Título: STF poderá autorizar ação penal contra magistrados
Autor: Franco, Bernardo Mello
Fonte: O Globo, 21/11/2008, Rio, p. 18
Corte discute sobre envolvidos com máfia dos caça-níqueis.
BRASÍLIA.O Supremo Tribunal Federal indicou ontem que deve mandar para o banco dos réus três juízes e um procurador da República acusados de montar um balcão para vender sentenças que favoreceram a máfia dos caça-níqueis no Rio. No segundo dia de julgamento, que já soma quase dez horas de duração, os ministros reafirmaram a legalidade das principais provas obtidas por meio de escutas telefônicas e ambientais na Operação Hurricane da Polícia Federal. O relator do inquérito, Cezar Peluso, classificou o escândalo como o mais grave que já envolveu o Judiciário brasileiro.
Na próxima quarta-feira, o STF volta a discutir se abre ação penal contra os acusados por corrupção passiva, formação de quadrilha e prevaricação (uso do cargo para obter vantagens indevidas). Foram denunciados o ministro afastado Paulo Medina, do Superior Tribunal de Justiça; o desembargador José Eduardo Carreira Alvim, do Tribunal Regional Federal; e o juiz Ernesto Dória, do Tribunal Regional do Trabalho de Campinas. Segundo o Ministério Público, a cúpula do bicho também teria pago propina ao procurador João Sérgio Leal Pereira e ao advogado Virgílio Medina, irmão do ministro do STJ.
Investigação tem 40 mil horas de gravações
Advogados do grupo já dão como certo que Peluso votará a favor da acusação. Ontem, ele alertou que o escândalo pode manchar a imagem da Justiça.
- Do que conheço, é o episódio mais grave da história do Judiciário brasileiro. Algo que põe em risco a credibilidade do Judiciário não poderia deixar de ser investigado até as mais últimas conseqüências - afirmou.
Em tom de desabafo, o ministro admitiu o incômodo em ter que julgar um integrante de tribunal:
- Fiquei contrafeito, constrangido. Isso para um juiz de carreira é uma tarefa dolorosa.
As defesas alegavam que a PF teria ultrapassado os limites legais ao grampear os acusados por mais de um ano, com 40 mil horas de gravações. Os ministros chegaram a divergir sobre a validade de escutas ambientais feitas no escritório de Virgílio Medina. O advogado dele afirmava que, ao instalar microfones, os policiais teriam ignorado a regra da Constituição que garante a inviolabilidade do domicílio. Favorável à anulação das provas, Celso de Mello disse que a ação da PF lembrava os tempos da ditadura militar.
- Eu morei numa casa, em São Paulo, que era permanentemente invadida por agentes do Dops - disse.
O argumento foi rejeitado pela maioria da Corte. Peluso, que já havia elogiado a PF por conduzir a investigação com "correção exemplar", afirmou que a Constituição não pode ser invocada para proteger criminosos.