Título: Patrões e empregados com diálogo difícil
Autor: Flores, Mariana
Fonte: Correio Braziliense, 13/03/2009, Economia, p. 13

Crise econômica vai dificultar negociações por acordos salariais e a tendência é de o setor industrial ser o mais prejudicado

Os acordos salariais entre trabalhadores e empregadores estão mais difíceis. Balanço divulgado ontem pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostra que os resultados das negociações coletivas em 2008 regrediram para o mesmo patamar registrado em 2005. Em 2008, 11,9% das 706 categorias pesquisadas tiveram reajuste abaixo da inflação do período. Em 2007 e 2006 o percentual havia sido bem inferior, de 4,1% e 3,7%, respectivamente. Em 2005 foi de 12,0%. A principal vilã da deterioração foi a inflação elevada no primeiro semestre de 2008, segundo o Dieese. Mas, em 2009, a crise econômica será a culpada por dificultar a negociação com os patrões, preveem especialistas do Dieese.

Os resultados de 2008 ainda não foram afetados pela crise, segundo o coordenador de Relações Sindicais do Dieese, José Silvestre Prado de Oliveira. Em outubro, quando os primeiros sintomas da turbulência financeira atingiram a economia real, boa parte das negociações já tinham fechado. Mas, neste ano, os impactos serão importantes. ¿2009 ainda é uma incógnita por causa da profundidade e da duração da crise. De qualquer forma, a economia brasileira vai desacelerar muito, o que quer dizer que o cenário para negociação vai dificultar para conseguir um ganho real, mesmo com a queda da inflação¿.

Das negociações de 2008, 10,5% repassaram a inflação acumulada no período e 77,6% garantiram aumentos reais (veja quadro). Em 2007, 87,7% dos trabalhadores tiveram os salários reajustados acima da inflação. Mas o incremento no custo de vida naquele ano foi bem inferior ao registrado no ano passado, ressalva Oliveira. A inflação média anualizada de 2008 foi de 6,46%, contra 3,89% registrados em 2007. Com inflação mais alta, mais difícil é conseguir que o empregador dê aumentos reais. No ano passado, dois terços deles variaram entre 0,01% e 2%. A maior parte, 96,7%, foi paga de uma só vez. O restante foi dividido em duas ou três parcelas.

Segmento que mais está sofrendo com os efeitos da crise neste ano, a indústria arcou com os melhores reajustes em 2008. Das negociações feitas por empresas industriais, 87,0% resultaram em ganhos reais para seus funcionários. No comércio o percentual cai para 85,1% e no setor de serviços para 61,2%. Mas o bom resultado na indústria não será mantido, considerando que o segmento foi o que mais demitiu e concedeu férias coletivas neste ano. ¿A indústria deve ser mais afetada que os outros setores e dentro dela os impactos não serão iguais. Os setores que dependem mais do mercado externo serão mais afetados¿, estima Oliveira.

Centro-Oeste Os trabalhadores da região Centro-Oeste foram os que tiveram mais sucesso. Do total de acordos feitos por empresas de seus estados, 89,7% ficaram acima da inflação. No Sul do país o percentual foi de 85,7%. No Sudeste, onde estão localizadas principais indústrias brasileiras, o índice caiu para 76,1%. No Nordeste, o percentual de convenções com ganho real foi de 72,5% e no Norte, de 67,3%.

O levantamento do Dieese é divulgado todos os anos desde 1996. Das negociações pesquisadas no ano passado, 51% foram firmadas na indústria, 35% no setor de serviços e 13% no comércio.

-------------------------------------------------------------------------------- Ouça entrevista: José Silvestre Prado, coordenador de Relações Sindicais do Dieese

-------------------------------------------------------------------------------- Ganho real em Brasília

No Distrito Federal, as negociações tiveram resultados melhores. Dos 16 acordos registrados pelo Dieese no ano passado, 14 ficaram acima da inflação no período e dois ficaram iguais à variação dos preços na capital federal. O percentual de trabalhadores que tiveram ganhos reais, 87,5%, no entanto, é ligeiramente inferior ao verificado em 2007, de 88%. Naquele ano, de 25 negociações coletivas, 22 superaram o aumento do custo de vida, uma ficou igual, e duas categorias não conseguiram obter a variação da inflação no período, de acordo com os números do Dieese.

No ano passado, os reajustes variaram de 0,01% a 3%. Neste ano, a barreira para negociar será mais forte, na opinião do supervisor do Dieese no DF, Clóvis Scherer. ¿Um contexto de crise normalmente atrapalha as negociações coletivas. Mas é importante que os salários sejam preservados para incentivar o consumo das famílias, que tem peso importante na formação do produto interno bruto¿, afirma. (MF)