Título: Alemanha dá ajuda recorde a bancos: 500 bi
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Fonte: O Globo, 14/10/2008, Economia, p. 21

Plano é a maior intervenção do governo desde a queda do Muro de Berlim. Merkel quer regras para evitar nova crise.

BERLIM. O governo alemão aprovou ontem um pacote de ajuda aos bancos do país no valor de 500 bilhões, que é, segundo a chanceler Angela Merkel "um elemento para uma nova estrutura do mercado financeiro". O plano representa a maior intervenção governamental realizada pelo país desde que o Muro de Berlim veio abaixo, em 1989.

Com o pacote - que prevê ajuda aos bancos em apuros e garantias para o crédito interbancário no valor de até 400 bilhões -, o governo cria mecanismos de controle da política de negócios dos bancos, de seus créditos e até dos salários de seus executivos. Segundo o ministro das Finanças Peer Steinbrueck, mesmo um executivo de um grande banco não deve ganhar mais de 500 mil por ano.

Merkel defendeu também, em entrevista à televisão ZDF, a criação de regras internacionais para evitar que a crise atual se repita, chamando-as de "o segundo elemento". Ela apresentará as propostas para mais transparência nos bancos na próxima reunião do G-8, em novembro.

- Vou investir toda a minha energia nisso - disse ela, sem adiantar mais detalhes sobre as propostas.

Manifestantes pedem o "fim da queima de dinheiro"

O plano original previa um montante de 470 bilhões. Na nova versão, além dos 400 bilhões em garantias de empréstimos, outros 80 bilhões serão usados na recapitalização de bancos em dificuldades e 20 bilhões serão reservados para cobrir prejuízos potenciais gerados por empréstimos.

Embora controvertido por injetar dinheiro público no sistema bancário, o pacote, chamado de "lei de estabilização do mercado financeiro", trouxe otimismo à Bolsa de Frankfurt, onde o índice DAX subiu pela primeira vez desde o inicio da crise, em até 11 %.

Enquanto o gabinete do governo aprovava a ajuda aos bancos, manifestantes apelavam em frente à chancelaria federal pelo "fim da queima de dinheiro". A "lei de estabilização" representa custos dobrados ao orçamento federal de 2009. Do ponto de vista do endividamento, seria como se cada habitante do país, incluído aí os bebês, contraíssem uma dívida pessoal de 6 mil.

Angela Merkel defendeu as medidas advertindo que, sem elas, haveria o risco da "quebra de muitos bancos" e efeitos nocivos para a economia do país.

Maior impasse desde a reunificação do país

O pacote impõe à Alemanha o maior impasse surgido no país desde a reunificação, há 18 anos: não está certo ainda como o pacote será financiado, uma vez que os estados não aceitam pagar uma parte da conta, como quer o governo federal.

Um dos estados que já anunciaram que não vão financiar o socorro aos bancos é a Baviera. O governador indicado, Horst Seehofer, que deverá assumir nas próximas semanas, disse que a ajuda aos bancos para o combate à crise financeira "é uma tarefa original da união".

Como disse Angela Merkel em entrevista à emissora de TV RTL, o governo organizou a ajuda tendo como um dos principais objetivos estimular os bancos a voltarem a fazer negócios uns com os outros.

- Agora temos o problema de que nenhum banco confia no outro - disse Merkel, ao comentar a crise do crédito interbancário.

Já na semana passada, o governo assumiu riscos de mais de 20 bilhões como parte de um pacote de cerca de 50 bilhões para salvar da falência o banco Hypo Real Estate - ajuda que não foi suficiente para evitar dias negros na Bolsa de Frankfurt, um tremor que repercutiu também em outras grandes bolsas do mundo.

Os analistas advertem porém que o clima é ainda de grande nervosismo e que os números da bolsa podem voltar a despencar a qualquer momento. Mas Dirk Mueller, há 20 anos ativo na Bolsa de Frankfurt, disse que a garantia do governo para os negócios bancários era o sinal que o mercado vinha aguardando.

- Isso ajuda a valorizar as ações dos bancos - afirmou Mueller.

Michael Huether, do Instituto de Pesquisa Econômica, lembrou que a crise financeira mundial só pode mesmo ser resolvida com a ação do Estado.

- O Estado é o único que poder gerar confiança nesse clima de grande desconfiança - afirmou.

Assim mesmo, as perspectivas continuam sombrias. Um estudo divulgado ontem pelo grupo de institutos de pesquisas chamados de "os cinco sábios" informa que a taxa de crescimento do próximo ano será no máximo de 0,2%.

(*) Com agências internacionais