Título: Tenda deixará o Eixo Monumental
Autor: Rodrigues, Gizella
Fonte: Correio Braziliense, 12/03/2009, Cidades, p. 30

O Memorial da Missa Campal, construído em homenagem à primeira celebração católica em Brasília, será desmontado em maio. Segundo o Iphan, a estrutura em ferro agride o tombamento

No ano passado, o GDF decidiu criar uma estrutura mais resistente: o material escolhido para a tenda foi o ferro e a obra passou de 30m para 50m de extensão a fim de abrigar mais gente

Iano Andrade/CB/D.A Press Missa em 3 de maio de 2008: tenda em lona amparada em madeira

Mário Fontenele/ Arquivo Público Celebração de 1957: o cenário original foi projetado por Niemeyer A tenda de ferro montada na Praça do Cruzeiro, atrás do Memorial JK, será desmontada logo depois de 3 de maio. Após cinco meses de polêmica, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) fechou um acordo com a presidência da Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap) para retirar a estrutura do Eixo Monumental. A alegação do Iphan é que ela foi construída sem o aval do órgão, é desproporcional em relação aos outros monumentos erguidos no local e fere o tombamento de Brasília. A praça vai ficar limpa, mas o local para onde a tenda será levada é mantido sob sigilo pelo governo.

A estrutura é chamada pelo GDF de Memorial da Missa Campal e foi construída em homenagem à primeira missa celebrada na capital, em 3 de maio de 1957. No ano passado, o Arquivo Público do DF reconstituiu a celebração, na mesma data e horário da realizada há quase 52 anos. Para isso, recriou o cenário da missa original ¿ projetado por Oscar Niemeyer. Uma tenda foi colocada sobre o altar para servir de proteção contra o sol e a chuva. Amparavam a lona verde toras de madeira amarradas e presas ao chão com a ajuda de cordas. O palco foi mantido até 12 de setembro, quando outra missa ocorreu no local, em comemoração ao aniversário de Juscelino Kubitschek.

Depois da missa em homenagem a JK, porém, o GDF decidiu criar uma estrutura mais resistente, que seria usada anualmente nas duas celebrações. A Novacap fez um estudo para aumentar o tamanho da tenda para que ela pudesse abrigar mais pessoas. Assim, ela passou a ter 50m de extensão ¿ 30m a mais que o original ¿ e o material considerado seguro para sustentar a estrutura foi o ferro. A tenda, agora sustentada por cabos de aço, custou R$ 200 mil aos cofres públicos. O Iphan alega que não permitiu a obra em ferro. ¿A legislação determina que nada pode ser feito no canteiro central do Eixo Monumental sem autorização do Iphan. Permitimos que eles cimentassem o piso, só isso. A tenda deveria ser de madeira e colocada duas vezes ao ano¿, afirmou o superintendente regional do Iphan, Alfredo Gastal.

Respeito à lei Em novembro do ano passado, o órgão embargou a obra, mas ela nunca foi paralisada. Gastal ameaçou entrar na Justiça e conseguiu um acordo com a diretoria da Novacap: a tenda de ferro fica por mais dois meses, até a missa campal, em 3 de maio. Depois, será desmontada e retirada do Eixo Monumental. Se o GDF quiser celebrar a missa do aniversário do JK, terá de providenciar uma estrutura de madeira, nos mesmos moldes que a projetada por Niemeyer em 1957. ¿Estou fazendo isso não porque gosto ou não gosto da estrutura. É porque preciso respeitar a lei e nada pode ser construído ali arbitrariamente¿, explicou o superintendente do Iphan. Gastal afirma ainda que o Memorial da Missa Campal, do tamanho que foi feito, tira a visão do Memorial JK. ¿É até uma ofensa ao fundador de Brasília. Não admito que um bom monumento seja tampado por um mostrengo daqueles.¿

O presidente da Novacap, Luiz Carlos Pietschmann, não quis dar entrevista. Ele apenas ressaltou, por meio da assessoria de imprensa, que ¿o importante é que foi encontrada uma solução para o problema para não desperdiçar dinheiro público¿. Segundo a assessoria, o novo local onde a tenda será montada vai ser uma ¿surpresa para o brasiliense¿. O superintendente do Arquivo Público do DF, Luiz Mendonça, defende a manutenção da tenda. De acordo com Mendonça, o projeto do governo era deixar a estrutura fixa para que ela pudesse ser usada como palco de outros eventos, como apresentações da orquestra sinfônica ao ar livre. ¿O Iphan podia ser mais tolerante. O memorial não enfeia a cidade. Ele se incorpora à cruz de madeira que já está lá e embeleza a Praça do Cruzeiro. Não faz sentido ficar montando e desmontando¿, defendeu.

Arquitetos e urbanistas concordam com o Iphan e também condenam a construção da tenda. ¿Aquilo é um equívoco. Foi feito com boas intenções, de se preservar o local histórico, mas é uma agressão ao bom gosto. O espírito do projeto do Niemeyer era uma estrutura improvisada de madeira. O que fizeram foi uma falsificação grosseira¿, afirmou o arquiteto José Carlos Coutinho, diretor do Departamento de Patrimônio Histórico e Artístico do DF (Depha). ¿É a coisa de maior mau gosto feita em Brasília nos últimos anos. Quem fez aquilo não tem a menor sensibilidade. O projeto do Niemeyer era leve, parecia que a tenda estava voando. E construíram aquela coisa pesada. O Oscar fez uma coisa e entenderam outra¿, completou o arquiteto Carlos Magalhães, representante do escritório de Niemeyer no DF.

-------------------------------------------------------------------------------- É até uma ofensa ao fundador de Brasília. Não admito que um bom monumento (Memorial JK) seja tampado por um mostrengo daqueles

Alfredo Gastal, superintendente regional do Iphan

O Iphan podia ser mais tolerante. O memorial não enfeia a cidade

Luiz Mendonça, superintendente do Arquivo Público do DF

O espírito do projeto do Niemeyer era uma estrutura improvisada de madeira. O que fizeram foi uma falsificação grosseira

José Carlos Coutinho, diretor do Departamento de Patrimônio Histórico e Artístico do DF