Título: Abin x PF, uma batalha judicial
Autor: Carvalho, Jailton de
Fonte: O Globo, 11/11/2008, O País, p. 3

CRISE INSTITUCIONAL

Agência quer impedir acesso a informações sigilosas de computadores apreendidos

Jailton de Carvalho

Aguerra entre a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e a Polícia Federal em torno dos desdobramentos da Operação Satiagraha deve aumentar nos próximos dias. A Abin decidiu ontem que vai recorrer à Justiça para impedir que a PF tenha acesso às informações sigilosas contidas nos computadores apreendidos semana passada pela equipe do delegado Amaro Vieira Ferreira, da Corregedoria da PF, em escritórios da instituição em São Paulo, no Rio de Janeiro e até na sede, em Brasília. Segundo a assessoria de imprensa da Abin, nos computadores apreendidos há informações relativas à segurança nacional e classificadas em diversos graus de sigilo.

- A Abin estuda as medidas judiciais cabíveis, que poderão ser tomadas para preservar o conteúdo de informações de interesse da segurança nacional contido no material apreendido pela PF. São dados que nada têm a ver com o objeto da investigação policial, e que devem ser preservados - disse um assessor do diretor interino da Abin, Wilson Trezza.

A Abin deverá entrar na Justiça para impedir que a PF revele ou permita a divulgação de nomes de agentes que estão sendo investigados por participação na Satiagraha ou por suposta ligação com o vazamento de informações da operação. A Abin alega que, em conseqüência das investigações, os nomes de pelo menos dois agentes já foram tornados públicos. A divulgação teria inviabilizado a permanência deles em setores do serviço de inteligência que exigem o anonimato.

- Queimaram a identidade de alguns agentes. Não podemos deixar que isso aconteça de novo. A Abin já trabalha com um quadro de pessoal muito reduzido - disse um graduado servidor da Abin.

"O sigilo pertence ao presidente"

Segundo ele, o objetivo não é atrapalhar a investigação da PF sobre o vazamento de dados da Satiagraha, mas preservar o sigilo dos dados de segurança nacional, produzidos para o assessoramento da Presidência da República. Diretores da Abin entendem que o acesso de delegados da PF às informações não-vinculadas à operação implicaria quebra de sigilo.

Por conta da investigação, conduzida pela Corregedoria-Geral da PF em São Paulo, a polícia apreendeu computadores e documentos de agentes na Abin e nos endereços residenciais deles na quarta-feira passada. Esta foi a primeira vez que a PF apreendeu documentos na Abin.

- É uma coisa inaceitável. Imagina o FBI (a polícia federal americana) fazendo uma busca na sede da CIA (serviço de inteligência do governo americano). O sigilo desses documentos pertence ao presidente da República. Houve aí uma ofensa ao presidente Lula - afirmou o presidente da Associação dos Servidores da Abin (Asbin), Nery Kluwe.

O delegado Protógenes Queiroz, ex-coordenador da Satiagraha, pediu ontem na Justiça Federal em São Paulo um habeas corpus para ter acesso ao inquérito sobre o vazamento de dados. Na quarta-feira passada, a PF fez buscas em endereços de Protógenes no Rio, em Brasília e no hotel em que ele estava hospedado, em São Paulo. No pedido, assinado pelo advogado Luiz Fernando Gallo, Protógenes argumenta que, embora esteja no centro das investigações, até o momento não teve acesso ao inquérito.

O delegado alega que, sem saber quais são os fundamentos das acusações contra ele, não tem como se defender. Um dos parentes de Protógenes reclamou da divulgação do conteúdo do inquérito sobre o vazamento. O relatório de Amaro Vieira Ferreira informa que a PF deverá indiciar o ex-coordenador da Satiagraha por quebra de sigilo funcional e prevaricação, entre outros crimes.

- Quero ver se vão abrir inquérito para apurar o vazamento de informações do inquérito sobre vazamento - disse um familiar do delegado.