Título: Surpresas das pesquisas
Autor: Pereira, Merval
Fonte: O Globo, 30/10/2008, O País, p. 4

NOVA YORK. Faltando cinco dias para a eleição, as pesquisas eleitorais aqui nos Estados Unidos - e elas existem aos montes, para todos os gostos - começam a refinar seus números, adaptando-os às peculiaridades de uma eleição em que o vencedor pode ter menos votos populares, mas, mesmo assim, ganhar no Colégio Eleitoral, que é o que realmente vale, como demonstrou a vitória de George W. Bush em 2000.

Os 27 votos eleitorais da Flórida deram a vitória aos republicanos naquela ocasião, embora o candidato democrata Al Gore tivesse tido mais votos nas urnas. Como um candidato, vencendo por apenas um voto em um estado, leva todos os seus delegados para o Colégio Eleitoral, o resultado das pesquisas de opinião nacionais não têm tanta relevância quanto as pesquisas regionais.

Outro detalhe relevante para o resultado final é a não obrigatoriedade do voto, o que faz com que o índice de comparecimento nas urnas possa influenciar no resultado final.

Segundo o International Institute for Democracy and Electoral Assistance, nas oito eleições presidenciais dos EUA entre 1972 e 2000, a abstenção atingiu entre 49% e 55%.

Apenas 49% dos eleitores registrados votaram na eleição presidencial em 2000. A renda familiar e a escolaridade são duas das variáveis que mais influenciam a abstenção.

Enquanto só 28% dos adultos com rendimento familiar de até US$5.000 disseram ter votado em 2000, 72% dos que ganham mais que US$75.000 votaram na mesma eleição.

Entre os com curso superior, 70% votaram na eleição de 2000, contra apenas 27% dos que não acabaram a escola secundária, segundo o censo eleitoral.

O problema é que nenhum instituto de pesquisa está preparado para o efeito contrário, isto é, um maciço comparecimento de eleitores jovens e representantes de minorias, que tradicionalmente não participam das eleições e desta vez estão empenhados na eleição de Obama.

Atribui-se a James Carville, o marqueteiro que cunhou a frase "é a economia, estúpido" para explicar a vitória de seu cliente, Bill Clinton, sobre George Bush pai, a afirmação de que quem depende do voto do eleitor com menos de 30 anos já perdeu a eleição. Mas, a frase foi pronunciada em outros tempos.

Em 2000, o comparecimento dos eleitores abaixo de 30 anos foi de 40%. Entre os que vão votar pela primeira vez, a preferência é pró-Obama, 56% a 23%.

Um exemplo de como os resultados podem mudar de acordo com as circunstâncias é a pesquisa Gallup, que dá uma vantagem para Obama de 51% a 42% entre os eleitores registrados, mas vai reduzindo essa vantagem à medida que refina os dados.

No modelo tradicional de pesquisa, Obama vence de 49% a 46%, e, no modelo "expandido", a diferença passa a ser de 51% a 44%. Os dois modelos trabalham com a hipótese de comparecimento de 60% dos eleitores registrados, mas, enquanto no tradicional há um desconto para eleitores que normalmente têm uma abstenção maior, como os jovens, os velhos e os hispânicos, no "modelo expandido" parte-se do pressuposto que este ano haverá um maior comparecimento de eleitores desses grupos, o que teoricamente ajudaria a candidatura Obama.

O candidato democrata, por essa pesquisa, tem apenas 1 ponto percentual de vantagem entre os eleitores "que sempre votam", mas sua vantagem é maior, entre 4 e 5 pontos, entre os eleitores que estão "muito interessados" na campanha e entre os que têm "alto grau de interesse" na eleição.

Entre os que já votaram nos estados em que a eleição antecipada é permitida, um contingente estimado este ano em 30% do eleitorado, Obama tem uma vantagem maior, superando McCain por 54% a 45%.

Obama tem ainda 5 pontos de vantagem entre os que pretendem votar, mas admitem que alguma coisa pode acontecer impedindo-os de comparecer.

Entre esses, os eleitores hispânicos, cuja grande maioria apóia Obama, são os mais expostos a razões de última hora que os impeçam de votar.

O voto hispânico será decisivo, por exemplo, na Flórida, um estado que tem 27 delegados e tem sido decisivo nas últimas eleições, sempre votando a favor dos republicanos.

Em 2004, Bush teve 56% do voto latino na Flórida, contra 40% do voto nacional dos latinos.

Há uma mudança de tendência no estado, com os democratas tendo feito um trabalho profundo de alistamento eleitoral. Hoje, a maioria dos eleitores registrados da Flórida é democrata, da mesma maneira que entre os latinos, que representam 12% do eleitorado do estado.

As pesquisas locais mostram uma disputa apertada, com Obama na frente. A diferença a seu favor, que já foi mínima, tem se ampliado nos últimos dias.

O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, esteve em Washington visitando a Suprema Corte, e teve uma conversa de meia hora com Antonin Scalia, considerado um dos mais brilhantes juristas dos Estados Unidos, e certamente um dos mais conservadores, chamado de "gênio do mal" por seus adversários liberais.

Ele contou a Mendes que, quando esteve em Brasília, espantou-se com o projeto de Oscar Niemeyer que colocou para morar no mesmo conjunto habitacional todos os membros do Supremo: "Eu vi logo que aquilo não ia dar certo. Esses comunistas não entendem nada de convivência humana", comentou.

O presidente do Supremo brasileiro, que levava para seus interlocutores na viagem um livro com a obra de Niemeyer, guardou o reservado para Scalia na pasta.