Título: BC ganha carta branca para intervir
Autor: Batista, Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 10/10/2008, Economia, p. 25

Instituição poderá até vetar distribuição de lucros de bancos que tomarem empréstimo

O Banco Central (BC) poderá intervir nas instituições financeiras que usarem a nova linha de redesconto - linha de crédito da autoridade monetária similar a um cheque especial para bancos- que permite o uso das carteiras de crédito como garantia. Na mais ampla carta branca já concedida ao BC nesta área, o Conselho Monetário Nacional (CMN), reunido extraordinariamente ontem, autorizou o BC a impor medidas adicionais aos bancos que socorrer. Entre elas, a venda de ativos, a proibição de novos negócios e o veto à remuneração de executivos e à distribuição de lucros. Assim, o BC se aproximou mais de seus pares internacionais na administração da crise.

- É uma contrapartida razoável. Não temos casos aqui, mas no exterior houve instituições que receberam bilhões e depois descobriu-se que fizeram a festa. Não vamos dar dinheiro para ninguém - afirmou ao GLOBO o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo.

A autorização faz parte da regulamentação das medidas adotadas na segunda-feira para aumentar a liquidez do mercado financeiro, que inclui ainda a concessão de empréstimos em moeda estrangeira aos bancos nacionais. As duas medidas estão previstas na medida provisória 442. Com o agravamento da crise internacional e a redução geral das linhas de crédito, bancos pequenos e médios ficaram com dificuldades para fechar seu caixa. Foi para essas instituições que o BC criou essa nova forma de empréstimo.

- Estas medidas de intervenção estão em linha com o que ocorre no mundo. Mas é bem provável que o BC nunca as utilize - afirmou um integrante da instituição.

As novas regras são mais detalhadas e abrangentes que o antigo regulamento do redesconto de abril de 2002 - que nunca chegaram a ser utilizadas. As diretrizes estão valendo a partir de hoje, quando as regras saem no Diário Oficial.

O BC poderá obrigar as instituições que usarem o empréstimo a fazerem aporte adicional de recursos e restringir práticas operacionais, bem como determinar que sejam recompostos níveis de liquidez adequados (quantidade de dinheiro que deve manter para a quitação de seus compromissos). Além disso, o CMN definiu que o custo das operações será de mercado.

Pressionado pelo estrangulamento do crédito, o mercado ficou satisfeito com a regulamentação do CMN, que deu mais agilidade ao BC. As exigências de garantias serão proporcionais ao risco que embutem e progressivas. No caso do redesconto, as garantias variam de 120% a 170% do valor emprestado pelo BC. Ou seja: para pegar R$100 milhões em empréstimos, um banco terá de oferecer uma carteira de crédito que valha entre R$120 milhões e R$170 milhões.

Analistas aprovam regulamentação

Para o empréstimo em moeda estrangeira, as garantias podem ser títulos soberanos em dólares emitidos pelo Brasil (Global Bonds) ou outras nações, desde que tenham pelo menos classificação internacional (rating) A - ou seja, que tenha grau de investimento. A garantia exigida será de 105% do valor dos papéis.

- Como esta não é uma compra final de títulos ou de carteiras, que só serão assumidos em última instância, o BC acerta ao exigir garantias de primeira linha, afinal é um socorro a particulares realizado com dinheiro público - avaliou Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do BC.

Para Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, o BC está na direção correta e ainda reserva uma última cartada que deverá ser usada na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), nos dias 28 e 29 de outubro:

- Mesmo que o BC não reduza a Selic, ele pode mantê-la, o que dá um sinal importante ao mercado: aponta que, no futuro, a tendência será de redução do custo de captação no mercado, elevada hoje pela escassez de recursos.

- De 15 dias para cá o BC mudou sua estratégia, está mais ativo e atento, o que pode evitar que todo o mercado se desregule - completa Alcides Leite, professor da Trevisan.

COLABOROU Geralda Doca

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