Título: Mundo se une contra crise
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Fonte: O Globo, 09/10/2008, Economia, p. 23
Principais bancos centrais reduzem juros em 0,5 ponto para tentar acalmar mercados
Do New York Times*
Em um movimento de abrangência inédita, os principais bancos centrais do mundo reduziram ontem suas taxas básicas de juros em 0,5 ponto percentual, em um esforço coordenado para interromper o colapso das bolsas de valores e o congelamento do crédito, que ameaça detonar a primeira recessão global desde o início dos anos 1970. A medida, no entanto, não conseguiu evitar que, mais uma vez, as bolsas de todo o mundo caíssem, o que levou analistas a questionarem se será realmente possível evitar uma recessão séria e prolongada.
O Federal Reserve (Fed, o banco central americano), o Banco Central Europeu (BCE), o Banco da Inglaterra e os bancos centrais de Canadá, Suécia e Suíça reduziram seus juros. A menor taxa é a do Fed: 1,5% ao ano, e a maior, a do Banco da Inglaterra: 4,5% anuais. O Banco do Japão manifestou seu apoio às medidas, mas não mexeu em sua taxa, atualmente em 0,5% ao ano.
- A gravidade do momento pede respostas inusitadas - disse Jim O"Neill, economista-chefe do Goldman Sachs.
O BC chinês acompanhou o movimento - mas sem dizê-lo explicitamente - ao reduzir seus juros de 7,20% para 6,93% ao ano. Hong Kong, Emirados Árabes Unidos e Kuwait também cortaram suas taxas. Na terça-feira, a Austrália fizera uma redução de um ponto percentual.
- É melhor funcionar. Essa é a última chance - disse à CNN Jeffrey Saut, estrategista-chefe da corretora Raymond James Financial.
Fed espera alívio em preços de energia
A participação do BCE representou uma mudança de postura, pois semana passada a autoridade monetária mostrava-se avessa a um corte de juros, preocupada com a inflação na zona do euro. Mas afirmou ontem, em nota, que "a recente intensificação da crise elevou os riscos de desaceleração do crescimento".
O Fed, cuja próxima reunião estava prevista para o fim deste mês, afirmou em comunicado que, apesar de a inflação estar alta, espera retração nos preços de energia e outras commodities. A decisão do BC americano foi unânime. O corte de juros nos Estados Unidos não foi tão inesperado, já que, na véspera, o presidente do Fed, Ben Bernanke, havia sinalizado essa hipótese. A taxa estava em 2% desde abril, e a próxima reunião do BC americano estava prevista para os dias 28 e 29 deste mês.
Mas as condições dos mercados de crédito continuaram críticas. Pouco depois da ação dos BCs, a diferença entre o rendimento dos papéis do governo e a taxa cobrada pelos bancos nos empréstimos interbancários atingiu quatro pontos percentuais, o que mostra que as instituições financeiras ainda têm receio de emprestar umas às outras.
Após o anúncio, a revista "Economist" afirmou em seu site que "é um sinal de tempos extraordinários que tentativas dramáticas e sem precedentes de resolver a crise nos mercados financeiros não causa muita surpresa".
O Fed afirmou que a ação de ontem foi a primeira redução de juros coordenada pelo BC americano, apesar de a autoridade monetária já ter participado em outras operações semelhantes. Como em novembro de 2001, quando Fed e BCE reduziram seus juros no mesmo dia, para combater a desaceleração econômica posterior aos atentados do 11 de Setembro.
Para alguns analistas, a ação foi positiva. "Finalmente, uma mostra coordenada de força" afirmou Ian Shepherdson, economista-chefe da consultoria High Frequency Economics. "A medida deve ser aplaudida, mas há mais por vir. O manual para evitar depressões afirma que as taxas precisam estar o mais próximo possível de zero".
"Não há bala de prata", diz analista
A "Economist" também acredita que haverá mais reduções de juros. A revista lembra que, na última desaceleração nos EUA, em 2001, o Fed reduziu os juros para 1%. "As perspectivas para a economia global parecem muito piores hoje que naquela época, então os juros na América não devem ficar em 1,5% por muito tempo".
Outros mostraram cautela, principalmente pelo fato de medidas como o pacote do governo americano, de US$700 bilhões, não terem sido capazes de segurar a queda das bolsas.
- Não há uma bala de prata para esses casos - afirmou Derek Halpenny, estrategista de câmbio do Bank of Tokyo-Mitsubishi UFJ.
Em Paris, o presidente do Círculo dos Economistas, Jean-Hervé Lorenzi, disse ao jornal "Le Monde" que "só uma rápida convocação de uma conferência internacional, como Bretton Woods, poderá acalmar os mercados". Ele ressaltou que "há muita psicologia nessa questão".
- A principal lição é que, quando há um problema de confiança, as ferramentas macroeconômicas convencionais não são muito eficazes - afirmou Olaf Unteroberdoerster, representante do Fundo Monetário Internacional (FMI) em Hong Kong.
Para Saut, o corte é simbólico:
- Aplaudo Bernanke por ser muito criativo e inovador. Mas o Fed deveria ter feito isso antes. Eles têm sido mais reativos que calculadamente proativos.
(*) Com agências internacionais