Título: Um PAC para o funcionalismo
Autor: Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 09/11/2008, O País, p. 3

Reajustes custarão R$8 bilhões extras em 2008, valor gasto até outubro no programa federal.

O governo federal deve fechar 2008 gastando com pessoal e encargos sociais nos três poderes cerca de R$8 bilhões acima do autorizado inicialmente no Orçamento da União deste ano, que era de R$137,6 bilhões. Em novembro, segundo dados do Sistema Integrado de Administração Financeira do governo (Siafi), a verba máxima autorizada para a folha de pagamento do funcionalismo está em R$145,9 bilhões. O governo reconhece o aumento, mas fixa o gasto global com funcionalismo num patamar um pouco menor, R$143,9 bilhões, conforme reprogramação orçamentária divulgada em setembro. Segundo cálculos da Comissão Mista de Orçamento, de 2000 a 2009 houve um crescimento de 224% nos gastos do governo com pessoal - na comparação direta dos valores autorizados nos orçamentos.

O Ministério do Planejamento editará novo relatório em novembro, elevando um pouco mais o teto dos gastos com a folha. Segundo técnicos do governo, é possível que não seja utilizada toda a verba autorizada (R$8,3 bilhões), mas algo em torno de R$6,3 bilhões acima do previsto na lei orçamentária.

Para se ter uma idéia do que representa o gasto extra com pessoal, o orçamento do Bolsa Família para 2008 é de R$10,4 bilhões. Além disso, a despesa extra é praticamente o mesmo valor já liberado pela União já para as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) até 23 de outubro (R$8,2 bilhões). Ou quase metade do total previsto para o PAC este ano.

O crescimento nas despesas do governo com pessoal é fruto do impacto dos reajustes salariais concedidos e do preenchimento de cargos criados este ano. O impacto total dos reajustes - concedidos em quatro medidas provisórias - será de R$11,2 bilhões este ano. Em julho, para cobrir o rombo dos reajustes negociados com quase todas as categorias do serviço público, o governo aprovou no Congresso crédito adicional de R$7,55 bilhões.

Para 2009, o gasto global com funcionalismo saltará para R$169,1 bilhões, sendo R$128,5 bilhões só para o Poder Executivo. São mais R$31,5 bilhões nas contas públicas, se comparados aos R$137,6 bilhões fixados inicialmente para 2008. Só os reajustes dos servidores, aprovados este ano, terão um impacto financeiro de R$29 bilhões em 2009.

Esse impacto já foi incorporado ao relatório preliminar do relator do Orçamento de 2009, senador Delcídio Amaral (PT-MS), o que gerou irritação na área econômica. O relatório do senador, aprovado semana passada pela Comissão Mista de Orçamento, mostra preocupação com os gastos com pessoal: "Para 2009, a estimativa é que as despesas com pessoal representem 37,4% da receita corrente líquida do governo".

Em reunião com o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, o senador petista avisou que será necessário fazer cortes em custeio devido à crise financeira, que provocará uma queda na receita da União para 2009. Delcídio ponderou que, em tempos de crise financeira internacional, a prioridade deve ser investimento:

- Como relator, acredito que temos que priorizar mais do que nunca os investimentos. O papel do governo, num momento como esse, é fundamental para que a economia sofra menos o impacto da crise. Quanto ao gasto com pessoal, o governo precisa fazer uma reavaliação da gestão. Nem sempre mais quantidade é qualidade - disse.

Arrecadação pode cair em 2009

A própria equipe econômica prevê uma queda de arrecadação em 2009 de mais de R$15 bilhões, com um efeito direto para a União de R$8 bilhões. Além disso, o governo já admitiu que vai cumprir em 2009 apenas a meta de 3,8% do PIB para superávit primário, sem poupança extra, como vinha fazendo, com um superávit na prática de 4,3%.

A discussão sobre os gastos do governo com o funcionalismo é reforçada pela oposição, que impediu, semana passada, a aprovação na Câmara da criação de cargos para a Educação. O deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP), que acompanha a aprovação de projetos e MPs a respeito do assunto, diz que o governo promove uma "irresponsabilidade fiscal". Os tucanos apostam que a folha chegará a R$152,9 bilhões este ano.

- O governo está com um certo irrealismo. Parece que, cada vez mais, tem compromisso com aumento de salários e criação de novos cargos. O governo não observa a responsabilidade fiscal quando dá aumentos que ficarão para 2011 e 2012. Quando o ministro (Paulo Bernardo) diz que não vai dar aumento, se não tiver o dinheiro, está confessando que não cumpre a Lei de Responsabilidade Fiscal - critica Madeira.

Paulo Bernardo tem demonstrado irritação com as críticas à política de reajuste e de criação de cargos. Perguntado sobre o assunto na última quinta-feira, ficou extremamente irritado e se recusou a falar, ressaltando apenas que os gastos já estavam previstos e sob controle.

Paulo Bernardo sempre prefere dizer que os gastos com folha são de R$133,3 bilhões. Ele exclui a Contribuição Patronal da Seguridade do Servidor (CPSS), de cerca de R$10 bilhões, da conta.

Para a professora-adjunta e integrante do Grupo Conjuntura da UFRJ, Margarida Gutierrez, a arrecadação deverá ter uma queda, devido à desaceleração da economia brasileira em 2009:

- É um quadro diferente do experimentado até agora pelo governo Lula. O padrão anterior foi rompido, porque o crescimento dos gastos tinha como base um aumento da carga tributária. Agora, o país vai crescer menos. Terá que haver mudanças no Orçamento, não há milagres - disse.