Título: Discurso conciliador
Autor:
Fonte: Correio Braziliense, 13/03/2009, Brasil, p. 09

CNBB tenta colocar panos quentes na polêmica gerada pelo anúncio do arcebispo de Olinda e Recife sobre a excomunhão dos envolvidos na interrupção da gravidez da menina de 9 anos abusada pelo padrasto

Uma semana depois da polêmica sobre a excomunhão da mãe e dos médicos envolvidos no aborto de uma menina de 9 anos de Alagoinha (PE), grávida de gêmeos depois de ter sido abusada sexualmente pelo padrasto, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) minimizou ontem as declarações do arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso Sobrinho. Na tentativa de amenizar a polêmica provocada pelas declarações do religioso, o secretário-geral da CNBB, dom Dimas Lara Barbosa, afirmou que ele ¿não excomungou ninguém¿, apenas ¿lembrou uma norma que existe no Código de Direito Canônico¿. Para a CNBB, a criança violentada não incorreu em excomunhão. ¿Eu acredito que a mãe dela também não, porque agiu sob pressão¿, completou dom Dimas.

Continuando com os panos quentes, a entidade evitou até confirmar com todas as letras a punição aos integrantes da equipe médica envolvida, alegando que era preciso analisar caso a caso qual o ¿grau de consciência¿ de cada profissional. ¿Em alguns casos especiais se prevê esse tipo de pena, como, por exemplo, na profanação do Santíssimo Sacramento, ou no caso do padre que revela um segredo de confissão, em que a pessoa se coloca fora da comunhão da Igreja¿, alegou, depois do encerramento da reunião do Conselho Permanente da entidade, realizada em Brasília.

¿Os que praticam o aborto com consciência e as clínicas de aborto não estão em comunhão com o pensamento cristão em defesa da vida¿, afirmou dom Dimas. Presidente da CNBB, dom Geraldo Lyrio Rocha reafirmou que a excomunhão não tem relação com condenação eterna. ¿Excomunhão não é sinônimo de condenação ao inferno. Digo isso por causa do imaginário popular, (porque) quando alguém é excomungado parece que foi condenado ao inferno.¿

Ele explicou que o ato de excomungar alguém é a punição de um delito e pode ser reconsiderado pela Igreja se a pessoa não infringir novamente o Código Canônico. Segundo ele, a repercussão da excomunhão dos médicos envolvidos mudou o foco da situação e esvaziou o debate da sociedade. ¿Esse aspecto tão repugnante do que foi o crime praticado se diluiu diante da história da excomunhão¿, alegou.

Na avaliação de dom Geraldo Lyrio Rocha, não se pode reduzir a violência ocorrida com a menina de 9 anos à questão da excomunhão. ¿Eu fico pensando na situação da mãe dessa criança e nos demais familiares. É um enorme sofrimento, uma humilhação ter uma criança sendo explorada sexualmente pelo padrasto desde os 6 anos. Isso é uma coisa repugnante, e me causa estranheza que esse aspecto tenha se diluído diante da história da excomunhão, que precisa, sim, ser tratada. Porém, reduzir uma problemática desse porte unicamente ao episódio da história da excomunhão é esvaziar uma questão sobre a qual a consciência nacional precisa ser despertada¿, disse.

Excomunhão Pouco frequente, a excomunhão é o castigo mais severo que a Igreja Católica pode decretar. Existem dois tipos da norma disciplinar: a latae sententiae e a ferendae sententiae. Para o Código de Direito Canônico, os que cometem faltas graves, como tomar o lugar do pontífice para ordenar bispos, devem ser excomungados automaticamente, sem que seja necessária uma sentença prévia da autoridade competente ¿ essa é a latae sententiae. Estão aí incluídas a heresia, o cisma, a violência contra o papa, a consagração de um bispo sem mandato do pontífice, a realização de um aborto, a profanação da Eucaristia e a violação do segredo da confissão, diz o Código. Para faltas menos graves, existe a ferendae sententiae, segundo a qual a autoridade competente abre um processo que pode concluir com a sentença de excomunhão. Os excomungados não podem cumprir tarefas litúrgicas ou pastorais e são proibidos de participar da comunhão (receber o corpo de Cristo).

-------------------------------------------------------------------------------- "Eu acredito que a mãe dela também não (incorreu em excomunhão), porque agiu sob pressão" - Dom Dimas Lara Barbosa, secretário-geral da CNBB

"A excomunhão não é sinônimo de uma condenação ao inferno" - Dom Geraldo Lyrio Rocha, presidente da CNBB