Título: A estratégia brasileira de substituição da gasolina
Autor: Bertelli, Luiz Gonzaga
Fonte: Correio Braziliense, 16/03/2009, Opinião, p. 13

Com a volatilidade dos preços do petróleo, levando à mudança do patamar de US$ 100 para em torno de US$ 40/50, no início de 2009, renascem as antigas críticas às energias renováveis e limpas. Para os analistas, menos comprometidos com a indústria do energético fóssil, as modificações dos preços do petróleo poderão ser circunstanciais no curto prazo.

Contudo, à medida que o petróleo vai alcançando o pico de produção, nas próximas duas ou três décadas, a sua era de oferta abundante e barata vai se extinguindo. Para o professor Cerqueira Leite, da Unicamp, não é o fim do petróleo, mas o término do período do óleo vendido a valores baixos, com incertezas na garantia do suprimento regular, em decorrência das graves divergências políticas nas principais áreas mundiais de extração.

Ademais, é cada vez maior a conscientização dos povos, no que concerne ao irreversível fenômeno do aquecimento global, decorrente da queima do combustível fóssil. Daí, o óbvio interesse no desenvolvimento das energias alternativas e sustentáveis aos combustíveis fósseis, notadamente na área dos transportes.

Nesse contexto, é insofismável a potencialidade brasileira na oferta desses energéticos limpos e ecológicos. Graças ao excepcional desenvolvimento cientifico e tecnológico havido na agricultura e no processo industrial, nas últimas duas décadas, o custo da fabricação do etanol (álcool da cana) vem caindo, sucessivamente, nos diferentes anos safra.

Com efeito, desde os primórdios do Proálcool, no fim de 1975, houve redução no custo da produção em mais de 70% e, sem dúvida, a indústria sucroalcooleira passou a ser altamente competitiva com a gasolina, desde que os preços do petróleo cru sejam mantidos na faixa de US$ 30/barril ou acima dela.

Também, é larga a vantagem do etanol caboclo da cana, produzido no interior paulista, com o similar, obtido do milho americano, beterraba ou biodiesel. Outra excepcional condição do nosso etanol é que a cana-de-açúcar, de onde é retirado, não necessita de grande quantidade de produtos agroquímicos ou irrigação, o que é indispensável nas culturas alienígenas da soja ou milho.

Quanto à produtividade, da mesma forma estamos à dianteira, pois a produtividade das nossas maiores indústrias é de mais de 6 mil litros por hectare, enquanto o etanol do milho alcança 3,5 mil litros por hectare (EUA) e o biodiesel da soja ou da mamona não supera 500 litros.

Consoante os órgãos planejadores, em 2025 o universo estará consumindo 1,7 trilhão de litros de gasolina. Graças à disponibilidade de terras agricultáveis, sem interferir na produção de grãos e da pecuária, o Brasil é o maior candidato ao suprimento dessa fantástica demanda. Para tanto, serão necessários o adequado planejamento, políticas governamentais, marcos regulatórios, investimentos financeiros, armazenagem e alcooldutos para o escoamento, terminais marítimos e recursos humanos.

Nos dias atuais, a cana-de-açúcar é a planta compeoníssima na conversão fotossintética. A gramínea encontrou habitat favorável nas terras paulistas, que respondem com 65% da produção nacional. Doravante, a expansão da cana-de-açúcar far-se-á com a crescente mecanização agrícola, sobretudo na colheita, e mediante redução das queimadas até sua abolição total. Não haverá inconveniente no campo social, com a possível demissão de trabalhadores rurícolas, eis que os empregos são de baixa qualificação e salários baixos.

No próximo período de produção (safra 2009/2010), o Brasil consolidará sua liderança mundial na produção canavieira, com o esmagamento de cerca de 600 milhões de toneladas, o que representará mais de 1/3 da produção do globo.

Nos vindouros períodos, os produtores de equipamentos, como é o caso da Dedini, e os órgãos de pesquisa deverão preocupar-se, mais ainda, com o aproveitamento dos resíduos lignocelulósicos da cana (bagaço e palha), que deverão constituir a matéria prima de uma nova geração de biocombustíveis renováveis, consoante assevera o pesquisador Régis Leal.