Título: Pacote de resgate financeiro custará US$4 trilhões ao governo dos EUA
Autor: Passos, José Meirelles
Fonte: O Globo, 16/10/2008, Economia, p. 22

Secretário do Tesouro, criticado sobre plano, foi mudando de idéia pelo caminho.

WASHINGTON. Um erro de cálculo do secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Henry Paulson, ao implementar o pacote de salvamento de bancos e financeiras, está ajudando a elevar de forma significativa o custo dessa operação para os contribuintes americanos. Ficou claro ontem que a conta já atingiu US$4 trilhões.

Além dos US$2,6 trilhões já comprometidos pelo governo nesse processo, Paulson viu-se na contingência de anunciar, na terça-feira, o aumento das garantias dos depósitos bancários. Além de assegurar o dinheiro dos correntistas (até o máximo de US$250 mil), Tio Sam agora vai se responsabilizar por até US$1,4 trilhão para cobrir contas de pequenas empresas.

Analistas do mercado, parlamentares e até autoridades envolvidas na elaboração do pacote de resgate de bancos e financeiras criticaram Paulson, ontem, por ter errado o alvo. Eles argumentavam que, em vez de apostar os US$700 bilhões do pacote em papéis podres de hipotecas inadimplentes, o secretário deveria ter logo de início usado a autorização que o Congresso lhe dera para adquirir participação em bancos comerciais.

- Se ele (Paulson) tivesse dado prioridade a isso, o Lehman Brothers não teria quebrado, nem o Wachovia. O baque desses dois certamente criou mais incertezas no mercado e alimentou a crise - disse o presidente da Comissão de Bancos do Senado, o democrata Christopher Dodd.

Ben Bernanke, o presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), tratou de convencer Paulson, a princípio, a injetar dinheiro diretamente nos bancos, por meio de uma parcial estatização. Era, na opinião dele, a maneira mais segura de evitar o caos.

Medidas na Europa influenciaram mudança

Segundo funcionários do Tesouro, Paulson - com o endosso explícito do presidente George W. Bush - retrucou que fazer isso daria a impressão de que o governo estava nacionalizando os bancos, e tal sensação poderia causar pânico.

Paulson começou a mudar de idéia quando funcionários do Tesouro decidiram dar uma olhada nos livros do Wachovia, que, à beira da quebra, foi salvo pelo Wells Fargo, que o absorveu. Eles notaram que só aquele banco tinha em seus cofres o equivalente a US$312 bilhões em papéis podres. Ou seja: apenas um banco consumiria quase metade dos US$700 bilhões do pacote do governo americano.

Em seguida, viu-se o bilionário Warren Buffett fazer o mesmo que o Wells Fargo: injetou bilhões em duas instituições que cambaleavam - a Goldman Sachs e a GE -, adquirindo ações preferenciais que não lhe dão direito a voto. Nesse ponto, Paulson percebeu que era a saída.

A gota d"água para a mudança na postura do secretário de Tesouro viria da Europa: seus colegas daquele continente tomaram iniciativa idêntica, fazendo Paulson cair na realidade. O pioneiro foi o primeiro-ministro britânico Gordon Brown, que na quarta-feira da semana passada lançou um plano que prevê a nacionalização de bancos com dificuldades financeiras.

Até ontem, quando o governo acrescentou US$1,4 trilhão às operações de salvamento, o Tesouro já reservara US$700 bilhões para o pacote anticrise e mais US$200 bilhões para salvar a Fannie Mae e a Freddie Mac, as maiores agências imobiliárias; e o Fed, que já havia injetado US$800 bilhões no mercado financeiro desde março, separou mais US$900 bilhões no início deste mês para emprestar a bancos e financeiras.