Título: Costa e Silva cogitou recuar, mas foi convencido a endurecer por civis
Autor: Otavio, Chico
Fonte: O Globo, 07/12/2008, O País, p. 4
Ex-chefe da Casa Civil conta detalhes da atuação de ministro e deputado na crise.
UBERLÂNDIA (MG). O presidente Costa e Silva considerou a hipótese de recuar no embate com a Câmara para cassar o mandato do deputado Márcio Moreira Alves pelos discursos ofensivos às Forças Armadas, mas foi convencido a mudar de idéia por militares e dois civis próximos. Quarenta anos depois da crise que produziu o Ato Institucional nº 5, o então chefe da Casa Civil de Costa e Silva, Rondom Pacheco, conta que o ministro da Justiça, Gama e Silva, e o líder do governo na Câmara, Geraldo Freire (Arena-MG), se somaram aos militares radicais que conseguiram convencer o presidente a desistir da solução negociada com o Parlamento - a suspensão de Moreira Alves - e levar o pedido de licença para processá-lo à votação.
Aos 89 anos, Rondom Pacheco exibe boa memória ao detalhar a crise. Lembra que, antes do recesso, o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, Djalma Marinho (Arena-RN), ligou para a Casa Civil e pediu audiência com Costa e Silva., que estava no Rio. A idéia era convencer o presidente a não fazer convocação extraordinária da Câmara, a partir de 1º de dezembro, e deixar que parlamentares decidissem o que fazer.
- A solução seria interna: a CCJ aplicaria pena de suspensão do mandato por quatro meses, por abuso de expressão, e o problema estaria resolvido. Houve audiência, e o presidente aceitou. Eu vi - diz Pacheco.
Mas os corredores do Palácio se agitaram para convencer o presidente a mudar de idéia. Tão influente quando os colegas de farda de Costa e Silva, o jurista Gama e Silva, apontado como radical, alegou que o governo não deveria recuar, pois tinha chance de vencer na Câmara. Rondom Pacheco disse que Geraldo Freire atuou contra a solução negociada, por considerá-la uma capitulação:
- Ele disse que talvez fosse um erro entregar a solução do caso para a Câmara, pois o governo sairia diminuído.
Para garantir a aprovação do pedido, encaminhado pelo Supremo Tribunal Federal à Câmara, o presidente da CCJ fez uma manobra radical: substituiu todos os deputados arenistas que, mesmo contra o desejo do governo, votariam contra o pedido de licença. Só restou Djalma Marinho, que manteve sua posição contrária até o fim. Aprovado o pedido, seria fragorosamente derrotado na histórica sessão de 12 de dezembro, quando um expressivo grupo de arenistas se juntou ao MDB para negar o pedido e impedir o que era considerada uma intervenção do Executivo no Legislativo.
Pacheco disse que, naquele dia, esteve com o general Emílio Garrastazu Médici, então ministro-chefe do SNI, que o assustou com ao comentar a votação.
- Ele disse que o presidente não caiu porque era o Costa e Silva e tinha prestígio na tropa.
O ex-chefe da Casa Civil disse que, entre os conspiradores, havia também lacerdistas (seguidores do ex-governador Carlos Lacerda), que apostavam na radicalização da crise para esvaziar o regime e abrir caminho para um governo civil.