Título: O número de ações dobrou entre as eleições
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Fonte: O Globo, 16/11/2008, O País, p. 9

Presidente do TSE reconhece demora em decidir alguns casos e promete acelerar julgamentos de governadores

BRASÍLIA. Em rota de colisão com o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), que resiste em cumprir a decisão da Justiça que cassou por infidelidade o mandato do deputado Walter Brito Neto (PRB-PB), o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Carlos Ayres Britto, faz um mea culpa, ao reconhecer a demora do tribunal em concluir alguns julgamentos. Entre eles, os de sete governadores eleitos em 2006. O ministro atribui esse atraso, em parte, a um "acidente de percurso processual" que obrigou os vice-governadores a serem ouvidos. Mas garante que nenhum processo está parado. Sua intenção é acelerar a tramitação deles a partir do fim do ano, mas ele ressalta que o julgamento de governadores requer "cuidados especialíssimos".

Adriana Vasconcelos e Isabel Braga

Como o senhor explica essa demora no julgamento de processos de impugnação de sete governadores?

CARLOS AYRES BRITO: Essa demora se deu em grande parte a um acidente de percurso processual. No meio do caminho, o tribunal entendeu que os vice-governadores deveriam ser também ouvidos. Estabelecemos uma nova jurisprudência sobre casos como estes. Isso fez com que os processos voltassem para os tribunais de origem.

Mas eles já estão quase na metade de seus mandatos.

AYRES BRITTO: Nenhum processo está parado, não. Claro que esses acidentes de percursos e a realização da eleição estão concorrendo para retardar um pouco a solução desses casos. A Justiça Eleitoral prima por essa celeridade.

Essa demora no julgamento não tira a legitimidade dos mandatos e reforça o sentimento de impunidade?

AYRES BRITTO: Acho que ninguém nega à Justiça Eleitoral a virtude de ser o ramo do Poder Judiciário que mais rapidamente dá respostas às demandas feitas. Agora, há dificuldades de toda ordem. O número de ações dobrou de uma eleição para outra e nós todos beiramos a estafa depois de um processo eleitoral.

Com governadores, "cuidados especialíssimos"

São injustas as críticas do presidente da Câmara sobre a lentidão da Justiça Eleitoral?

AYRES BRITTO Não se pode comparar o modo de trabalhar do Judiciário como o do Congresso Nacional, são como água e óleo. Ano passado, eu sozinho ultrapassei em julgamentos a casa dos 18 mil processos. Nem por isso estou criticando o modo de trabalhar do Congresso. O número de causas judiciais é infinitamente maior do que o número de processos legislativos.

Houve troca de papéis entre o Judiciário e o Legislativo? O Judiciário está legislando?

AYRES BRITTO: O Judiciário não pode invadir competências alheias, seja do Executivo ou Legislativo. Rechaço a queixa que se faz de usurpação da função legislativa pelo Judiciário. O que surpreende setores da sociedade é que o Judiciário está projetando sobre a Constituição um novo olhar, mais contemporâneo. Nossas decisões são técnicas e fundamentadas na Constituição e nas leis. Deputados e senadores decidem por critérios políticos, de conveniência, de oportunidade.

Como vê a recusa do Legislativo em cumprir a decisão judicial que cassou por infidelidade o mandato do deputado Walter Brito Neto (PRB-PB)?

AYRES BRITTO: Está havendo um mal-entendido que será resolvido com bom senso e dentro da compreensão de que a ordem jurídica deve ser respeitada, sobretudo quando o Supremo se pronuncia. Desde que não haja insultos e destemperos, tudo se resolve no campo da institucionalidade. Sou presidente do TSE, não do Poder Judiciário. O presidente da Câmara não é presidente do Poder Legislativo. Desde que nos atenhamos aos limites das nossas funções, tudo tende a se resolver e sem crise.

Qual o peso de julgar alguém, governadores no caso, depois de eleito por uma ampla margem de votos?

AYRES BRITTO. Fazemos uma ponderação do direito para os fatos e vice-versa. Nossa consciência se aclara e indica o caminho a tomar. Isso é inevitável. Trata-se da conciliação do direito com a vida, com os fatos.

Há deputados e senadores cassados, não governador...

AYRES BRITTO: Quando você julga um governador, faz uma análise ponderada. É um processo que desperta cuidados especialíssimos. A eventual retirada de um governador do seu cargo mexe com toda a população estadual. Mas não existe tendência de favorecer os governadores.

Qual a chance desses sete governadores serem julgados antes do fim de seus mandatos?

AYRES BRITTO: Depois da diplomação dos eleitos (em dezembro), vamos começar a respirar um pouco, o que permitirá que voltemos os olhos para os processos dos governadores.

oglobo.com.br/pais