Título: Correa lamenta mal-estar, mas não vai recuar
Autor: Gois, Chico de
Fonte: O Globo, 23/11/2008, Economia, p. 29

Recado foi dado a Lula por telefone. No rádio, presidente do Equador diz que defenderá seu país `custe o que custar¿.

BRASÍLIA e QUITO. O presidente do Equador, Rafael Correa, telefonou ontem pela manhã para o presidente Lula e lamentou o fato de o Itamaraty ter convocado de volta o embaixador brasileiro no país andino, Antonio Marques Porto. No entanto, não deu sinais de que pretende rever sua decisão de recorrer à corte internacional para suspender o pagamento de uma dívida de US$243 milhões com o BNDES. O empréstimo foi feito para que a empreiteira Odebrecht, expulsa do Equador mês passado, construísse uma hidrelétrica no país.

No telefonema, por volta de 10h, Correa disse não ter intenção de gerar desentendimento nas relações entre os dois países. Mas sinalizou que não pretende rever sua posição. Em seu programa de rádio e TV de ontem, foi mais incisivo:

¿ Essa medida (a retirada do embaixador brasileiro de Quito) nos entristece muito, como dissemos ao presidente Lula (por telefone). Nós a respeitamos, mas não cederemos em seguir defendendo os interesses do país custe o que custar ¿ disse Correa, segundo a agência de notícias AFP.

Lula só decidirá após ouvir embaixador e BNDES

No telefonema, Lula manifestou ao colega equatoriano seu descontentamento com a forma como ele anunciou a decisão de não pagar a dívida com o banco brasileiro ¿ o anúncio foi feito em público, sem aviso prévio ao governo do Brasil.

¿ O presidente Lula manifestou o mal-estar do governo brasileiro em relação à iniciativa do governo equatoriano. O presidente não questionou o direito de o governo tomar uma iniciativa soberana, mas a forma como havia sido tomada essa decisão, que não corresponde de maneira alguma ao tipo de relação entre Brasil e Equador ¿ disse o assessor especial da Presidência para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, que acompanhou o telefonema.

Lula informou a Correa que só tomará uma decisão sobre o caso após ouvir o embaixador Porto e a direção do BNDES. Porto já está no Brasil e ontem se reuniu com o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, para avaliar a situação.

Amorim: crise com Equador `é séria¿

O chanceler brasileiro voltou a criticar ontem o ato do governo do Equador.

¿ (A crise) é séria e sai um pouco da rotina diplomática ¿ disse Amorim à Globonews.

Para Marco Aurélio, a decisão do governo equatoriano poderá criar uma crise de confiança em relação a outros contratos assinados pelos governos da América Latina, na modalidade ¿convênio de crédito recíproco¿, como na transação com o Equador:

¿ Se há um desrespeito ao sistema de crédito recíproco, não é só a relação entre Brasil e Equador que será atingida. O conjunto dos convênios de crédito recíproco na América Latina que serão golpeados.

Jornais equatorianos informavam ontem que a iniciativa do telefonema havia partido de Lula. Mas o Palácio do Planalto negou a informação. Segundo a assessoria do governo brasileiro, Correa já havia tentado falar com Lula na sexta-feira, em duas ocasiões, mas não conseguira por problemas na agenda do presidente do Brasil. Ontem, Correa voltou a ligar e falou com Lula, que estava em sua casa em São Bernardo do Campo.

(*) Com agências internacionais