Título: Realidade aproxima os dois países
Autor: Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 26/10/2008, O Mundo, p. 57

Há situações políticas que fogem aos padrões tradicionais. A atual eleição presidencial americana é uma delas. No Brasil acostumou-se a pensar que o Partido Republicano traz benefícios ao nosso comércio exterior por ser mais favorável ao livre comércio (!), com maiores benefícios à nossa balança comercial. Nosso comércio exterior já não é tão dependente dos EUA e a complexidade do mapa do comércio internacional muda muito para ser o centro de nosso interesse nacional. Aliás, interesses nacionais não são determinados, exclusivamente, pela pauta comercial, ainda que importante.

Politicamente, as eleições americanas em relação ao Brasil passam pela mudança de ótica de nossos interesses, que estão acima dos negócios comerciais e girariam em torno dos fundamentos das plataformas republicanas e democratas: McCain-Palin x Obama-Biden. A candidatura McCain-Palin representa, quer o candidato queira ou não, a continuidade da política de Bush: se não o pior, um dos piores governos americanos em toda a sua história, do ponto de vista interno (crise econômico-financeira) e na frente externa, com o descrédito da política externa e duas guerras (Iraque e Afeganistão), destacando os gigantescos gastos militares que pesam - apesar da ausência de comentários da imprensa e de especialistas - enormemente na situação da atual crise financeira com reflexos em todas as regiões do mundo.

Para o governo de Lula, a crise financeira, notoriamente contagiosa, deve ser descartada. A candidatura Obama já é em si mesma fenômeno notável de mudança política nos EUA e de suas relações com o mundo e, óbvio, com o Brasil. Sem muito exagero, somos reféns das eleições americanas. Obama tem a sensibilidade e, pelas indicações eleitorais, a liderança em temas que são de grande repercussão no Brasil. Refiro-me às questões da pobreza, que nos EUA permanece alta (37 milhões de pessoas vivem na miséria), o que aproxima Obama das políticas sociais - como Bolsa Família - do governo Lula, com apoio da sociedade civil brasileira. Ganharíamos todos em apostar na vitória e na Presidência de Obama, mesmo com o legado sombrio republicano. O presidente Lula terá bom início de conversa com Obama apresentando-lhe os resultados do Bolsa Família como uma modesta ferramenta brasileira para diminuir os 37 milhões de pobres na mais rica nação do mundo. Avante, companheiro!

CLÓVIS BRIGAGÃO é cientista político, diretor do Centro de Estudos das Américas, Universidade Candido Mendes