Título: Petrobras no 'hospital' da Caixa
Autor: Doca, Geralda; Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 28/11/2008, Economia, p. 25

Crise aumenta demanda do banco. Empréstimo de R$ 2 bi à estatal é alvo de polêmica.

Oempréstimo de R$2,02 bilhões concedido pela Caixa Econômica Federal à Petrobras está dentro da linha de atuação definida pelo governo para os bancos públicos - de que ajam para suprir a carência de crédito e manter o nível do investimento, afirmam fontes ligadas à instituição, o que os transformaria em uma espécie de hospital de empresas. O vice-presidente de Finanças da Caixa, Márcio Percival, afirmou que, com a crise, o banco, focado em micro e pequenas empresas na carteira de pessoas jurídicas, passou a ser procurado por grandes grupos. Atualmente, a Caixa está analisando pedidos de empréstimo para os setores automotivo (bancos de montadoras) e de alimentos.

- A Caixa está ampliando seus negócios com o segmento corporate e até criamos uma mesa para agilizar as demandas - afirmou Percival.

A Caixa negou que, ao atender essa orientação, tenha socorrido a petrolífera. O montante equivale a praticamente o total de novos empréstimos concedidos pela Caixa a empresas entre julho e setembro, que foi de R$2,506 bilhões, de acordo com o balanço.

- Foi uma operação comercial normal - rebateu Percival.

O empréstimo foi tema de ampla discussão no Senado, na noite da última quarta-feira, quando os senadores do PSDB Tasso Jereissati (CE) e Arthur Virgílio (AM) convidaram o presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, a prestar esclarecimentos sobre a situação do caixa da companhia. Tasso afirmou que a estatal estaria até atrasando pagamentos de fornecedores. Mas o diretor financeiro da estatal, Almir Barbassa, negou ontem veementemente a existência de problemas de liquidez.

Segundo Barbassa, antes de fechar o contrato com a Caixa, em outubro, a Petrobras consultou outros bancos nacionais. A opção pela instituição federal foi motivada pelas condições mais favoráveis oferecidas e não pelo fato de ser um banco público. Fontes ligadas à Caixa, porém, confirmam que a orientação do governo é trabalhar com os juros mais baixos possíveis. O diretor da Petrobras informou que, este ano, a estatal captou US$ 6,7 bilhões no mercado internacional e no doméstico - mais do que a previsão inicial de obter entre US$3 bilhões e US$5 bilhões.

O financiamento, admitiu Barbassa, foi motivado por fatores inesperados. Segundo ele, com a valorização do dólar em outubro, a empresa teve aumento da receita contábil, o que levou a um pagamento de impostos acima do previsto após o lucro gigantesco de R$10,8 bilhões no terceiro trimestre. Naquele mês foram pagos R$11,4 bilhões em impostos e taxas, um volume recorde.

- Os R$2 bilhões serviram para colocar nosso caixa em uma situação mais confortável - afirmou o diretor.

Prejuízo com diesel de R$800 milhões

Além disso, somente de julho a setembro, a Petrobras teve prejuízo de R$800 milhões referente à diferença entre o que pagou pelo diesel importado e o preço de venda no mercado interno, segundo um especialista nas finanças da estatal. As fortes altas dos preços do petróleo que ocorreram ao longo do ano até julho, quando o barril atingiu o pico de US$147, não foram repassadas, reforçando as dificuldades de caixa. Segundo essa fonte, se a Petrobras tivesse vendido o diesel ao preço que importou, teria obtido receita total de R$4,9 bilhões.

Como o mercado financeiro internacional estava fechado, o caminho foi procurar uma solução doméstica. De acordo com a nota técnica enviada na manhã de ontem ao mercado financeiro e ao Senado, com a valorização do dólar, a melhor opção seria obter empréstimos no mercado interno, para reduzir a exposição da empresa a dívidas na moeda americana.

O financiamento da Caixa foi o primeiro obtido pela Petrobras junto a bancos brasileiros desde o início dos anos 1990, quando foi proibido. A primeira flexibilização da regra foi feita em outubro último, em razão da crise, quando o Conselho Monetário Nacional (CMN) permitiu à empresa tomar até R$8 bilhões de crédito no país. Na última quarta-feira o CMN derrubou todos os limites. Barbassa nega que tenha sido negociado empréstimo com o Banco do Brasil (BB), como afirmou Tasso. Com o BB, garante, fez operações de recebíveis. No terceiro trimestre, a companhia registrava um passivo junto ao BB de R$4 bilhões, contra R$1,1 bilhão em dezembro de 2007. O CMN também aumentou no fim de setembro, a capacidade de endividamento junto ao BNDES, no valor de R$12 bilhões.

A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, disse não estar preocupada com a operação.

- A Petrobras não está descapitalizada. Ela tinha um problema imediato de caixa para pagar impostos, só. É o sonho de um banco emprestar para a Petrobras.