Título: Preferência pelas ONGs
Autor: Pariz, Tiago
Fonte: Correio Braziliense, 16/03/2009, Política, p. 02

Recursos para assistência no campo priorizam entidades. Oposição acusa o governo de agir politicamente

O Ministério do Desenvolvimento Agrário privilegiou nos últimos cinco anos a transferência de recursos para entidades prestarem assistência técnica a pequenos agricultores. Até 2003, numa herança do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), a pasta preferia repassar as verbas a estados e municípios. No primeiro ano de mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, estados e municípios receberam cerca de R$ 171,7 milhões, enquanto as organizações não-governamentais (ONGs), R$ 64,8 milhões, ou 27,5% do total. A lógica se inverteu logo no ano seguinte, quando as transferências às ONGs aumentaram 90%, chegando a R$ 116,6 milhões, contra R$ 77,3 milhões para estados e municípios.

Os dados foram colhidos no Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi) pela assessoria do DEM. Eles revelam, por exemplo, que a pasta repassou, no ano passado, às entidades R$ 111,6 milhões e R$ 96,2 milhões para prefeitos e governadores. O ministério informou que preferiu privilegiar as transferências a instituições por entender que elas são mais ágeis na contratação de funcionários aptos a prestar assistência técnica no campo. A pasta citou que, em 2003, 196 mil famílias rurais assentadas recebiam assistência, e o número saltou para 1,232 milhão de famílias na safra 2007/2008.

Os convênios são firmados para realizar a reforma agrária, apoiar o desenvolvimento da agricultura familiar e estimular o desenvolvimento rural sustentável. ¿Todos os convênios são regularmente auditados, tanto pelas próprias estruturas quanto pelos órgãos de controle interno e externo. Qualquer irregularidade na execução do convênio ou na aplicação dos recursos implica a imediata suspensão do convênio e a exigência da devolução dos respectivos recursos¿, informa o ministério.

Contestação Ex-ministro da Reforma Agrária, o deputado de oposição Raul Jungmann (PPS-PE) critica a decisão da pasta de privilegiar as entidades. Jungmann lembra que no começo de sua gestão ele também deu preferências às ONGs para o trabalho de assistência técnica, mas em 1999 a pasta notou que os repasses eram feitos por instituições ligadas aos trabalhadores assentados. ¿Nós percebemos que o dinheiro não chegava para o plantio, para o desenvolvimento local, mas ficava na política. Então, mudamos o programa e preferimos dar o dinheiro aos prefeitos e governadores para, bem ou mal, ter uma forma de controle¿, afirmou Jungmann.

O líder do DEM na Câmara, Ronaldo Caiado (GO), também reclamou da postura do ministério. Para Caiado, muitas cooperativas não têm a qualificação necessária para prestar assistência de mão de obra, vacinação de rebanho, disponibilidade de agrônomos e veterinários. ¿Os estados têm competência para dar apoio ao campo¿, disse. ¿Quando joga em cooperativas ou nessas ONGs, o dinheiro fica fora do controle¿, acrescentou o democrata. Já o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, defendeu os convênios com entidades públicas e privadas para o apoio às famílias assentadas.

¿Sempre que houver desvio de recursos, terá de ser sanado imediatamente. É assim que a gente trata, seja com prefeituras, universidades, cooperativas, empresas prestadoras de serviços ou associações de produtores¿, disse, após se encontrar com o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza. Os valores dos convênios do ministério incluem o repasse de R$ 80 milhões à Fundação Assistencial dos Servidores do Incra (Fassincra) nos cinco anos. A entidade é responsável programa de saúde a servidores do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).