Título: Barca muito cheia ajuda ou atrapalha, eis a questão
Autor: Duran, Sergio
Fonte: O Globo, 16/10/2008, O País, p. 8

Paes atrai cúpula de 11 partidos e Gabeira, de quatro; especialistas se dividem sobre efeitos disso na votação.

O potencial de conversão em votos das alianças fechadas no segundo turno no Rio sobre o eleitor divide a opinião de cientistas políticos. Com a declaração de apoio do PTdoB, ontem, Eduardo Paes (PMDB) agora reúne a cúpula de 11 partidos: PT, PCdoB, PDT, PSB, PSC, PRB e PT do B, além de PMDB, PTB, PP e PSL, que já o apoiavam. O deputado Fernando Gabeira, da coligação PV-PSDB-PPS, atraiu no segundo turno apenas o DEM, mas conta com o apoio de dissidentes, como a senadora petista Marina Silva e o pedetista Jorge Roberto Silveira, reeleito prefeito em Niterói.

O professor de teoria política do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), Renato Lessa, diz não confiar na migração de votos a partir dos apoios selados por Paes neste segundo turno:

- Se você soma no papel, parece muito apoio. Mas não acredito que tenha influência, porque o eleitorado não acompanha o movimento feito pelas lideranças. São apoios artificiais. Nesse sentido, Gabeira permanece mais coerente e consistente.

Para Lessa, a entrada do presidente Lula no programa eleitoral de Paes não deve influenciar uma parcela significativa do eleitorado:

- Parece uma coisa artificial, um cenário de novela. Não há vibração nem autenticidade.

Para o coordenador do programa de pós-graduação de ciência política da UFF, Eurico Figueiredo, as alianças já influenciam o eleitor e as pesquisas, mas não serão mais importantes que o desempenho dos candidatos na TV - "mais os debates, menos os programas".

- (O arco de alianças) será positivo para Paes e negativo para Gabeira, mas não determinante. As alianças demoraram entre uma semana e dez dias para serem fechadas. Crivella (o candidato do PRB derrotado no primeiro turno) foi uma aliança importante porque foi o terceiro colocado. Não há transferência imediata de voto, mas há um contingente substancial de votos que serão influenciados e podem ser decisivos - afirma.

- Num cenário em que os partidos são tão frágeis, temos uma disputa dos personagens. E os apoios são importantes, mas não são decisivos. Esses apoios só compõem um pouco o cenário onde a disputa vai ser realizada - concorda Jairo Nicolau, cientista político do Iuperj.

Ele ressalta que os dois candidatos têm uma trajetória de pouco vínculo com partidos:

- O argumento da esquerda para apoiar Paes é que há um alinhamento das forças que estão juntas no plano nacional e no governo estadual. São alianças que já acontecem. Não estão só vendo no Paes um alinhamento dessas forças como vendo no Gabeira o alinhamento das forças nacionais de oposição:

- Esse argumento do apoio do Lula é marginal, como várias eleições locais mostraram. Não é decisivo..

"Lula não transfere voto para Marta; imagina para Paes"

Para Jairo Nicolau, Paes já conseguiu esta semana todos os apoios que poderia e ainda poderia ter sido beneficiado por erros da campanha adversária. Por isso, o peemedebista estaria numa posição mais difícil a partir da pesquisa Ibope.

- A pesquisa mostrou uma vantagem do Gabeira mesmo numa semana em que o Paes foi para cima com mais força. Imagino que os dirigentes da campanha dele estivessem esperando resultado melhor, porque foi uma semana boa para ele: conquistou apoios importantes e houve dois episódios bem explorados, e o Gabeira ficou um pouco na defensiva.

Segundo o professor da UFF, o uso da imagem do presidente Lula no programa de Paes ajuda mais pelo discurso de alinhamento com o governo federal que pela transferência pura e simples de popularidade.

Lessa concorda:

- Paes quer nacionalizar a campanha, mas não está tendo sucesso. Se o Lula não consegue transferir para a Marta Suplicy, companheira de partido em São Paulo, imagina se vai conseguir para um sujeito que ontem denunciou o filho dele?

Colega de Lessa no Iuperj, o cientista político Luiz Werneck Viana também não acredita na transferência de votos de Lula para Paes. Para ele, há uma polarização entre duas campanhas distintas: a convencional, que faz uso das máquinas estadual e federal para atrair outras estruturas partidárias; e a inovadora, que "não joga" para partidos.

- A campanha do Paes é clássica, ortodoxa, convencional. Nesse sentido, a estrutura partidária que compõe a aliança é peça fundamental, assim como o trabalho assistencialista feito por essas estruturas partidárias e seus dirigentes, principalmente na Zona Oeste - afirma, completando: - A campanha do Gabeira é uma campanha nova, joga para a sociedade, para as personalidades da cidade, e não para os partidos.

Sobre a propaganda negativa contra Gabeira, tachado de preconceituoso pela campanha do PMDB, Figueiredo alerta que o tiro pode sair pela culatra:

- Essa propaganda pode prejudicar Paes, que pode ganhar de um lado e perder de outro. Ele pode se afastar ainda mais do eleitor de classe média.

oglobo.com.br/pais/eleicoes2008