Título: Ipea: royalties não garantem o crescimento
Autor: Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 06/11/2008, Economia, p. 28

Instituto afirma que ter muito petróleo pode reduzir os investimentos e incentivar a corrupção em municípios.

BRASÍLIA. Um estudo feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a pedido da diretoria do órgão, afirma que a manutenção do atual sistema de distribuição de royalties de petróleo no país favorecerá um grupo pequeno de estados e municípios, sem garantir crescimento econômico. A pesquisa "Sobre maldições e bênçãos: é possível gerir recursos naturais de forma sustentável?" mostra que, hoje, os recursos beneficiam apenas 902 dos 5.600 municípios do país. Dos eleitos, 358 têm alta renda ou economia dinâmica e recebem 84,1% do montante.

Os demais 544 municípios, com renda baixa ou estagnada, levam apenas 15,9% desse dinheiro. A pesquisa detalha repasses por unidade da Federação e mostra ainda que 84% do dinheiro destinado aos estados vão para o Rio de Janeiro - maior produtor de petróleo do país, devido aos poços da Bacia de Campos -, e 74% do que é canalizado a municípios vão para cidades fluminenses.

Segundo Bruno de Oliveira Cruz, diretor-adjunto de Estudos Regionais e Urbanos do Ipea, algumas evidências sugerem que os recursos destinados a municípios não têm contribuído para o desenvolvimento local. Citando pesquisas feitas em outros países e no Brasil, ele lembra que ter muito petróleo pode reduzir a taxa de investimento dos setores não-extrativistas, incentivar a corrupção e a malversação de recursos públicos e reduzir incentivos para acumulação de capital humano.

Além disso, afirma, aumenta a volatilidade e a instabilidade macroeconômicas, em razão da oscilação dos preços internacionais do óleo.

- Um aumento em 1% dos royalties levaria a uma redução de 0,06% na taxa de crescimento do PIB dos municípios. É a maldição dos recursos naturais. Os municípios gastam mal esses recursos - afirmou Cruz, citando pesquisa feita em 2007 pelo professor Fernando Postali, da Universidade de São Paulo (USP).

Fundos de Noruega e Alasca seriam exemplos

O material do Ipea deverá ser apresentado ao governo, que discute as novas regras para a exploração da camada de pré-sal.

- Tratamos de temas relativos à desigualdade do financiamento público. Damos elementos para ajudar o gestor a tomar suas decisões, e o objetivo é mudar as políticas ou aperfeiçoá-las - diz Márcio Pochmann, presidente do Ipea.

O autor da pesquisa questiona os argumentos a favor da atual distribuição dos royalties - alguns apontam que estes funcionam como compensação aos impactos ambientais da extração dos recursos e do risco de fechamento da indústria com o fim da exploração. Para Cruz, esses argumentos são obsoletos.

O estudo propõe que sejam aprovadas mudanças na legislação para criação de fundos que destinariam recursos para objetivos de longo prazo. Com isso, a riqueza gerada com o petróleo seria mais bem distribuída na economia. Para Cruz, o Brasil poderia se espelhar nos exemplos da Noruega, Alasca e Botsuana, que criaram fundos voltados à educação e à distribuição da renda.