Título: Programa causa estragos até no comitê de Marta
Autor: Galhardo, Ricardo
Fonte: O Globo, 14/10/2008, O País, p. 13

Comitê gay da campanha suspende atividades; Suplicy recomenda à ex-mulher que desista de questionamentos pessoais.

SÃO PAULO. Os questionamentos sobre a vida pessoal do prefeito Gilberto Kassab (DEM) no programa de TV da candidata Marta Suplicy (PT) provocaram reações negativas até dentro da campanha petista. Ontem, o Comitê de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transexuais (LGBT) da campanha de Marta anunciou a suspensão das atividades, em represália à peça publicitária que pergunta se Kassab é casado e tem filhos.

- Foi mais do que um tiro no pé. Foi um tiro de canhão no pé. Por sua trajetória de defesa dos direitos das minorias e vítima de ataques pessoais, Marta deveria ser a última a fazer este tipo de abordagem - condenou Julian Rodrigues, integrante do LGBT do PT e do comitê pró-Marta.

Suplicy recomenda que ex-mulher desista do tema

Ontem de manhã, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP), ex-marido da candidata, procurou Marta para recomendar que ela desista dos questionamentos pessoais sobre o adversário.

- Com toda a história dela e com posicionamento que tem adotado ao longo da vida, Marta deveria saber que uma pessoa pode ser solteira a vida toda e ter um comportamento exemplar na vida profissional e política. Não é com isso que ela vai galvanizar maior simpatia. A população escolhe um candidato pelo que de positivo ele possa realizar - disse Suplicy.

O Comitê LGBT pró-Marta pediu, em nota, a retirada imediata das inserções que questionam a vida pessoal de Kassab. No texto, o comitê enumera cinco argumentos para condenar a propaganda: violação à privacidade, incentivo ao preconceito, moralismo, a história de vida pregressa de Marta e a própria desagregação do movimento gay.

"A mensagem subliminar é que ser gay seria um demérito e comprometeria a capacidade de governar. Kassab não é - ou será - mau prefeito em virtude de sua orientação sexual (qualquer que seja) ou pela forma como leva sua vida privada, mas, sim, porque é conservador, comprometido com as elites", diz a nota.

Integrantes da cúpula da campanha petista em São Paulo disseram ontem que a inserção será retirada do ar. O motivo, no entanto, não é a polêmica, mas o fato de a propaganda já ter surtido o efeito desejado.

- Era para ficar só dois dias no ar. A idéia era desestabilizar o Kassab no debate (da TV Bandeirantes), e tivemos sucesso. Ele ficou perdido nos dois primeiros blocos - disse ao GLOBO um dos coordenadores da campanha.

Em 2004, a ex-ministra do Turismo foi vítima da mesma artimanha. Na ocasião, Paulo Maluf (PP), ameaçou revelar "casos cabeludos" da vida pessoal de Marta.

Ao justificar os motivos que levaram ao comando da campanha de Marta a decidir pela propaganda, o coordenador petista citou a estratégia usada por Fernando Collor de Mello contra Lula, em 1989.

- Não tem essa de que não pode bater. Em 1989, Collor bateu no Lula em todo o segundo turno e ganhou - disse o petista, que pediu para não ser identificado.

Além de desestabilizar Kassab no debate, outro objetivo da inserção seria pôr o prefeito no centro do tiroteio.

- A partir da polêmica, vamos centrar fogo no debate que interessa, que é o passado político dele.

Em nota, Marta alega que defendeu direito à informação

Em nota divulgada ontem, o comando da campanha de Marta repudia "insinuações feitas pela mídia" sobre o objetivo da propaganda. "A equipe de marketing, ao perguntar sobre o estado civil do candidato Gilberto Kassab, em meio a uma série de outros questionamentos, apenas defendeu o legítimo direito de o eleitor conhecer, em todos os aspectos possíveis, a história de quem se apresenta para governar a maior cidade do país", diz o texto, que cita a própria Marta como exemplo de invasão de privacidade e defende o "direito inalienável dos eleitores" de conhecer a vida dos candidatos.