Título: Brasil e emergentes comandarão recuperação
Autor: Rangel, Juliana
Fonte: O Globo, 02/11/2008, Economia, p. 30

Livro mostra que, das cem empresas mais preparadas para enfrentar os desafios globais, 13 são brasileiras.

A crise econômica que assola os mercados já está afetando o crescimento das principais nações do planeta e, conseqüentemente, os preços das commodities, como petróleo e minério. Mas, para o sócio do Boston Consulting Group Harold Sirkin, os valores vão se recuperar puxados por um grupo de 14 países emergentes, entre eles, o Brasil. No livro "Globalidade, a nova era da globalização", que chegou às prateleiras nas últimas semanas (Nova Fronteira, 320 páginas), Sirkin diz que o jogo virou: se, antes, a globalização consistia numa "relação de via única", em que os países desenvolvidos se aproveitavam da mão-de-obra barata dos emergentes, na "globalidade" são os países em desenvolvimento que comandarão a recuperação da crise global.

- Quase acidentalmente, aconteceu que o PIB (soma de bens e serviços produzidos) dos países em desenvolvimento começou a crescer. As pessoas andavam de bicicleta na China, passaram a usar motocicletas e agora andam de automóvel. Existe uma recessão e a demanda vai cair em Estados Unidos, Europa Ocidental e Japão. Mas a China ainda está crescendo, a Índia e o Brasil também. A longo prazo, com todas essas pessoas consumindo mais, o mundo vai precisar produzir mais minério, mais comida e mais petróleo - disse, em entrevista exclusiva ao GLOBO, na semana passada, no Rio.

Onda dos emergentes está mais para tsunami

Sirkin, junto com os co-autores James W. Hermeling e Arindam Bhatacharya, parte do pressuposto que, nos próximos anos, pessoas que estão entre a classe média emergente e a população extremamente pobre entrarão para o mercado consumidor. No entanto, o grupo - classificado como "o próximo bilhão" - terá hábitos diferentes. E, nesse contexto, as empresas de países emergentes estariam mais preparadas para atendê-los.

Os autores citam o caso da empresa de telefonia móvel indiana Bharati, que criou uma forma engenhosa de distribuição de chips e cartões de recarga de celular em Bombaim. Para isso, utilizou uma rede já existente de cerca de cinco mil dabbawallas, homens que recolhem almoços caseiros preparados no subúrbio para entregar em centros comerciais.

- O modelo tradicional de classes A, B e C pode não funcionar com esses consumidores. E as empresas do Bric (grupo de emergentes composto por Brasil, Rússia, Índia e China) levam vantagem nesse novo mercado porque conhecem esse público, são engenhosas e estão acostumados a encontrar soluções criativas - defende.

O especialista reconhece que o mundo já viveu várias "ondas" de companhias promissoras. Entre elas, a das empresas americanas no início do século XX, em desafio às européias; ou a oferta de produtos japoneses na década de 70, com baixo custo e alta qualidade, seguida pelas temporadas de destaque de empresas de México e Coréia do Sul.

Vale e Petrobras no grupo de cem empresas desafiantes

No livro, os autores listam cem empresas que consideram as mais desafiantes do mundo. A China tem 42 companhias na lista, e a Índia, 20. O Brasil vem na terceira colocação, com 13 empresas. Entre elas estão gigantes da indústria nacional, como Embraer, Petrobras e Vale, além de empresas como a fabricante de produtos de engenharia WEG ou a de equipamentos automotivos Marcopolo.

Como o levantamento foi feito em 2007, não considerou problemas que vêm sendo enfrentados pelas companhias por conta da crise. A Sadia, uma das empresas citadas, declarou prejuízo de R$777 milhões no terceiro trimestre, por causa de operações malsucedidas com derivativos de câmbio. A Vale, que também está na lista, teve lucro recorde no período, de R$12,433 bilhões. No entanto, anunciou cortes em sua produção, devido à crise financeira global.

Segundo Sirkin, o ranking levou em conta a versatilidade das companhias, sua estratégia de aquisições e engenhosidade, entre outros quesitos. CSN, por exemplo, ficou fora da lista porque se mostrou pouco agressiva em termos de aquisições, comportando-se apenas como "uma empresa exportadora" e não uma companhia com ambições de ser grande globalmente. A AmBev, por sua vez, foi considerada belga, já que foi vendida à belga Interbrew.

Com prefácio assinado pelo presidente da Vale, Roger Agnelli, o livro é permeado por histórias de criatividade. Entre os exemplos mencionados, está o da recuperação da Embraer. De "empresa praticamente falida em 1995", segundo os autores, a Embraer se transformou na terceira maior fabricante de aeronaves comerciais do mundo. Para Sirkin, o Brasil tem algumas vantagens em relação a outros emergentes:

- O Brasil tem muitos recursos naturais, sem contar boa qualidade de mão-de-obra. Além disso, tem uma característica de estabilidade que outros países não têm, como um governo estável, democrático e localização em uma região segura do mundo.