Título: Violência aterroriza professores e impõe rotina de medo nas escolas
Autor: Menezes, Maiá; Rios, Odilon
Fonte: O Globo, 30/11/2008, O País, p. 4

No Rio, futura secretária quer criar bônus para docentes em áreas de risco.

RIO e MACEIÓ. A escultura de massinha indica que a lógica da violência substitui o lúdico. Uma arma ¿ foi essa a imagem escolhida por um aluno da 1ª série do ensino fundamental de um Ciep do Complexo da Maré, Zona Norte do Rio, num exercício rotineiro de artes deste ano. Um pequeno símbolo de que a violência também invade o cotidiano das escolas e o repertório dos alunos. O tráfico de drogas já provocou o fechamento de escolas no país e levou, em Maceió, à proibição de que o consumo de drogas seja tema nas salas de aula. Falar sobre o assunto representa risco de morte para o professor.

O convívio dos alunos com as armas não é apenas imaginário. Professora do Ciep Constantino Reis, em Belford Roxo, na Baixada Fluminense, onde um aluno de 13 anos foi apreendido no começo do mês com uma pistola calibre 8 milímetros, Teresa Cristina Oliveira, de 37 anos, diz que é preciso ter estratégia. Ela já encontrou arma na pochete de um aluno e preferiu o silêncio.

¿ Fiquei apavorada. Só vi e não falei nada. O aluno (da pochete) era muito violento: dizia que quem mexesse com ele ia parar na vala. O que soube é que ele saiu da escola. Tive notícia de que já morreu ¿ diz Teresa, que agora desenvolveu uma outra estratégia para fugir de ameaças em outra escola:

¿ No final do ano, os alunos esperam professor reprovar ou não para furar pneu. Nessa época, eu não vou de carro.

Uma das escolas em que a professora Inês Barbosa, 53 anos, dá aulas, no bairro de Colégio, também na Zona Norte do Rio, já fechou quatro vezes por ameaças do tráfico.

¿ A gente fica na linha de tiro, é um bangue-bangue só. Há quatro semanas, invadiram. Tivemos que abaixar as crianças na hora. Os alunos ficam extremamente agitados. A gente vive como se estivesse em cima de um barril de pólvora ¿ diz.

O relato de uma professora de 35 anos, que dá aula num dos cinco Cieps da Maré há dez, retrata o drama de estar sujeito à violência dos bandidos e ao clima bélico dos alunos também em sala de aula.

¿ Imagina o que é passar a madrugada toda ouvindo tiros, vendo mortes, tortura? O que acontece é que se um colega, por exemplo, pegar a borracha, ele bate. Ainda há um problema maior: alunos ganham certo status na escola quando agem com violência ¿ conta a professora.

Ela vê um agravante na cidade do Rio: a aprovação automática, diz, pôs em xeque a autoridade do professor:

¿ É como se você não representasse mais nada ali.

Para a diretora do Sindicato Estadual dos Profissionais de Ensino (Sepe) do Rio, o sucateamento do ensino intensifica o problema. Relatório do Sepe indica que 200 escolas da região metropolitana estariam sujeitas diariamente a tiros, assaltos e até a homicídios.

Preocupada em atrair professores para as áreas consideradas de risco, a futura secretária municipal de Educação, Cláudia Costin, pretende criar um bônus salarial para os docentes que lecionarem em escolas próximas a áreas deflagradas.

¿ O que outros países vêm fazendo é criar uma força-tarefa destinada a esse tipo de escola ¿ diz a futura secretária.

Em Maceió, professor assaltado por aluno

Em Maceió, na último quinta-feira, a direção da escola Selma Vandeira, no bairro do Benedito Bentes, foi obrigada a fechar as portas. Isso porque os funcionários receberam um aviso dos traficantes: a disposição de invadir a instituição para roubar. Na escola e no bairro, a lei é a do silêncio.

¿ Tivemos o caso de um aluno assassinado na porta da escola, o registro de tiros, há um caso em que o colégio não funciona à noite porque o tráfico determinou que ele ficasse aberto apenas de dia, e outro caso em que um professor foi assaltado com arma dentro da sala de aula ¿ lista a presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Educação (Sinteal), Girlene Lázaro.

A professora Ana Cláudia Laurindo, da Escola Rodriguez Melo, no Vergel do Lago, em Maceió, sabe que existem alunos seus envolvidos diretamente com o tráfico de drogas e que alguns deles assaltam em outras partes da cidade.

¿ Em todas as escolas pelas quais passei há notícias de alunos mortos, geralmente pelo tráfico. E quando a direção da escola percebe que o aluno é envolvido, negocia com os pais a transferência. A escola recebe alunos transferidos nas mesmas condições. É como se trocasse alunos-bomba ¿ diz.