Título: Pesquisas: institutos erram e trocam acusações
Autor: Aggege, Soraya
Fonte: O Globo, 07/10/2008, O País, p. 18

Resultados foram diferentes em São Paulo, Rio, Minas e Bahia; para historiador, metodologias terão que ser revistas.

SÃO PAULO. Os dois principais institutos de pesquisas do país, Ibope e Datafolha, não acertaram os resultados das urnas em algumas cidades. Os casos mais notórios e distantes da média de 2 a 3 pontos percentuais de margem de erro ocorreram no Rio, em São Paulo e Belo Horizonte, segundo analistas políticos. Para o cientista Marco Antonio Villa, as três capitais se tornaram um verdadeiro "Triângulo das Bermudas" na política nacional por causa das pesquisas. Ele avalia que os eleitores podem ter alterado suas opções porque receberam informações erradas, principalmente no Rio.

- As pesquisas são fontes importantes para a democracia, são parte do processo eleitoral. Podemos chegar a 2010 em uma situação de descrédito sobre as pesquisas de opinião, o que é muito negativo - disse Villa.

Polarização leva eleitor a voto útil

O caso mais grave foi registrado no Rio. Quando o Datafolha já mostrava o crescimento de Fernando Gabeira (PV), o Ibope continuou informando o eleitor que a polarização se dava entre Eduardo Paes (PMDB) e Crivella (PRB). Gabeira chegou a acusar o Ibope de estar a serviço do PMDB.

- O que aconteceu agora, nas urnas, mostra que o candidato tinha alguma razão. Há algo de errado na metodologia do Ibope. Quando se aponta uma polarização, o eleitor tende a exercer o voto útil - disse Villa.

Já em São Paulo, os dois institutos colocaram Marta Suplicy (PT) na liderança, e as urnas deram a primeira colocação para o prefeito Gilberto Kassab (DEM). O Ibope chegou a confirmar a liderança de Marta em pesquisa de boca-de-urna (feita no dia da eleição).

Em Belo Horizonte, Márcio Lacerda (PSB) aparecia muito à frente de Leonardo Quintão (PMDB), nos dois institutos, mas, nas urnas, a diferença ficou em apenas 2 pontos.

- Parece que em Minas os caciques se acertaram, mas se esqueceram de combinar com os eleitores. E os institutos não captaram os eleitores. Creio que os institutos terão que rever suas metodologias- disse Villa, lembrando que ocorreram diferenças acentuadas também em Porto Alegre e Salvador.

Em entrevistas ao GLOBO ontem, os diretores dos dois institutos negaram erros e trocaram acusações, principalmente por causa do Rio. O Datafolha avalia que foi o único a detectar o crescimento de Gabeira na reta final.

- Se não houvesse o Datafolha, a surpresa no Rio seria muito maior. E também seria outro resultado, porque eleitores da Jandira migraram para Gabeira. É claro que a pesquisa influenciou e isso é bom, é informação. No Rio, além de definir o candidato, o eleitor escolheu em qual instituto de pesquisa deve confiar- disse o diretor do Datafolha, Mauro Paulino.

Já o Ibope acusa o Datafolha de ter criado uma "onda" pró-Gabeira. O instituto teria elevado a estratificação social dos entrevistados, na análise do Ibope, e, com isso, encontrou mais eleitores de Gabeira, concentrados entre os mais estudados. Com a divulgação da pesquisa, mais eleitores migraram para o candidato, segundo o Ibope.

- É só analisar o Datafolha entre 5 de julho e 4 de outubro: o eleitor enriqueceu cerca de 10%. Ou seja: o Datafolha subiu o perfil da renda familiar e da escolaridade. Acho esquisito mudar uma amostra assim. Por isso, não foi erro do Ibope. O Datafolha criou uma "onda" que ajudou Gabeira - retrucou Márcia Cavallari, diretora de atendimento e planejamento do Ibope Inteligência.

Quanto às outras duas capitais do "Triângulo das Bermudas", os dois institutos também divergem sobre os desacertos. Ambos concordam, no entanto, em um ponto: segundo os dois dirigentes, os eleitores brasileiros têm mudado de opinião e decidido seus votos na última hora, passando incólumes pelas pesquisas.

Mauro Paulino, do Datafolha, admitiu que os institutos podem ter errado numericamente, mas defendeu que as pesquisas não podem ser compreendidas como "prognósticos", e sim como "tendências". Ou seja: elas devem ser analisadas quadro a quadro, pela evolução dos candidatos. Paulino também fez críticas ao Ibope.

- Quem analisa os gráficos (com a evolução das pesquisas) observa que o Datafolha mostrou todas essas tendências confirmadas nas urnas. Não acertamos os números, e alguns podem entender isso como um erro. Mas nós mostramos as tendências do eleitorado. Há um movimento do eleitorado brasileiro no próprio dia da eleição e, por isso, não fazemos prognósticos numéricos. Já o Ibope vende suas pesquisas como "prognósticos". Isso é errado - disse Paulino.

Ele citou o caso de São Paulo como exemplo da movimentação do eleitorado:

- Em São Paulo, o surpreendente foi realmente a ultrapassagem de Kassab sobre Marta em 0,8%. Agora, nós não fizemos a boca-de-urna, deveríamos ter feito. O Ibope fez e não detectou. A boca-de-urna teria que ter detectado, porque as pesquisas mostram o desempenho do dia - disse, afirmando que, na véspera, quando o Datafolha foi fechado, 13% dos eleitores alertaram que poderiam mudar o voto na última hora.

Votos decididos no dia da eleição

Márcia Cavallari disse que a taxa de desvio do Ibope com relação às urnas foi de 6% nas 34 pesquisas feitas na véspera e de 3% nas 12 do tipo boca-de-urna. Ela admite que, em São Paulo, a boca-de-urna ficou um ponto percentual acima da taxa de erro. O motivo seria o fato de as entrevistas terem se encerrado às 14h e não às 17h. Segundo ela, 17% dos paulistanos decidiram o candidato no dia da eleição.

- Prognóstico é o que se divulga na véspera, não há erro nisso. No Brasil, 20% dos eleitores têm decidido o voto no dia. E não há precisão absoluta em pesquisas. Agora, eu queria ver se o Datafolha ia pegar o resultado preciso em São Paulo se tivesse feito uma boca-de-urna. Falar assim é fácil. Em Belo Horizonte, o que ocorreu é que o Quintão cresceu, surpreendeu, talvez porque o adversário tenha soado como imposição - disse a diretora do Ibope.