Título: Dólar alto trava negociações para o Natal
Autor: Novo, Aguinaldo; Rangel, Juliana
Fonte: O Globo, 08/10/2008, Economia, p. 25

Varejo e indústria vão rever encomendas. Moeda subiu 5,14% ontem, para R$2,311.

O dólar teve ontem mais um dia de forte alta, desta vez de 5,14%, para R$2,311, a maior cotação desde maio de 2006. A rápida valorização da moeda - em 1 de agosto, valia R$1,559, ou seja, subiu 48,2% desde então - levou a maioria das empresas do setor de eletroeletrônicos a suspender novas vendas. Além disso, ameaça as encomendas já fechadas para o período do Natal, já que grandes redes de varejo também paralisaram as negociações para compra de mercadorias importadas ou com custos atrelados ao câmbio. Também os brinquedos sofrerão o efeito da crise. Segundo Eduardo Benevides, diretor-presidente da Associação Brasileira dos Importadores e Exportadores de Brinquedos e Produtos Infantis (Abrimpex), as previsões são de reajuste de 15% a 25% dos importados no Natal, na hora de o lojista repor estoques.

- Suspendemos temporariamente todas nossas vendas por absoluta impossibilidade de prever os desdobramentos da crise - afirmou o vice-presidente de Vendas da Semp-Toshiba, Caio Ortiz.

Dependendo do produto, o peso de componentes importados chega a ser de 90% dos custos. Num contexto de alta instabilidade do dólar, disse Ortiz, seria impossível determinar quanto disso deveria ser repassado para os preços. Mas ele avisa que o repasse virá:

- Queremos retomar as vendas o mais rápido possível, mas haverá um aumento substancial (de preços). Reajustes acima de 10%, por exemplo, são substanciais em qualquer língua.

Já o presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), Sussuma Honda, prevê a necessidade de renegociação de contratos que já haviam sido fechados para o Natal. Se, por um lado, a indústria vai querer repassar a alta do dólar, por outro, o varejo deve argumentar que o contágio da crise, marcada também pelo aperto no crédito, vai provocar uma retração de vendas. A crise levou a Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros) a rever, pela segunda vez, sua previsão de crescimento em 2008. Depois de começar o ano projetando até 15%, a entidade reviu esse número em agosto para 12%. Agora, fala entre 8% e 10%. Segundo o presidente da Eletros, Lourival Kiçula, os planos iniciais das empresas consideravam um dólar entre R$1,60 e R$1,70.

- Claro que ninguém mais acredita nesse patamar. Também acho que cotações de R$2,20 ou R$2,30 não vão se manter. Mas dificilmente vamos ficar abaixo de R$2.

Como estratégia, conta Kiçula, algumas empresas do setor já reajustaram seus preços entre 5% e 10% desde a semana passada. A entidade pretende reunir amanhã representantes do setor para avaliar a crise.

- A bordoada (com a alta do dólar) foi grande, e todos ainda estão meio atordoados - disse Kiçula, acrescentando que não seria possível repassar de uma só vez a alta de custos "sem estragar o Natal".

O aumento abrupto do câmbio representa risco para o controle da inflação, afirma o coordenador nacional do IPC-S (da FGV), Paulo Picchetti. A esperança, segundo ele, é que esse aumento do dólar possa ser compensado por outros efeitos, como a queda de preços das commodities e a esperada redução da demanda no mercado doméstico.

- Prever qualquer coisa para os próximos seis meses virou assunto de futurologista, e não de economista.

BC vende US$1 bi no mercado à vista

Ontem de manhã, para tentar acalmar os ânimos, o Banco Central (BC) ofereceu no mercado futuro US$1,370 bilhão em contratos de swap cambial (em que paga a variação do câmbio e recebe a dos juros). No mercado à vista, a cotação chegou a cair a R$2,17, mas voltou a subir com força. À tarde, o BC vendeu US$1 bilhão à vista, com cotação de R$2,30, com promessa de recompra, em janeiro. A demanda foi de US$700 milhões. O mercado movimentou apenas US$1,9 bilhão, abaixo da média diária de US$4 bilhões. Na Bolsa de Mercadorias & Futuros, ao atingirem o limite de oscilação de 6%, pela segunda vez em uma única jornada, os contratos de dólar deixaram de ser negociados das 15h47m até o fechamento do pregão, às 18h.

- As medidas do BC para aumentar a liquidez do mercado levarão um tempo até a implementação e estamos vivendo agora é o curtíssimo prazo. O que parece é que não tem dólar no mercado brasileiro. Tem gente precisando comprar e isso está levando a cotação para cima. Estamos num momento conturbado, com saída de investidores da Bolsa de Valores, o que aumenta a demanda pela moeda - disse o gerente de câmbio da corretora Liquidez em São Paulo, Francisco Carvalho.