Título: Terroristas exploram o caminho do mar
Autor:
Fonte: O Globo, 30/11/2008, O Mundo, p. 33
Cercada de fronteiras instáveis, Índia agora enfrenta radicais que invadem pelo litoral.
NOVA DÉLHI. O ataque que aterrorizou a Índia e sua capital financeira evidenciou uma nova forma de atuação dos radicais islâmicos: a ¿jihad marítima¿. Com uma costa de 5.420 quilômetros de extensão, esses extremistas têm uma grande área de atuação: 12 estados indianos estão localizados no litoral. Esse novo tipo de ação já fora detectado há dois anos por serviços de inteligência indianos.
A inteligência detectou recentemente comunicação de integrantes do grupo paquistanês Lashkar-e-Toiba (LeT), recolhendo indícios de que eles poderiam tentar algo diferente de entrar na Índia através da região da Cachemira, do Nepal ou de Bangladesh. A informação preliminar era de que eles tentariam uma rota marítima. Mas o alerta não foi suficiente para evitar a tragédia. Os terroristas, segundo relatórios da inteligência, estão de olho em futuros ataques a instalações nucleares e refinarias de petróleo que ficam localizados especialmente na costa do país. Em novembro de 2006, o ministro do Interior indiano havia advertido que o litoral estava sob crescente ameaça de grupos terroristas, que tentavam se infiltrar na Índia desde aquela época por via marítima.
Os planos dos extremistas também incluem capturar ilhas não habitadas para servir de base de operação para ataques a instalações estratégicas. A Índia tem mais de mil ilhas. O alerta contra o terror por via marítima ¿ promovido por grupos inspirados na al-Qaeda ou ligados a ela ¿ também já havia sido dado por agências internacionais antiterroristas.
Acordo nuclear com os Estados Unidos irrita radicais
A Índia é uma verdadeira ilha cercada por vizinhos problemáticos, com fronteiras perigosas. Os terroristas islâmicos que atacaram a Índia anteriormente entraram pelas fronteiras vulneráveis do país com Paquistão e Bangladesh, de maioria muçulmana, e o Nepal, que tem maioria hindu.
Os indianos sabem que estão cada vez mais no olho do furacão. E este ano foi emblemático, com a assinatura do acordo nuclear da Índia com os UA, que simbolizou o casamento estratégico dos dois países: a transformação da Índia em parceiro dos americanos em sua guerra ao terror.
¿ Esse ataque é um recado contra a relação cada vez mais próxima entre Índia e Estados Unidos, Reino Unido e Israel ¿ diz o especialista em terrorismo Amit Chanda.
Há alguns meses, a Índia recebeu um forte golpe dos terroristas islâmicos por sua atuação cada vez maior no Afeganistão: em julho, a embaixada indiana em Cabul foi atingida por um carro-bomba, que deixou 41 mortos e 140 feridos.
As investigações mostraram que os autores do atentado tinham ligações com o controvertido serviço militar de inteligência do Paquistão, o ISI, que está fora do controle do governo paquistanês. A instituição ganhou tanto poder que é praticamente autônoma: apenas uma parte dela está sob o controle das autoridades civis.
Desde agosto o Paquistão tem atacado mais ferozmente os membros do Talibã nas regiões tribais ao longo da fronteira com o Afeganistão. Segundo analistas em segurança da Índia, com a repressão cada vez maior dentro do território paquistanês, esses grupos vêm tentando atuar em áreas vizinhas, como a Índia.
As dificuldades de atacar os países desenvolvidos ¿ onde a segurança foi incrementada ¿ fez com que a Índia se tornasse um alvo fácil. Hoje, o país só perde para o Iraque em número de vítimas do terrorismo, segundo levantamento do Departamento de Estado dos EUA.
Há 230 grupos extremistas na Índia, de diversas orientações. Com o ataque de Bombaim, o alerta vermelho foi acionado não só na costa, mas também nas fronteiras secas da Índia. Sexta- feira, a fronteira com Bangladesh teve o policiamento reforçado ao longo de seus 856 quilômetros. Bangladesh, como o Paquistão, é sede de inúmeros grupos terroristas islâmicos.
O ataque a Bombaim mostra uma mudança de tática no terrorismo cometido na Índia: o alvo ocidental, já que os terroristas visaram a fazer reféns estrangeiros nos hotéis de luxo, principalmente de nacionalidade americana, britânica e israelense. Até então, o objetivo dos terroristas era provocar conflitos entre hindus (a maioria na Índia) e muçulmanos.
oglobo.com.br/mundo