Título: Lula pede que Papa dê conselhozinho
Autor: Berlinck, Deborah
Fonte: O Globo, 14/11/2008, Economia, p. 22
Presidente sugere que Pontífice fale sobre crise nos sermões de domingo
Deborah Berlinck
ROMA. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva debateu ontem a crise financeira global com o Papa Bento XVI, em sua primeira audiência no Vaticano.
- Eu pedi ao Papa que nos seus pronunciamentos falasse sobre a crise econômica. Se todo domingo o Papa der um conselhozinho, quem sabe a gente encontre mais facilidade para resolver a crise - afirmou o presidente brasileiro.
Segundo ele, o Papa reconheceu que a crise é grave. Porém, foi Lula quem mais falou publicamente sobre o assunto. Até porque, segundo o presidente, é "pecado" contar o diálogo com o Papa. E o Vaticano não divulga as conversas de Bento XVI.
- Disse ao Papa que o que me preocupa é que empresário pode perder um pouco, mas vai continuar sendo empresário e continuar rico - disse o presidente, acrescentando que não quer que a crise resulte em empobrecimento maior da população.
Compra da Nossa Caixa deve ser divulgada em breve
Lula embarcou ontem para Washington, onde participará da reunião do G-20 (grupo de países ricos e os principais emergentes), encerrando uma viagem de cinco dias a Roma. Em entrevista à imprensa brasileira, Lula fez uma vigorosa defesa do consumo, e conclamou os estados a seguirem os exemplos de São Paulo e Minas Gerais, que anunciaram pacotes de incentivo ao setor produtivo, que está sofrendo com a crise. O presidente alertou para o risco de "pânico psicológico", que faz com que as pessoas alimentem a crise:
- Se todo dia nós falamos de crise e colocamos um pouco de terrorismo na crise, o que vai acontecer? O consumidor que estava querendo comprar um carro novo, uma casa nova, uma geladeira, uma televisão? Na hora que ele parar de comprar, aí a crise começa a chegar à economia real.
A preocupação do presidente é com o risco de aumento do desemprego.
- Na hora que você não compra um carro, é menos um carro produzido e pode ser um posto de trabalho que você perde. Comprem! - disse Lula.
Ele não descartou novas medidas do governo.
- Vou encontrar com o companheiro Guido (Mantega, o ministro da Fazenda) em Washington. Certamente teremos oito horas de viagem para conversar sobre novas medidas que o governo pode tomar. Eu não sei quais são - disse o presidente, acrescentando que o governo vai tomar medidas em todos os segmentos da economia que apresentarem problemas.
Troca de presentes e conversa reservada
O presidente disse que só quando retornar a Brasília, na próxima semana, é que o governo decidirá sobre a negociação da compra do banco Nossa Caixa pelo Banco do Brasil. Ele disse que vai conversar pessoalmente com o governador de São Paulo, José Serra, sobre o assunto.
- Se for um negócio comercial e de interesse do Banco do Brasil e se tivermos recursos, que seja feito - disse o presidente.
A visita ao Palácio Apostólico terminou com uma troca de presentes após uma conversa reservada de 24 minutos na biblioteca. Lula ofereceu a Bento XVI uma escultura de barro de retirantes do Nordeste, do artista Manuel Eudócio, de Caruaru. O papa retribuiu com uma caneta ornamentada numa caixa com alguns escritos.
- Esperamos recebê-lo novamente no Brasil - disse Lula, na despedida.