Título: Dar pulo não faz o jovem mais alto
Autor: Delgado, Paulo
Fonte: Correio Braziliense, 12/03/2009, Opinião, p. 23
Sociólogo, deputado federal (PT-MG), foi presidente da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados Em 30 anos se esgotou a vigência da velha Lei de Estágios. Mudanças no mercado de trabalho, nos sentidos e urgências da educação. Evolução nas idéias de inserção dos jovens no mercado e na inclusão escolar das camadas menos favorecidas da população. Surge nova lei, a de nº 11.788/2008), e seus desafios: enfrentar a baixa escolaridade e a falta de capacidade profissional de nossos jovens; desenvolver uma pedagogia educacional para uma autonomia trabalhista; crescer aos poucos, sem precisar pular, desesperar; deslocar o risco social que arregimenta jovens sem destino para a realidade possível de educar para o trabalho. O fazer e o pensar por conta própria.
De matriz e forte vocação social prática, o estágio é a ponte entre o jovem, a escola e a empresa. Ajuda a educação média a encontrar seu rumo e ficar menos distante do dia a dia dos alunos que precisam dar respostas rápidas à demanda por treinamento ocupacional. Alerta a educação superior para fazer-se menos desconfortável diante do mercado de trabalho e passar a compreender que hoje, o que toca a vida, mesmo nos seus aspectos não econômicos, são as razões da economia.
No Brasil, o caminho da socialização e da integração comunitária de um jovem se dá mais pelo trabalho do que pelo estudo. Nossa escolaridade não conduz à estudiosidade (o gosto de aprender) nem à praticidade da vida cotidiana (o conforto para sobreviver). Estudar para quê? Perguntam muitos jovens a si próprios e a seus pais. Combinar o gosto pelo estudo com o conhecimento do ambiente do trabalho e as informações sobre as possibilidades dos dois na sociedade moderna e atual é o que regulamenta a nova Lei do Estágio. Mantém, no entanto, um temor desnecessário e, a meu ver, equivocado sobre as possibilidades futuras da vinculação trabalhista do jovem à instituição em que estagiou, estabelecendo prazos máximos para o estagiário na mesma entidade. Ora, vestir a camisa desde o início é a história de sucesso de inúmeros diretores de empresas e escritórios no Brasil e no mundo.
Livrar o jovem da incerteza, eis o objetivo do estágio. E quem começa uma carreira por ele deveria ser estimulado, bem como a empresa que o acolheu, a permanecer por lá. A vida econômica já produz desencaixes excessivos na vida das pessoas. Não deveria ser a Lei do Estágio uma inimiga da estabilidade das ocupações longas para jovens iniciantes. Mesmo porque, preparar-se para o trabalho é a melhor maneira de procurar emprego.
Trabalho, tão antigo como o homem no mundo, é habilidade, saber fazer, mudança constante. Emprego, criação do Estado na era industrial, é contrato, saber servir, estabilidade. O descompasso crescente entre a realidade de um e de outro se agrava quando queremos disciplinar e regulamentar o trabalho, vendo-o sempre como emprego. O mundo do trabalho é infinito e ligado ao desenvolvimento econômico, à qualificação crescente de mão-de-obra, níveis elevados de educação, patamares razoáveis de tributação, múltiplas ofertas de vagas para aprendizes e estagiários, sob supervisão escolar permanente estabelecida pelo Termo de Compromisso de Estágio, o que garante seu caráter sócioeducativo.
O estágio é um sucesso consagrado. Ganha mais quem estuda mais e melhor. Maneja melhor os instrumentos da profissão quem a testou no estágio. Para jovens portadores de deficiência, é a principal porta de entrada para o mercado de trabalho; para os estudantes pobres, a principal motivação para permanecerem na escola.
Incentivar o estágio é abrir novas oportunidades para os jovens no vasto mundo do futuro das profissões e romper com o mantra das sociedades fora do radar da inovação, tecnologia e cultura do progresso empreendedor. Há muita gente sem emprego, mas também há muito emprego sem gente. Ação social, educação e trabalho ajudam o jovem a ficar mais alto sem precisar pular.