Título: Acho que Deus é realmente brasileiro
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Fonte: O Globo, 14/10/2008, Economia, p. 21

Presidente do Citigroup diz que país pode dar lições aos países ricos.

WASHINGTON. Houve unanimidade entre banqueiros internacionais e brasileiros, ontem, sobre a capacidade de o Brasil suportar o impacto da atual crise financeira, sem perder o rumo do crescimento sustentável. Ao fim de uma ampla análise da situação do país, o presidente e executivo-chefe do Citigroup, Bill Rhodes, utilizou um velho ditado brasileiro para resumir a situação privilegiada do país em meio à turbulência do momento.

- Começo a acreditar que Deus é realmente brasileiro. Pelo jeito ele tinha tirado umas férias anos atrás - disse o banqueiro, provocando risos na platéia de investidores que lotou ontem a Conferência Econômica Brasileira, em Washington.

Para Mantega, crise foi uma "orgia financeira"

Rhodes, que nos anos 80 e 90 comandou o grupo de credores do país, numa longa e complicada negociação da dívida externa, disse que "o Brasil mudou completamente", aprendendo muito com as crises que enfrentou. E acrescentou que os brasileiros hoje têm condições de ensinar os países ricos:

- Se algum país é capaz hoje de domar essa tempestade que enfrentamos é o Brasil. O que me incomoda é os Estados Unidos não terem aprendido com as lições da América Latina. Os EUA passaram décadas ditando regras. Acontece que os estudantes cresceram e se tornaram professores - disse ele.

Em seu discurso, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, definiu a crise deflagrada nos Estados Unidos como "uma orgia financeira". E admitiu que, a princípio, não imaginava que ela seria tão grave:

- Não sabíamos o tamanho da encrenca.

Banqueiros brasileiros que participaram do evento, traçaram um retrato positivo do país. Eles exibiram estudos mostrando que, mesmo com o dólar a R$2,20 e com o preço das commodities caindo, o país terá condições de continuar crescendo de forma sustentada.

Sergio Werlang, chefe do setor de riscos da Itaú Holding Financeira, chegou a dizer que isso será possível mesmo com grandes gastos federais:

- Mesmo que o governo queira continuar gastando como está fazendo, o que eu não aprovo, o resultado continuará sendo positivo no ano que vem - disse ele.

Mantega respondeu:

- Vamos cortar gastos, mas manter investimentos que são importantes. Eles representam nada mais que 1% do PIB.

Caio Megale, da Mauá Investimentos, disse que a crise tem um lado benéfico para o Brasil, uma vez que o país estava precisando desacelerar um pouco:

- Estamos crescendo acima do potencial, acima do limite de velocidade. É como um carro numa estrada: você pode ir a 180 quilômetros por hora. Só que, em algum momento, vai dar uma trombada - comparou ele, acrescentando que "o risco seria haver uma redução do ritmo maior do que estamos precisando".

Beny Parnes, diretor-gerente do Banco BBM, foi taxativo ao falar da capacidade de resistência do Brasil.

- Alguns anos atrás o Brasil sofreria um nocaute em dez segundos. Já temos grande experiência em enfrentar crises: é uma especialidade nossa.