Título: A estratégia de Temer contra MPs
Autor: Azedo, Luiz Carlos; Foreque, Flávia
Fonte: Correio Braziliense, 18/03/2009, Política, p. 03

Na busca por uma brecha para evitar o trancamento da pauta, presidente da Câmara diz que medidas provisórias não impedirão votação de emendas à Constituição, projetos de lei e decretos legislativos

O presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer (PMDB-SP), tirou um coelho da cartola para se livrar de 10 medidas provisórias que trancam a pauta da Câmara e interromper o jejum de 30 dias do plenário sem nenhuma votação. Para perplexidade dos líderes de oposição e alguns aliados, inclusive o líder do governo, deputado Henrique Fontana (PT-RS), anunciou que a partir de agora as medidas provisórias enviadas pelo governo não impedirão a votação de emendas à Constituição, projetos de lei complementar, resoluções e decretos legislativos em sessões extraordinárias, mesmo que a pauta das sessões ordinárias estejam trancadas por MPs.

Verdadeiro ovo de Colombo, a interpretação de Temer havia sido anunciada na reunião do colégio de líderes, mas causa polêmica em plenário. Surpreendeu até o secretário-geral da Mesa, Mozart Vianna, que normalmente é consultado sobre decisões desse tipo. ¿Os senhores sabem o quanto esta Casa tem sido criticada, porque praticamente paralisamos as votações em face das medidas provisórias. Basta registrar que temos hoje 10 medidas e uma décima primeira que voltou do Senado. Num critério temporal bastante otimista, essa pauta só será destrancada no meio ou no final de maio¿, disse Temer. ¿Estou disposto a sofrer qualquer consequência por essa decisão, mas o Legislativo precisa de ousadia para recuperar o equilíbrio entre os poderes¿, declarou o peemedebista.

O presidente da Câmara baseou a decisão no artigo 62 da Constituição, segundo o qual, em sua interpretação, as MPs só podem ser editadas sobre assuntos cobertos por leis ordinárias e que, portanto, as demais matérias podem ser votadas mesmo com pauta obstruída. Para anunciar a decisão, respondeu uma questão de ordem do deputado Régis de Oliveira (PSC-SP), que questionou se a Câmara poderia votar projetos de resolução mesmo com a pauta trancada. Nos bastidores, comenta-se que esse questionamento havia sido previamente combinado.

A brecha jurídica encontrada por Temer irritou a oposição, principalmente o DEM, que pretende recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para derrubar a nova interpretação. Indignado, o líder do DEM na Câmara, deputado Ronaldo Caiado (GO), considerou a decisão ¿monocrática¿ e disse que a Constituição ¿não pode depender do humor do presidente da Câmara¿. Classificou de golpista a decisão: ¿Isso é gravíssimo. Isso é, sem dúvida nenhuma, a diminuição desta Casa. Peço a todos os senhores que reajam. Queremos votar, mas não podemos admitir, em momento algum, que se pratique um golpe contra a Constituição brasileira, porque, sim, é de golpe que se trata¿, destacou Caiado.

As medidas provisórias trancam a pauta de votações do Congresso se não forem votadas em 45 dias após terem chegado à Casa, o que impede que sejam apreciadas outras matérias prioritárias. No fim do ano passado, a Câmara chegou a aprovar em primeiro turno uma PEC que altera o rito de tramitação das MPs. A proposta, no entanto, ainda precisa ser apreciada em segundo turno antes de seguir para o Senado. Estou convencido da interpretação que fiz, afirmou Temer, em coletiva à imprensa. O presidente da Câmara ressaltou, no entanto, que sua decisão teve como base uma interpretação jurídica e está sujeita a questionamentos. O deputado Miro Teixeira (PMDB-RJ), respeitado como regimentalista, exigiu uma resolução da Mesa formalizando o procedimento. Avalia que existe risco de o assunto ser tratado pelo STF como matéria interna corporis e, assim, as medidas provisórias reeditarem os antigos decretos-lei do Executivo.