Título: FMI agora promete emprestar até para os ricos
Autor: Passos, José Meirelles
Fonte: O Globo, 10/10/2008, Economia, p. 29

Fundo lança nova linha de crédito para países afetados pela crise e diz que "estamos à beira da recessão global"

WASHINGTON. Uma dimensão mais aguda da atual crise financeira deflagrada nos Estados Unidos, e em crescente contaminação global, foi estabelecida ontem quando o diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Dominique Strauss-Kahn disse que esse organismo já preparou um mecanismo de emergência para emprestar dinheiro não apenas aos seus clientes habituais - os países em desenvolvimento - mas, também, aos mais ricos.

- Estamos à beira de uma recessão global - afirmou o executivo, acrescentando que "tudo indica que as raízes dessa crise são mais profundas que o esperado."

De acordo com a sua avaliação, nenhum país está imune a ela. Nem mesmo a maior potência econômica do planeta, os Estados Unidos:

- O mais óbvio é que alguns países em desenvolvimento estão sofrendo muito mais estresse do que as economias desenvolvidas, mas isso também pode acontecer a algumas delas - disse ele.

Fundo tem US$257 bi disponíveis em caixa

Strauss-Kahn evitou mencionar uma cifra, mas afirmou que o FMI dispõe de centenas de bilhões de dólares "que poderiam ser utilizados ao longo de um ano, e até mesmo mais do que isso se tivermos de dar assistência além do período de um ano". O Fundo, que emprestou muito pouco nos últimos cinco anos, tem em caixa US$352 bilhões. Desse total estão disponíveis US$257 bilhões. Estão emprestados não mais que US$12 bilhões.

- Temos condições de, numa situação de emergência, desembolsar pelo menos US$100 bilhões. E isso poderia ser feito num processo relâmpago: não passaria mais de dez dias - disse ao GLOBO um assessor de Strauss-Kahn.

O próprio diretor-gerente contou que ontem mesmo ativara "procedimentos de emergência" do FMI para responder rapidamente com programas financeiros de acesso mais fácil "com base em condicionalidades mais simplificadas, cujo enfoque é o da prioridade em responder à crise".

Esse esquema prevê que o dinheiro necessário seja entregue imediatamente aos países necessitados.

- Estamos prontos para atender a quaisquer demandas de países que estejam enfrentando problemas. E não podemos nos esquecer das outras crises: a dos preços dos alimentos e a dos preços do petróleo - disse Strauss-Kahn.

Ele ponderou que, embora os problemas sejam sérios, poderiam ser resolvidos até o fim de 2009 se houver "uma ação rápida, enérgica e cooperativa" dos países do G-7 (os mais ricos) em conjunto com as novas potências emergentes.

Strauss-Kahn defende que emergentes sejam ouvidos

A título de justificativa para tal papel, ele lembrou que a situação só não é mais catastrófica porque esse último grupo de países tem sustentado a economia mundial:

- O crescimento dos mercados emergentes em 2007 foi equivalente a dois terços do global. Em 2009, as economias avançadas terão crescimento próximo do zero; o que significa que 100% do crescimento virão das economias emergentes e das de baixa renda.

O diretor-gerente do FMI acrescentou que isso não implica, pelo menos por enquanto, em mudança no sistema de poder. Mas disse que a diferença de taxas de crescimento entre os países "tem conseqüências no seu peso relativo."

- Já havia um bocado de boas razões para fazer com que as economias avançadas levassem mais em conta a opinião das economias emergentes. Essa crise fornece mais uma razão nesse sentido.