Título: E o mundo tem outra Segunda-Feira Negra
Autor: Rangel, Juliana
Fonte: O Globo, 07/10/2008, Economia, p. 36

Bovespa interrompe negociações duas vezes e chega a cair 15,5%. Dow Jones vai a 7,75% e se recupera.

RIO, NOVA YORK, WASHINGTON e PARIS. As bolsas em todo mundo viveram ontem um dia de assombro, com os sinais de que a crise financeira iniciada nos EUA se espalha pelas demais economias mundiais, apesar do pacote de ajuda de US$700 bilhões aprovado pelo Congresso americano. Na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), que chegou a cair 15,5%, as negociações foram interrompidas duas vezes.

Em Wall Street, o Dow Jones perdeu 800 pontos, mergulhando 7,75% na mínima do dia. No fechamento, o principal índice da Bolsa de Nova York encerrou com perdas de 3,58%, a 9.955,50, menor nível em pontos desde outubro de 2004 e a primeira vez desde então que o índice fechou abaixo dos dez mil pontos. O S&P recuou 3,85%, após perder mais de 8% na mínima do dia, e o Nasdaq caiu 4,34%. Na Europa, o índice FTSE 100, de Londres, caiu 7,85%, a maior queda desde 1984, quando o índice foi lançado. Em Paris, a queda do índice CAC-40, de 9,04%, também foi a maior da História. O índice DAX, em Berlim, mergulhou 7,07%.

Na Bovespa, o dia já começou nervoso, com investidores se desfazendo de ações a qualquer preço. Dezenove minutos após o início do pregão, o Ibovespa, principal índice da Bolsa, despencou mais de 10,09%. Os negócios foram interrompidos duas vezes ao longo do dia, via circuit breaker (sistema que paralisa operações automaticamente por meia hora, quando o índice varia mais de 10%, e, depois, por uma hora, se a oscilação superar 15%). Perto do fechamento, o Ibovespa recuperou parte das perdas e fechou em queda de 5,43%, aos 42.100 pontos, o menor patamar desde março de 2007.

Na pontuação mínima, após as duas paradas, o Ibovespa chegou a cair 15,5%. Segundo a Bolsa, não há percentuais fixados para que haja um terceiro circuit breaker. Ontem, foi estipulado, para o dia, um limite de 20% até 16h30, que não foi alcançado.

Rumor de que Fed cortará juros alivia tensão em SP

Na Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F), a queda de contratos do índice Ibovespa chegou a 10%. Lá não há circuit breaker, mas o sistema não registra ordens com variações acima deste patamar.

- Durante boa parte do dia, não houve ofertas de compra do índice apostando em queda de 10%, já que no mercado à vista a queda superava esse patamar - disse Gustavo Alcântara, gestor da SLW Gestão. - O que motiva o mercado agora é o desespero. A Bolsa bater 10% de queda em meia hora, depois cair a 15% e fechar com perda de 5%, em um único dia? Isso é inimaginável.

Segundo o analista Fabio Cardoso, da consultoria Adinvest, o maior fluxo de saída foi de investidores estrangeiros, interessados em levantar dinheiro no Brasil para cobrir prejuízos com operações no exterior. A corretora Morgan Stanley liderou o movimento, responsável por 11,35% do volume das vendas do dia:

- Os gringos estão precisando sair e não interessa quanto vale a ação. Ainda mais que aqui ainda existe liquidez (facilidade de vender o papel).

Entre as maiores quedas da Bolsa estiveram ações de setores ligados à necessidade de crédito para expandir suas operações. O Goldman Sachs rebaixou sua recomendação para as construtoras brasileiras, de "atrativa" para "neutra", alegando que, principalmente as pequenas, terão dificuldades de obter recursos.

Os papéis da Rossi Residencial chegaram a cair 34,4%, e fecharam com perda de 20,43%. Os de Tenda e Gafisa perderam 16,15% e 2,10%, respectivamente. A exceção foram as ações da Cyrela, que fecharam em alta de 2,35% - a única do índice - depois que desistiu de comprar a Agra. Em compensação, os papéis desta última recuaram 81,5%.

Ações ligadas a commodities também tiveram fortes perdas. Os papéis preferenciais (PN) da Petrobras, por exemplo, chegaram a cair 19%, mas fecharam em queda de 3,22%. As da Vale recuaram 18,19% na mínima do dia, e fecharam em queda de 6,80%. O banco UBS reduziu as estimativas de lucro para a mineradora em 32% em 2009, devido à queda das commodities.

Faltando uma hora para o fechamento do pregão, o humor de investidores começou a melhorar. Segundo especialistas, cresceram no mercado rumores de que o Federal Reserve (Fed, o Banco Central dos EUA) poderá convocar uma reunião extraordinária e reduzir a taxa básica de juros do país de 2% para 1,25% ao ano.

- A Bolsa também melhorou porque houve um apoio mais forte de Barack Obama (candidato democrata, que lidera intenções de voto para a Presidência dos EUA) para a necessidade de adoção de novas medidas para conter a crise. Além disso, saíram as notícias de que vários países da União Européia garantirão os depósitos à vista. E, no Brasil, o BC anunciou novas medidas para dar liquidez ao câmbio - disse Marcelo Faro, gerente de negociação eletrônica da Intra Corretora.

Na Ásia, as bolsas também tiveram fortes perdas ontem. Em Tóquio, o índice Nikkei perdeu 4,25%, menor fechamento desde de fevereiro de 2004. O índice Hang Seng, de Hong Kong, caiu 4,97%, e a Bolsa de Xangai, 5,23%.

(*) Com agências internacionais