Título: Seja feita a vontade de Deus, diz Crivella
Autor: Tabak, Flávio; March, Rodrigo
Fonte: O Globo, 06/10/2008, O País, p. 9

Candidato evita falar de futuro político, após passar o dia em campanha e sofrer hostilidades.

Recolhido em casa junto a familiares e amigos, o candidato Marcello Crivella (PRB) preferiu não acompanhar minuto a minuto a apuração dos votos. A notícia da derrota foi dada pelo coordenador da campanha, Isaías Zavarise, quando a apuração já atingia 94,75% das urnas. O candidato, que começou a campanha como líder nas pesquisas de intenção de votos, apenas comentou, vagamente:

- Que seja feita a vontade de Deus.

Em nota, Crivella reconheceu a derrota, mas preferiu não falar do seu futuro político e nem sobre quem pretende apoiar na disputa pelo segundo turno na cidade. Até o fim da noite, Crivella não tinha recebido ligação de nenhum dos dois candidatos que irão para o segundo turno.

"Neste triste momento em que meu partido amargura um inesperado revés eleitoral, é na obstinada vocação de servir e nos mais altos ideais de luta em favor do nosso povo mais carente, que encontramos a força que nos anima, acalenta e consola". Na nota, Crivella aproveitou para agradecer "o apoio estupendo que recebemos de nossa incansável militância, a devotada confiança de nossos eleitores", e terminou reafirmando seu "compromisso pelo engrandecimento do Rio".

Crivella começa o dia em território inimigo

O último dia da campanha de Crivella começou em território inimigo: a Zona Sul, reduto de Fernando Gabeira (PV), onde ele votou logo cedo. O candidato passou o dia em peregrinação pelas comunidades carentes das zonas Norte e Oeste, áreas em que se considerava mais forte.

Crivella votou no Clube dos Marimbás acompanhado da mulher, da mãe, da filha Raquel e do neto Daniel, que entrou com ele na cabine de votação. Crivella levava uma Bíblia nas mãos. No caminho, foi hostilizado por eleitores, simpáticos a Fernando Gabeira (PV).

- Com todo respeito, seu Crivella, espero que o senhor perca - disse um dos eleitores, ao abordar o candidato.

Após votar, Crivella seguiu para a Favela Mangueira, onde foi bem recebido pelos moradores. Desrespeitando a proibição de fazer boca-de-urna, seus correligionários distribuíram santinho, enquanto o candidato cumprimentava eleitores. O coordenador da campanha disse que, se houve boca-de-urna, foi espontânea.

Ao volante, Crivella comete infrações de trânsito

Antes de chegar em seu apartamento na Barra, Crivella dirigiu o próprio carro de campanha a partir da Rua Luiz Coutinho Cavalcanti, em Guadalupe, e cometeu diversas infrações de trânsito. O senador avançou cinco sinais fechados, vários deles na Rua Edgard Werneck, em Jacarepaguá, além de subir a calçada da Rua Carolina Machado, em Marechal Hermes, para cortar caminho. Na Rua Xavier Curado, trafegou pela contramão.

Crivella desmontou, nas duas últimas semanas, a imagem que se esforçou para criar ao longo dos 90 dias de campanha. No horário eleitoral, afirmava que iria governar para todos, mas priorizando os mais pobres. Na última semana, porém, foi para a rua dizer que havia dois candidatos com chances. O dos ricos, da Zona Sul e da Barra da Tijuca. E o candidato dos pobres, do povão. E que os ricos ficassem com o candidato deles, e os pobres com ele, Crivella.

A promessa de arrumar o Rio também foi desfeita. Num domingo, participou de passeata contra a intolerância religiosa para demonstrar que não tem preconceito. Depois, Crivella disse em debate que não aceita a união entre pessoas do mesmo sexo.

Antes de perder votos para Gabeira e Paes, Crivella apostou suas fichas em duas estratégias principais: investir no eleitorado mais pobre das zonas Norte e Oeste da cidade, e demonstrar que não representa a Igreja Universal do Reino de Deus, da qual é bispo licenciado, para as classes média e alta.

Para obter os votos da classe média que contribuíram para deixá-lo de fora nas outras disputas, Crivella organizou, junto com sua mulher, Sylvia Jane, mais de 200 reuniões domiciliares antes e durante na Zona Sul. Sempre na tentativa de reduzir seus índices de rejeição, Crivella lançou, no primeiro dia de campanha, uma carta compromisso afirmando que não mistura política com religião, com a orientação do marqueteiro Duda Mendonça. Num dos itens, o candidato do PRB prometeu que não nomearia representantes da Universal na prefeitura.

COLABOROU: Luiz Ernesto Magalhães