Título: Ajuda na calamidade
Autor: Gois, Chico de; Damé, Luiza
Fonte: O Globo, 27/11/2008, O País, p. 3

TRAGÉDIA SOB AS ÁGUAS

Lula sobrevoa áreas atingidas pelas chuvas em Santa Catarina e libera quase R$2 bi

Chico de Gois, Luiza Damé e Maiá Menezes

Cinco dias depois do começo das fortes chuvas que mataram cerca de cem pessoas em Santa Catarina, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva passou três horas ontem na região atingida. Lula ficou impressionado com a dimensão da tragédia. Ele sobrevoou, à tarde, as cidades de Itajaí, Gaspar, Navegantes e Ilhota para ver os estragos provocados pela chuva e negou que o governo tenha demorado a agir.

- Um dia a gente vai ter a noção de por que, num momento como este, acontece a maior catástrofe da história de Santa Catarina.

Perguntado se era a maior tragédia ocorrida durante seu governo, o presidente respondeu:

- Acho que é.

Em Navegantes, o presidente reuniu-se com o governador de Santa Catarina, Luiz Henrique da Silveira, com empresários, políticos e moradores da região, que pediram ajuda para recuperar os estragos.

- Por mais que a gente esteja preparado, sempre vai aparecer alguém para dizer que falta alguma coisa a fazer. Seria humanamente impossível imaginar que, numa catástrofe como esta, fosse possível evitar que acontecesse alguma coisa - afirmou, dizendo que a hora é de solidariedade.

Lula teve duas longas conversas com autoridades e moradores sobre a situação da região, no Aeroporto de Navegantes. O presidente pretendia descer em Blumenau, uma das mais castigadas pela enchente, mas foi desaconselhado porque estava chovendo no momento do sobrevôo.

Uma analogia com a seca do Nordeste

Lula ficou cerca de 30 minutos percorrendo a área devastada, na companhia do governador, do prefeito de Itajaí, Volnei Morastani, e dos ministros Edison Lobão (Minas e Energia), Franklin Martins (Comunicação Social) e Nelson Jobim (Defesa). Nas conversas, o presidente disse que o governo vai ajudar na reconstrução da região atingida pelas enchentes, mas insistiu que sua maior preocupação é com as pessoas que perderam familiares.

- Tem uma coisa que não vamos conseguir recuperar, que são as dezenas de pessoas que faleceram nesta tragédia, que foram soterradas. Só temos de lamentar e pedir a Deus que não aconteça mais nenhuma morte - disse Lula, que se encontrou com a filha Lurian no aeroporto.

O presidente contou que recebeu um telefonema do governador no domingo à tarde e, imediatamente, acionou o ministro da Defesa para que mandasse Exército, Marinha e Aeronáutica para o local. Lula recorreu à seca, comum no Nordeste, para fazer uma analogia com a tragédia em Santa Catarina. De acordo com o presidente, no Nordeste as pessoas rezam para chover e, em Santa Catarina, todos devem orar para a chuva parar.

Ele lembrou do tempo em que morou em áreas que alagavam com as enchentes:

- Eu já vivi enchente. Morei muito tempo na periferia de São Paulo, já acordei meia-noite com água batendo no colchão, já tive que levantar para socorrer gente em casas, mas nunca vi uma coisa como esta. O momento é de todo mundo dar as mãos e ajudar Santa Catarina a voltar a ser aquele estado esplendoroso que sempre foi,

Ele disse que poderá liberar o FGTS de quem perdeu a casa. E vai sugerir à Fazenda que adie recolhimento de impostos de empresas afetadas pela crise. No caso do FGTS, já existe previsão legal para liberar justamente em caso de calamidade pública.

Lula disse que ficou impressionado com o fato de que, apesar de em alguns lugares as águas já terem baixado, ainda assim continuam inundados. Para ele, a causa das tempestades que afetaram o estado é a mudança climática.

- Vim aqui para dizer ao governador, aos deputados, senadores e ao povo de Santa Catarina que, da parte do governo federal, não faltarão recursos para que a gente retome a normalidade assim que a chuva parar - prometeu o presidente.

Decisão tomada de última hora

Longe do cenário da tragédia até ontem, Lula interrompeu sua agenda no Rio para ir a Santa Catarina. Diante do presidente russo, Dmitri Medvedev, com quem se encontrou no Rio, Lula anunciou que iria ao estado:

- Saio daqui correndo para Santa Catarina, para prestar solidariedade a um povo que vive uma tragédia por conta da quantidade de chuva nos últimos meses naquele estado - disse, no meio do pronunciamento no Palácio do Itamaraty, no Rio.

Logo em seguida, Medvedev, antes de se despedir do Brasil, abriu o discurso prestando solidariedade aos parentes dos mortos pelas chuvas.

Lula só decidiu ir para Santa Catarina na manhã de ontem, depois de conversar com os ministros Luiz Dulci (Secretaria Geral), Dilma Rousseff (Casa Civil) e Guido Mantega (Fazenda). Segundo assessores do presidente, ele não foi antes ao estado porque não poderia desmarcar compromissos com chefes de Estado estrangeiros.

O presidente recebeu relatos sobre a situação de ministros que estiveram no estado. Ele só embarcou para Santa Catarina depois de ter assegurada a disponibilidade de recursos do Orçamento para socorrer o estado.

Lula autorizou a liberação de R$1,049 bilhão para socorrer as vítimas e reparar os prejuízos causados pela calamidade no estado. No total, o governo federal destinou R$R$1,970 bilhão para os estados atingidos pelas chuvas - até o momento, Santa Catarina, Espírito Santo, Minas Gerais e Rio de Janeiro - e para vítimas da seca no Nordeste. Do total, R$1,6 bilhão será liberado por medida provisória assinada ontem pelo presidente.

A medida provisória destina recursos para recuperação de portos e estradas, ações de defesa civil, das Forças Armadas e de saúde, incluindo reconstrução de postos de atendimento e substituição de equipamentos hospitalares. Para Santa Catarina, o Ministério da Fazenda vai destinar R$370 milhões para o governo do estado, por meio de títulos públicos. Esse dinheiro entrará diretamente nos cofres do estado para custear o enfrentamento da calamidade, incluindo ações de busca, resgate, salvamento e remoção de pessoas em situação de risco.

- Esses recursos serão transferidos ao governo de Santa Catarina e serão usados de acordo com as necessidades - disse o porta-voz da Presidência, Marcelo Baumbach.

O anúncio dos recursos foi feito enquanto Lula sobrevoava os municípios alagados. Além do dinheiro, o governo federal está auxiliando o estado com pessoal e material das Forças Armadas. Desde o último dia 23 de novembro, o Exército, a Marinha e a Aeronáutica trabalham na região.