Título: Demitidos por nepotismo tentam burlar proibição
Autor: Lima, Maria; Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 09/11/2008, O País, p. 8

Funcionária demite contínuo de empresa contratada pelo Senado para empregar filha, mas termina perdendo função de confiança na liderança do PMDB.

BRASÍLIA. Depois de resistir a demitir parentes não concursados - em cumprimento à súmula do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou o fim do nepotismo nos três poderes -, políticos e funcionários em cargos de chefia em órgãos públicos buscam agora atalhos e manobras para burlar a proibição e garantir o emprego dos parentes em cargos comissionados. No Congresso Nacional, uma das janelas usadas para a recontratação de parentes demitidos é a empresa Vigo Central de Serviços, contratada pelo Senado para manutenção de veículos e fornecimento de contínuos e copeiros. O GLOBO flagrou, semana passada, um caso praticado pela chefia de gabinete da liderança do PMDB no Senado.

Em outubro, depois de ser obrigada a demitir a filha Letícia de Oliveira Nóbrega (não concursada), que trabalhava na Diretoria Geral da Casa, a chefe de gabinete da liderança do PMDB, Edilamar de Oliveira Nóbrega, usou esse atalho: demitiu o contínuo Suetônio Nunes Sá, contratado pela Vigo, e, no mesmo ofício, indicou a filha para a vaga. A troca foi confirmada pelo próprio Suetônio. Por causa do episódio, Edilamar terminou demitida da função de confiança.

- A Edilamar fez um oficio me demitindo e dizendo que a vaga era para colocar a filha dela. Cargo de terceirizado sempre tem alguém na fila esperando para ocupar a vaga. Nesse caso, ela preferiu botar a filha dela. Eu era continuo, mas a Letícia não vai ser nada, vai lá na firma (Vigo) assinar uma vez por mês e receber o salário. Fiquei desempregado e perdi a vaga para alguém que não vai trabalhar - disse Suetônio Sá.

Pouco tempo depois dessa conversa com o GLOBO, sexta-feira, Suetônio foi procurado por Edilamar e outros funcionários do Senado, que o orientaram a não falar com jornalistas. Ela queria saber também se ele havia tirado cópia do ofício que trazia junto a indicação da filha Leticia para sua vaga.

- Não param de me ligar perguntando se fui eu que denunciei e querendo saber do oficio - contou Suetônio, afirmando que não tem cópia do ofício.

Na quinta-feira, perguntada pelo GLOBO se a filha Letícia tinha sido contratada pela Vigo, Edilamar não negou. Gaguejou e disse:

- Não estou sabendo. Minha filha agora está estudando, e hoje está fazendo um exame médico.

Funcionária tem outros parentes no Senado

Na última sexta-feira, Edilamar passou a manhã reunida com diretores do Senado e da empresa Vigo para tentar uma saída para o caso. Sua preocupação maior era que o ofício viesse a público. Na própria sexta-feira, Edilamar, funcionária concursada do Senado, perdeu a função de confiança na liderança do PMDB. Mas não só por isso.

Edilamar tem outros parentes no Senado. No gabinete da liderança da Maioria, vinculado à liderança do PMDB, continua como chefe de gabinete sua irmã, também concursada, Eliana Longo. E Luiz Carlos Ferreira, um dos assessores, é ex-cunhado das duas. As sobrinhas Rafaela Ferreira de Lima e Ana Paula Longo - filha de Eliana- e outra filha, Patricia de Oliveira Nóbrega, foram demitidas. Mas, no lugar de Ana Paula, foi contratada Marilisia Ferreira da Silva, irmã de Luiz Carlos. Nos últimos dois meses, 86 funcionários-parentes foram demitidos do Senado.

Depois da reunião dos diretores com Edilamar para buscar uma saída para o caso, o diretor da Secretaria de Serviços Gerais do Senado, José Ausnemburgo, negou que o pedido de contratação de Letícia tenha sido efetivado pela Vigo. Outros funcionários confirmaram que estava em processo de efetivação. Mas o líder do PMDB, Valdir Raupp (RO), manteve a decisão de demitir todos: Edilamar, Luiz Carlos, Marilisia, Eliana e impedir de vez a possível contratação de Letícia. Como Edilamar e Eliana são concursadas, foram dispensadas das funções de confiança.

O diretor-geral do Senado, Agaciel Maia, disse apenas que considera difícil que parentes demitidos aceitem ser contratados como copeiros e contínuos. O GLOBO procurou falar com "o senhor Milton", o encarregado da Vigo no Senado, pessoalmente no escritório e por telefone, e não obteve retorno.

oglobo.com.br/pais