Título: Perdão polêmico
Autor: Lima, Maria; Suwwan, Leila
Fonte: O Globo, 14/11/2008, O País, p. 3

PILANTROPIA

Presidente do Senado ameaça devolver MP que concede anistia fiscal a filantrópicas

Maria Lima, Leila Suwwan e Chico de Gois

Cresceu ontem a polêmica sobre a medida provisória que concedeu anistia a entidades filantrópicas sob investigação por irregularidades. O reação mais forte veio do presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), que mandou um recado duro ao governo. Ele deixou claro que vai agir para impedir a tramitação da MP da Filantropia, se ela não for modificada. Pressionado, o Executivo começou ontem - seis dias depois de o presidente Lula assinar a medida - um trabalho para tentar brecar o forte desgaste político e impedir que a iniciativa vá para o lixo, conforme ameaça a oposição.

A secretária-executivo do Ministério do Desenvolvimento Social, Arlete Sampaio, disse que o governo aceita até rever o texto da MP para não anistiar entidades suspeitas de irregularidades:

- Se acharem uma fórmula jurídica perfeita para que as entidades não possam constar na lista de prorrogação de renovação dos certificados, não temos nada contra.

Mas o governo ainda não divulgou qualquer dado oficial sobre estimativa de perdas com a anistia, e segue sem dar explicações sobre como deixou os processos das filantrópicas sob suspeita emperrados, sem decisão. No final do ano, começa a vencer o prazo progressivo de cinco anos para cobrança de dívidas, o que só pode ser feito após a cassação do certificado.

Garibaldi quer que sejam revistos, entre outros pontos da MP, a parte que detalha os critérios utilizados para beneficiar as instituições que tiveram anistia de suas dívidas. Garibaldi disse que vai sugerir ao presidente Lula que retire a MP do Congresso para revisão. Caso contrário, adotará medidas para impedir sua tramitação.

- Essa MP está sendo muito questionada pelas mais diversas vozes, dos mais diversos segmentos da sociedade. Não há clareza sobre a renúncia fiscal e os critérios adotados para beneficiar esta ou aquela instituição. Estou sugerindo ao governo que, diante deste questionamento que está sendo colocado, peça a MP de volta para revisão. Se ele não pedir de volta, eu posso fazer outras coisas, mas daí já é um segundo capítulo - disse Garibaldi.

Para petista, MP é moralizadora

Ao mesmo tempo, a base governista começou uma mobilização para defender a MP, tentando centrar o debate apenas na mudança de regras para a isenção tributária das filantrópicas no futuro. A idéia é encerrar a discussão sobre o perdão potencial de bilhões de reais em dívidas com o INSS e a Receita e evitar que a medida seja batizada de "MP das Pilantrópicas", conforme discursos da oposição anteontem. O líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), saiu de reunião com líderes da base aliada afirmando que o objetivo da MP é moralizador, mas disse aceitar negociações para alterar o texto.

- Na verdade, a MP tem um objetivo moralizador em relação aos controles da filantropia no país, porque ela muda substancialmente a forma de conceder o certificado de filantropia - disse Fontana.

O Ministério do Desenvolvimento Social emitiu uma nota exaltando apenas as mudanças futuras no processo de certificação filantrópica, que darão mais participação à Receita Federal e agilizarão as cobranças, em caso de irregularidade. E o Ministério da Previdência emitiu nota técnica explicando os pontos positivos. Os dois ministérios afirmam não saber o valor dos recursos que deixarão de ser arrecadados com a anistia. Segundo o Ministério Público, a MP dará isenção de R$2,144 bilhões às filantrópicas.

A MP permitiu que 2.274 entidades obtivessem a renovação automática de seus certificados. Muitas delas estão sob suspeita de fraude. Parte delas foi alvo da Polícia Federal em março, na Operação Fariseu, por participar de um esquema de pagamento de propina para renovação de certificados.