Título: Lula culpa empresários pela crise
Autor: Batista, Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 29/10/2008, Economia, p. 23

Para presidente, Brasil só foi contaminado porque empresas especularam

Maria Lima

SALVADOR. Empresários brasileiros que estariam especulando com o dólar foram responsabilizados ontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelas dificuldades das autoridades monetária e econômica em controlar os fortes efeitos da crise global no país. Para ele, o Brasil está sendo contagiado porque companhias domésticas não se contentaram com o lucro espetacular que auferiram nos últimos anos com suas atividades e decidiram entrar "na jogatina" para ganhar ainda mais e de forma que o presidente considera até ilícita.

Gigantes como Sadia e Aracruz fizeram complexas operações no mercado de derivativos (contratos futuros) no qual apostaram que o real se fortaleceria ainda mais frente ao dólar. Mas a crise internacional mudou o cenário e levou estas e muitas companhias e bancos a registrarem fortes perdas, além de uma corrida ao dólar que fez explodir a taxa de câmbio.

Lula, que participou da 9ª Cúpula Brasil Portugal, em Salvador, disse que seu governo trabalhou "honestamente durante seis anos" para colocar a economia brasileira num padrão "respeitável no mundo inteiro". Além disso, salientou, o sistema financeiro nacional é sólido, não tem créditos podres e o setor produtivo têm bilhões em investimentos programados.

Premier português defende Brasil em Conselho da ONU

Ou seja, segundo Lula, o país teria tudo para passar mais tranqüilamente pelo teste atual não fossem os empresários que, além das operações de hedge (proteção tradicional contra a variação do dólar), decidiram lucrar com o "cassino financeiro":

- Resolveram ganhar um pouco mais, tentando construir um cassino após o hedge para ganhar com a especulação da desvalorização do dólar e da valorização do real. Portanto, quem foi para a jogatina perdeu. Neste país, duvido que tenha um momento em que os empresários ganharam tanto dinheiro como nesses últimos anos - disse Lula. - Portanto, ninguém tinha o direito de tentar, de forma eu diria ilícita, mais do que aquilo que o próprio sistema produtivo do país oferecia.

Lula e o premier português, José Sócrates, defenderam uma enérgica intervenção do Estado no sistema financeiro mundial, para que seja aprimorada a regulação e se evite especulação e prejuízos à sociedade.

- Houve um tempo em que o mercado podia tudo, todo mundo tinha soluções, só o Estado é que não podia nada. Agora chegou a vez, não de fazermos o Estado voltar a se intrometer na economia e fazer fábricas, mas que tenha força política para regular a economia do país.

José Sócrates - que defendeu a reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas de forma que o Brasil tenha vaga permanente - disse que é hora de os países se unirem para fazer as mudanças necessárias na área financeira:

- O primeiro passo foi dar uma resposta para mitigar os efeitos da crise , que é uma daquelas que a gente só vê de cem em cem anos. Essa é uma crise absolutamente global. E, como toda crise, é injusta, porque envolve países que nada têm a ver com elas.