele.
O ex-governador Marcello Alencar, aliado de Gabeira, é contra a antecipação do debate nacional:
- Gabeira não quer que a atenção fique focada no problema nacional, nem quer polarizar com a Presidência da República. O melhor é se consolidar nessa posição vitoriosa do que antecipar o debate nacional.
COLABORARAM:Bruno Villas Bôas, Cássio Bruno e Paulo Marqueiro