Título: Câmara contraria TSE e STF e mantém infiel
Autor: Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 30/10/2008, O País, p. 12

Ayres Britto critica decisão da Casa de não cumprir resolução do tribunal, questionada pela Procuradoria Geral

Isabel Braga e Carolina Brígido

BRASÍLIA. O movimento para flexibilizar a fidelidade partidária ganhou fôlego ontem e intensificou a quebra de braço entre a Câmara e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Por 30 votos a 5, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara deu sobrevida ao mandato do deputado Walter Brito Neto (PRB-PB), que trocou o DEM (pelo qual foi eleito) pelo PRB, após o prazo estabelecido pelo Judiciário. O parecer aprovado na CCJ embasa decisão da Mesa da Câmara, que resiste em cumprir determinação do TSE favorável à devolução do mandato de Brito Neto ao DEM.

Ontem, o presidente do TSE, Carlos Ayres Britto, mostrou-se surpreso com a atitude da Câmara. Ele disse que esta semana deverá levar o caso ao plenário da Corte. Ayres Britto informou que já enviou à Casa três ofícios comunicando a decisão de tomar o mandato de Britto Neto:

- Eu, de fato, me surpreendo. Vai ser a primeira vez que a resolução do TSE (sobre fidelidade partidária) será desrespeitada. Há algumas centenas de decisões nesse sentido, e as câmaras legislativas vêm cumprindo. Com base nessa experiência, nossa expectativa era de sereno cumprimento (por parte da Câmara dos Deputados).

O TSE, em 27 de março deste ano, atendeu ao pedido do DEM para decretar a perda do mandato de Brito Neto, por infidelidade partidária, e dar a vaga ao partido. Neto recorreu, mas foi derrotado. O primeiro aviso de que a medida deveria ser cumprida chegou à Câmara em setembro.

Em 2007, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o mandato pertence ao partido e que aqueles que deixassem a legenda pela qual foram eleitos o perderiam. As regras estão na resolução 22.617 do TSE, que é questionada no STF, por meio de duas ações: uma proposta pelo PSC e a outra, pela Procuradoria Geral da República.

Brito Neto mantém o cargo porque a Câmara protela o cumprimento da decisão do TSE. Sob o argumento de que só foi comunicado oficialmente em setembro, Arlindo Chinaglia (PT-SP) decidiu consultar primeiro a Corregedoria e a CCJ.

"Como cassar o mandato sem o trânsito em julgado?"

Ontem, a CCJ decidiu que a Câmara só terá que decretar a perda do mandato depois que o STF julgar a constitucionalidade da resolução do TSE. Deputados do DEM e do PPS criticaram o parecer do relator, Regis de Oliveira (PSC-SP), mas foram voto vencido. Para o relator, o TSE usurpou do Congresso a função de legislar, e só depois que o STF decidir caberá à Câmara declarar a perda do mandato:

- Se o STF entender que é caso para a perda de mandato, vamos cumprir. Mas como cassar o mandato de alguém sem acórdão, sem o trânsito em julgado?

Outra flexibilização da fidelidade partidária está em projeto do líder do PR, Luciano de Castro (RR), aprovado em 2007 pela Câmara. O projeto, que deverá ser aprovado pelo Senado, pune, com inelegibilidade por quatro anos, os que trocarem de partido, mas abre janela de 30 dias, um ano antes da eleição, para as trocas. E convalida todas as mudanças ocorridas até 30 de setembro de 2007 - antes da decisão do STF.