Título: O mundo caminha para um novo Bretton Woods?
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Fonte: O Globo, 14/10/2008, Economia, p. 21

Premiê britânico defende nova arquitetura financeira. Para alguns economistas brasileiros, ainda não é hora.

RIO e LONDRES. O primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, pediu ontem que os líderes mundiais se encontrem para tentar estabelecer um novo acordo de Bretton Woods. A primeira vez em que o mundo se encontrou para discutir uma nova ordem monetária foi há 64 anos. Desta vez, é a Grã-Bretanha quem está liderando o pedido - em 1944, foi capitaneado pelos Estados Unidos. Ainda que alguns economistas brasileiros concordem com a gravidade da crise financeira global, muitos consideram que a idéia de Brown é precipitada.

- Às vezes, torna-se uma crise concordar com o que é óbvio e que o que deveria ter sido feito há anos não pode mais ser adiado. Mas, agora, nós devemos criar a nova arquitetura financeira para uma nova era global - defendeu Brown.

O primeiro-ministro pretende defender amanhã sua idéia junto aos líderes da União Européia (UE). Cada um dos 15 países da zona do euro se comprometeu a lançar, nesse dia, um pacote de medidas para enfrentar a crise financeira global. O acordo foi feito no último domingo, quando, numa reunião em Paris, os países da Comunidade Européia garantiram que não permitirão que os bancos europeus venham a quebrar.

Países mais preocupados em "apagar incêndio"

Reinaldo Gonçalves, do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), acredita que os países ainda estão mais preocupados em "apagar o incêndio" provocado pela crise do que em discutir um novo arranjo monetário mundial:

- Pode ser que no futuro, mas não agora.

Quando o acordo de Bretton Woods foi assinado, o mundo tentava se reerguer da II Guerra Mundial. Liderados pelos Estados Unidos, os signatários do acordo concordaram que o dólar passaria a ser uma moeda forte e a principal referência do sistema financeiro mundial. Hoje, segundo Gonçalves, o mundo está carecendo de uma moeda que tenha o mesmo poder que teve o dólar naquela época:

- Os países mais industrializados não têm condições de estabelecer acordos internacionais, porque eles estão sendo obrigados a resolver problemas de curtíssimo prazo.

O economista Pedro Paulo Zaluth, do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), afirma que, hoje, ao contrário do ocorreu nos anos 40, o mundo dificilmente poderá contar com o apoio dos Estados Unidos para uma futura reedição do acordo de Bretton Woods. Em primeiro lugar, porque os Estados Unidos ainda são o principal centro financeiro internacional, além de um dos mais importantes exportadores de serviços financeiros da atualidade.

Eleições americanas vão deixar EUA fora do debate

A decisão sobre o tema, acredita o economista, somente terá condições de avançar depois que os Estados Unidos elegerem seu novo presidente. Ele também tem certa dúvida quanto à adesão do democrata Barack Obama à idéia.

O historiador Márcio Scalécio, professor de História Econômica da Pontifícia Universidade Católica carioca (PUC-Rio) e da Cândido Mendes, acha que a proposta de Brown é totalmente "fora de propósito". Ele não acredita que os países venham a concordam com a idéia de uma "regulação única", como ocorreu no passado, porque é exatamente a falta dela que garante o "fluxo de capital internacionalmente".

- Estamos vivendo o fim de uma onda liberalizante e devemos entrar num período mais intervencionista - acredita Scalécio, para quem o mundo vai até definir novos arranjos, mas não se submeter a uma regulação única.

O acordo de Bretton Woods vingou até o anos 70, quando a crescente pressão pelo ouro obrigou o então presidente americano Richard Nixon a suspender, unilateralmente, a conversibilidade direta do dólar em ouro. Além de definir regras para a política econômica internacional, o acordo criou o Banco Mundial (Bird) e o Fundo Monetário Internacional (FMI).

(*) Com agências internacionais