Título: Não fizemos ataque pessoal
Autor: Freire, Flávio
Fonte: O Globo, 26/10/2008, O País, p. 29

Marta diz que polêmica em torno de sua campanha foi injustificada.

Embora as pesquisas indicassem sua derrota hoje, a ex-ministra do Turismo Marta Suplicy (PT) não perdeu a esperança de uma virada como reflexo do seu desempenho no debate da TV Globo anteontem. Em entrevista por e-mail, antes do debate, afirmou que não quis atacar seu adversário, o prefeito Gilberto kassab (DEM), ao falar da vida pessoal dele no programa. Marta disse que a polêmica foi injustificada, porque "não fez ataques pessoais". Para Marta, a eleição em São Paulo sempre foi difícil, e ela vai pagar o preço por "romper com padrões vigentes".

Germano Oliveira e Ricardo Galhardo

A senhora ainda acredita numa virada?

MARTA SUPLICY: Eleição só se ganha quando as urnas são abertas e os votos contados. Respondo tas perguntas pouco antes do último debate. Hoje é um dia muito importante. Vou colocar a diferença entre as duas candidaturas. Tenho mais experiência acumulada. Fiz muitos acertos. Alguns erros, mas aprendi com eles. Sempre tive presente que uma eleição em São Paulo é muito disputada e difícil de se encerrar no primeiro turno. Fizemos uma campanha que procurou mostrar propostas e a experiência de governo que tivemos entre 2001 e 2004. Realizamos muito na cidade, com menos recursos do que hoje estão disponíveis. Mas tivemos, no primeiro turno, contra nossa candidatura praticamente todas as demais.

No segundo turno, a senhora se manteve atrás. O presidente Lula disse que a senhora é vítima de preconceito.

MARTA: Concordo com o presidente Lula. Romper com padrões vigentes impõe custos. Pago por isso. Por exemplo, por assumir a defesa pública de bandeiras em favor de direitos humanos e de direitos das minorias. A escolha que fiz, ao realizar um governo que de fato promoveu a redução das desigualdades sociais, foi atacada.

Houve a polêmica das perguntas que sua campanha fez a Kassab, se ele era casado e tinha filhos. Isso estancou o crescimento da sua candidatura?

MARTA: A partir da abordagem dada no noticiário, instalou-se uma polêmica contra nossa campanha, injustificada, porque não fizemos ataque de caráter pessoal contra o adversário.

A senhora disse que o prefeito deu andamento a projetos de sua administração. O prefeito não fez nada inovador?

MARTA: Não fez nenhum projeto que alterasse significativamente a vida das pessoas. Não lançou projeto novo, estruturante para a cidade, e é muito mal avaliado no trânsito, no transporte público e na saúde.

Kassab disse que ele e Serra pegaram a cidade quebrada. Já a senhora assegura que pegou a cidade devastada por gafanhotos, entre eles o atual prefeito.

MARTA: Somos responsáveis pelo que defendemos política e administrativamente. Kassab governou com Pitta e continuou apoiando Pitta, após sair do governo. Hoje, na campanha, fala que se arrepende. Ao assumir a prefeitura, herdei o acordo entre Pitta e FHC, numa dívida de longo prazo de mais de R$21 bilhões, compromissada durante 30 anos, cujo pagamento onerava 13% das receitas líquidas mensais do município. E uma cidade com o transporte público desarticulado, dominado por máfias. A saúde aparecia nas páginas de polícia com o PAS. Professores desmotivados. Nenhum programa social em andamento. Kassab foi secretário de Planejamento de Pitta, por quase dois anos. Tem responsabilidade sobre esse desastre.

Mas a administração de Kassab tem sido bem avaliada. Isso é fruto de marketing?

MARTA: Kassab fez tudo com propósito eleitoral. Deixou para inaugurar coisas em cima da eleição, numa caça frenética ao voto. Com a propaganda na televisão, apresentou números que não são verdadeiros - ele diz que "está entregando", para inflar dados. Um exemplo é o do metrô. Ele fez uma cerimônia de entrega de recursos que não passou nem perto do total que ele disse investir.

O que difere a senhora de Kassab?

MARTA: Temos visões de mundo, concepções de sociedade e projetos de cidade radicalmente distintos. Sempre lutei pela democracia, pela ampliação de oportunidades, pela diminuição das desigualdades sociais. Sempre fui do PT. Kassab é cria do malufismo, do PFL, do DEM. E a gente sabe o que isso significa.

Lula e o PT têm dificuldades de falar à classe média?

MARTA: O presidente Lula já colocou ter enfrentado e vencido preconceitos. Prova disso é que duas vezes foi eleito presidente. Ele é o presidente que governa para todos. A vinda dele só ajudou, tenho certeza. Agradeço muito o apoio dele.