Título: Medo na zona rural
Autor: Borges, Rodolfo
Fonte: Correio Braziliense, 12/03/2009, Cidades, p. 29

Moradores de chácaras e fazendas próximas a São Sebastião convivem com média de três assaltos por semana. População cresceu 214% em cinco anos e efetivo policial caiu. Alguns já apelam a milícias

A produtora de leite Eliana Maria costumava deixar a porteira aberta a clientes. mudou os hábitos Os moradores da região rural de São Sebastião estão com medo. Uma onda de assaltos a fazendas e chácaras do local mudou hábitos. As porteiras, que antes ficavam abertas na região que concentra produção de hortifrutigranjeiros, agora permanecem fechadas a cadeado ao longo do dia. Segundo J. Brito Júnior, presidente da Associação dos Produtores Rurais da Região do Riacho Frio (a 17km do centro de São Sebastião), os moradores registram uma média de três assaltos por semana. Só na última terça-feira, duas propriedades foram roubadas. Em um dos crimes, três bandidos chegaram a jantar na casa enquanto a família permanecia amarrada e trancada dentro de um banheiro. Ontem, líderes comunitários se reuniram com representantes da Polícia Militar e da Polícia Civil na sede da Administração Regional de São Sebastião para discutir como dificultar a ação dos bandidos.

A polícia de São Sebastião alega não ter um mapa fidedigno da criminalidade porque a população tem receio de procurar as autoridades e registrar queixas. ¿Eles disseram que se nós procurássemos a polícia ou a imprensa voltariam para nos matar¿, relata uma vítima, que prefere o anonimato. A semelhança entre as ações realizadas pelos bandidos leva os moradores a desconfiar que haja um grupo organizado. Os assaltantes chegam às propriedades pedindo ajuda (um copo d¿água ou informações) e, depois de anunciar o assalto, armados, amarram os moradores e funcionários e levam de eletrodomésticos a animais.

No crime mais recente, registrado pelo moradores na última terça-feira, três bandidos tiveram tempo para jantar durante assalto a uma chácara de São Bartolomeu. Uma das vítimas disse que preparava a refeição quando foi abordada. Três homens armados renderam ela, dois filhos e esperaram o marido chegar. Depois de amarrar a todos, os assaltantes comeram toda a comida das panelas e tomaram a cerveja da geladeira. As vítimas ficaram quatro horas em poder dos sequestradores e o que não foi levado acabou destruído. Uma outra fazenda da região foi assaltada quatro vezes nos últimos três meses.

O resultado das ações criminosas é visível no comportamento dos moradores. Antes, era costume nem fechar as portas para dormir. Hoje, não há quem tenha coragem de deixar o trinco aberto.

Passagem era livre A produtora de leite Eliana Maria Fernandes, 63 anos, já não sabe que fim terá o seu negócio. ¿Antigamente eu vendia ovos e frangos caipiras e todo mundo entrava para comprar. A passagem era livre. Agora, a porteira não fica mais aberta e quem quiser comprar tem que ligar no meu celular e esperar que eu chegue à entrada. Isso dificulta as coisas¿, comenta Eliana, há cinco anos no ramo.

A preocupação é tamanha que os vizinhos já falam em radicalizar. Descrentes na força de repressão da polícia, cogitam contratar milícias para garantir a segurança. ¿Estamos presos enquanto os bandidos ficam soltos, mas contratar milícias e se armar, como alguns estão fazendo por aqui, só vai piorar a situação¿, argumenta Fernando Augusto, 63, marido de Eliana.

¿Nossa vida era tranquila até um ano atrás¿, lembra J. Brito Júnior. Segundo ele, os crimes começaram a acontecer depois que a PM deixou de fazer rondas diárias. Em reunião realizada na manhã de ontem na Administração Regional, o major Agrício, da 17ª Companhia de Polícia Militar Independente (CPMInd) de São Sebastião, garantiu aos moradores o retorno de uma viatura para patrulhar a região. ¿Estamos esperando para abril um reforço no efetivo. Quando isso ocorrer, devemos ter um segundo veículo¿, estima o major. Segundo o líder comunitário J. Brito Júnior, houve uma explosão demográfica na região nos últimos cinco anos, de 35 mil habitantes em 2002 para 110 mil atualmente, crescimento de 214%. Curiosamente, o fenômeno não foi acompanhado pelo efetivo da polícia. Atualmente, a PM de São Sebastião conta com 174 profissionais, número bem abaixo do efetivo de 2007, quando havia 330 homens. A região rural, especificamente, reúne cerca de 60 famílias.

LADRÕES FORAGIDOS Os problemas de segurança não se restingem à região rural de São Sebastião. Como o Correio noticiou ontem, cinco homens invadiram a fazenda do ex-secretário de Agricultura do DF Aguinaldo Lelis no Núcleo Rural Tabatinga, (a 35km de Planaltina), na madrugada de terça. Lelis, a família e funcionários da fazenda ficaram em posse dos sequestradores por meia hora. Os assaltantes levaram de tudo, desde dois carros a laptop e garrafas de uísque. Dois acusados foram presos no mesmo dia e parte do material roubado foi recuperado. Os outros integrantes do grupo seguem foragidos. Um vizinho do ex-secretário teve uma caminhonete roubada na sexta-feira e a fazenda de Lelis já havia sido roubada 30 dias atrás.