Título: Fazenda pode ampliar prazo para pagar tributos
Autor: Batista, Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 29/10/2008, Economia, p. 23

Medida, proposta pela CNI, significaria injeção de caixa para empresas. Governo vai avaliar impacto nas contas públicas

Henrique Gomes Batista e Gustavo Paul

BRASÍLIA. O setor industrial pediu ontem, e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, confirmou estar estudando o aumento temporário no prazo de recolhimento dos tributos federais para dar liquidez às empresas, que enfrentam dificuldades de se capitalizar em meio à turbulência internacional. Segundo o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), deputado Armando Monteiro Neto (PTB-PE), os empresários teriam importante injeção de capital de giro, sem custos financeiros, se não precisassem pagar, com periodicidade inferior a 30 dias, impostos sobre compra e venda de mercadorias e serviços.

De acordo com dados da Receita, os cinco principais tributos federais pagos pelas empresas - Imposto de Importação, IPI, Imposto de Renda, CSLL e Cofins - arrecadaram R$24,996 bilhões em setembro.

- A medida agiria diretamente no setor produtivo, sem a necessidade de esses recursos passarem pelos bancos - disse Monteiro.

"O governo está dando sangue aos vampiros"

Diante de uma platéia de empresários, que participavam do 3º Encontro Nacional da Indústria (Enai), Mantega ressaltou que todas as propostas têm de ser avaliadas de acordo com a situação das contas públicas. Segundo ele, a gestão fiscal eficiente, até agora ancorada numa arrecadação crescente, pode ser atrapalhada pela esperada redução dos tributos.

- Essa medida está sendo cogitada, mas temos de olhar o impacto sobre as contas públicas, sobre a arrecadação. Temos de olhar os dois lados, mas estamos vendo essa questão - disse Mantega, que há três semanas recebeu formalmente a proposta da CNI.

A medida seria temporária: por um período de pelo menos seis meses o prazo de pagamento de tributos seria alongado por cerca de 30 dias. Isso poderia, segundo cálculos preliminares, liberar mensalmente, em média, o equivalente a 25% do caixa das empresas.

Segundo Monteiro, atualmente o prazo médio de pagamento de impostos é inferior a 30 dias, herança do período de inflação alta. O problema é que as empresas têm prazos cada vez maiores - de até 120 dias - para receber dos clientes. O ideal, disse Monteiro, é que os impostos estaduais fossem incluídos na medida. Mas admitiu que isso é politicamente complicado. A decisão federal, porém, seria um fator indutor para os estados, afirmou:

- Não se trata de renúncia fiscal, pelo contrário. É uma medida sábia que deixará as empresas solventes, inclusive para pagar impostos futuros. Mas terá efeito no fluxo de caixa do governo.

Os empresários presentes aplaudiram a proposta da CNI e manifestaram a insatisfação com o fato de os bancos privados comprarem títulos públicos com os recursos liberados dos depósitos compulsórios, em vez de repassá-los ao setor produtivo. O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Luiz Aubert Neto, defendeu ainda a redução da taxa de juros para incentivar a economia e criticou os bancos privados:

- O governo tem tomado medidas corretas contra a crise, mas os bancos continuam represando crédito e aumentaram fortemente os juros. O governo está dando sangue aos vampiros - disse Aubert, excluindo o Banco do Brasil e a Caixa Econômica da crítica.

O presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Humberto Barbato, também pediu a redução dos juros e defendeu que o Banco Central, ao liberar os compulsórios, trabalhe para que os bancos não represem esses recursos. E propôs a desoneração do setor para evitar o encarecimento dos eletroeletrônicos.

Mantega: "crise de longa duração e magnitude inédita"

Mantega fez questão de reconhecer a gravidade da crise, mas repetiu que os países emergentes estão mais bem preparados para enfrentá-la:

- Será uma crise de longa duração e magnitude inédita. Teremos um forte impacto na atividade econômica, na economia real, o mundo todo vai desacelerar, e isso está ficando nítido agora. É incrível como o trancamento do crédito pode se transmitir rapidamente para a economia real.

O empresário Jorge Gerdau elogiou as ações recentes do governo, mas criticou a lentidão em reduzir os gastos públicos:

- A crise é uma só e não podemos enfrentá-la com 40% da economia brasileira, que estão no setor público, aumentando custos salariais.

Único parlamentar de oposição presente, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) criticou o governo por não ter feito as reformas da Previdência, Tributária e Trabalhista.