Título: Bovespa cai 10,18% e dólar, a R$ 2,38, sobe 6,7%
Autor: Rangel, Juliana
Fonte: O Globo, 23/10/2008, Economia, p. 27

Ações de bancos desabam. Rumores na BM&F fizeram disparar os contratos de juros futuros e de câmbio.

RIO, BRASÍLIA e SÃO PAULO. As ameaças de recessão global, agravadas por divulgação de balanços de empresas recheados de prejuízos nos Estados Unidos e o temor pela saúde financeira de instituições brasileiras derrubou os mercados no Brasil. As medidas que abrem caminho à estatização total ou parcial de bancos no Brasil foram entendidas como um sinal de que pode haver risco sistêmico. As ações de bancos desabaram.

A Bolsa de São Paulo fechou em queda de 10,18%, aos 35.069 pontos - o menor patamar desde setembro de 2006. O dólar subiu 6,68%, para R$2,380.

Faltando menos de uma hora para fechar o pregão, o índice caiu mais de 10% e acionou o circuit breaker, sistema que interrompe automaticamente as negociações. Após meia hora paradas, as operações foram retomadas e estendidas até 18h18m.

O dia foi atípico também na Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F). Rumores de que um grande fundo ou banco enfrentava dificuldades fez disparar contratos de juros e de dólares. Os comentários eram de que ele teria apostado na queda dos ativos e, ontem, teria tentado desfazer essas posições.

Um dos contratos de juros mais negociados, com vencimento em janeiro de 2010, fechou em alta de 10,11%, com taxa de 16,220% ao ano. Os negócios bateram o teto de oscilação, de 5%, em 12 contratos da Bolsa. No dólar, o limite de 6% para o câmbio também foi alcançado, e contagiou o mercado à vista. A BM&F não comentou o assunto e disse que as liquidações foram normais.

- Há muitos anos eu não vejo nada tão estranho com a alta de juros - disse um operador.

Para suavizar a demanda por dólar, o Banco Central (BC) ofereceu swaps cambiais em dois leilões (contratos em que a instituição paga a variação da moeda e recebe a dos juros), num total de US$515,5 milhões. E vendeu US$300 milhões em moeda de suas reservas, por meio de duas intervenções. Mesmo assim, o dólar subiu.

Já o risco Brasil, medido pelo JPMorgan, subiu 26,28%, a 663 pontos centesimais, a maior alta desde 2002.

- A Argentina estatizou fundos de pensão, a Rússia tem muitas empresas alavancadas (investiram acima de seu patrimônio) e há uma explosão do câmbio na Hungria e na Polônia. O elo de confiança se quebra muito rápido - disse Gustavo Alcântara, da SLW Gestão.

O gerente de câmbio da Liquidez, Francisco Carvalho, diz que investidores buscaram segurança em papéis do governo dos EUA, num movimento chamado "fly to quality" (ou vôo para a qualidade, em inglês). Para ele, não há nada de especial contra o Brasil.

Na Bovespa, outro fator que colaborou para as baixas foram as perdas dos preços das commodities, depois que o primeiro ministro inglês, Gordon Brown, disse que haverá recessão.

As ações da Petrobras caíram 7,20%; as da Vale, 8,68%.

Papéis de construtoras também caíram com desconfiança de que algumas tenham feito operações com derivativos de câmbio. As principais ações de Cyrela caíram 17,26%; as da Gafisa, 20,04%; e da Rossi, 11,11%.

A medida provisória que permitirá que BB e Caixa comprem bancos também influenciou.

- Foi bem vista, mas acendeu uma luz amarela sobre problemas com alguns bancos - disse um analista.

As ações de bancos desabaram: BB ON (- 15,73%), Bradesco PN (- 11,50%), Itaú PN (-12,14%), Unibanco unit (- 13,50%) e Nossa Caixa ON (- 4,29%).

Mais cedo, o BC informou que o fluxo cambial financeiro (recursos para bolsas e compra de títulos, por exemplo), foi negativo em US$1,943 bilhão entre 13 e 17 de outubro, o que evidencia a retirada de estrangeiros. As saídas líquidas somam US$5,001 bilhões no mês.

O dólar alto prejudicou a Suzano Papel e Celulose. A empresa teve perdas cambiais de R$572 milhões no terceiro trimestre, que fizeram com que saísse de lucro líquido de R$185,56 milhões, de abril a junho, para prejuízo de R$283 milhões.