Título: Bush tenta reescrever a História
Autor:
Fonte: O Globo, 06/12/2008, O Mundo, p. 47

Presidente impopular admite que guerra foi mais longa e custosa do que ele previu.

WASHINGTON

Na sua luta para tentar reservar um lugar na História americana que não se limite apenas a muitos fracassos, como a não captura de Osama bin Laden ou a maior crise econômica das últimas décadas, o presidente dos EUA, George W. Bush, fez um discurso ontem no qual defendeu as políticas de seu governo no Oriente Médio. Ele disse que enxerga avanços na região que ocorreram devido à política externa dos oito anos de seu governo.

Falando no Centro Saban do Instituto Brookings, em Washington, Bush disse que seu governo permite o surgimento de ¿uma nova visão para o futuro¿ da região:

¿ Um Oriente Médio onde nossos amigos estão fortalecidos e os extremistas, desacreditados; onde as economias são abertas e a prosperidade é generalizada; e onde todas as pessoas desfrutam a vida de liberdade que é o presente universal de Deus Todo Poderoso.

As declarações de Bush já estão sendo consideradas como parte de uma tentativa de reescrever a História do governo que tem os menores índices de popularidade desde que se iniciaram as modernas pesquisas de opinião, nos anos 50. O presidente chegou a mencionar esta falta de apoio da população de seu país.

¿ Nem todas as decisões que nós tomamos (o seu governo) foram populares, mas a popularidade nunca foi o nosso objetivo ¿ disse ele ontem.

Bush pela primeira vez disse com todas as letras que Saddam Hussein nada teve a ver com o 11 de Setembro, mas defendeu a invasão do Iraque.

¿ É verdade, como já disse muitas vezes, que Saddam não teve ligação com o 11 de Setembro ¿ disse Bush, que jamais fizera tal afirmação diretamente. ¿ Mas a decisão de tirá-lo do poder não pode ser vista de forma isolada do 11 de Setembro. Os EUA tiveram que decidir se tolerariam um inimigo jurado, que agia de forma beligerante e apoiava o terrorismo, e que agências de inteligência em todo o mundo acreditavam possuir armas de destruição em massa.

Rombo de quase US$900 bilhões

A declaração parece ser uma tentativa de Bush de corrigir afirmações de alguns de seus assessores mais próximos ¿ como o vice-presidente Dick Cheney, que diversas vezes disse que Saddam estava envolvido no 11 de Setembro ¿ como até mesmo consertar frases ditas pelo próprio Bush, que no dia 1º deste mês disse, em entrevista à ABC News, que não sabia se ordenaria a invasão do Iraque se soubesse que não tinha armas proibidas.

Naquela oportunidade, culpara as agências de inteligência, dizendo que seus ¿erros¿ são seu maior arrependimento. Na verdade, diversos espiões já afirmaram que o governo pressionou entidades como a CIA a remeterem relatórios que dissessem que o Iraque possuía armas proibidas, e descartassem os que diziam o contrário.

Numa entrevista à CNN mês passado, Bush se resumira a lamentar ter dito frases como apanhar Bin Laden ¿vivo ou morto¿.

No discurso de ontem, Bush também reconheceu que a guerra no Iraque não ocorreu como ele gostaria.

¿ A luta no Iraque tem sido mais longa e custosa do que esperávamos.

Antes da guerra, Bush e assessores próximos como Cheney e o secretário de Defesa, Donald Rumsfeld, disseram que os americanos venceriam a guerra rapidamente e que a renda do petróleo iraquiano pagaria os custos. Cinco anos e nove meses depois, os EUA já gastaram US$657 bilhões no país, um rombo orçamentário que pode ser aumentado para US$864 bilhões se for contado também o fracasso na captura de Bin Laden no Afeganistão.

Bush também afirmou ontem que foi o ¿primeiro presidente a pedir (a criação de) um Estado palestino¿, e exaltou a reunião de israelenses e palestinos em Annapolis, este ano. Mas reconheceu:

¿ Houve contratempos no processo de paz, incluindo a doença do premier Sharon, a vitória do Hamas nas eleições palestinas, e a tomada de Gaza pelos terroristas.

Bush, no entanto, concluiu:

¿ Apesar destas frustrações e desapontamentos, o Oriente Médio em 2008 é um lugar mais livre, esperançoso e promissor do que em 2001.