Título: Procurador manda investigar origem de dinheiro na cueca de réu do mensalão
Autor: Galhardo, Ricardo; Aggege, Soraya
Fonte: O Globo, 10/12/2008, O País, p. 4

BRAÇOS DA CORRUPÇÃO: "Pode ser coincidência, mas não há como ignorá-la".

Juiz mantém preso o suspeito, já processado por crime financeiro.

SÃO PAULO. O Ministério Público Federal pedirá a abertura de inquérito para apurar a origem dos 361 mil apreendidos com Enivaldo Quadrado, sábado, no Aeroporto de Cumbica, em Guarulhos (SP). Ontem, o juiz Alessandro Diaféria, responsável pelo plantão na Justiça Federal em São Paulo, negou pedido de liberdade provisória a Quadrado. A alegação do juiz é que ele já responde a processo por lavagem de dinheiro e crime financeiro, no caso do mensalão. Para Diaféria, embora não haja prova relacionando os dois casos, o fato de Quadrado carregar milhares de euros não declarados à Receita não pode ser ignorado.

"Não se faz qualquer juízo de valor sobre o fato de a pessoa responder a inquéritos ou ações penais, em face do princípio da presunção de inocência. No entanto, não há como negar que chama a atenção a expressiva quantia apreendida com o requerente (cerca de R$1 milhão em notas de euro) e a preexistência de processo criminal envolvendo lavagem de dinheiro; pode ser mera coincidência, mas não há como ignorá-la", diz trecho da decisão, de duas páginas.

O MPF não vincula, por enquanto, o dinheiro apreendido ao processo do mensalão, mas nos próximos dias o procurador federal Vicente Mandetta vai solicitar a abertura de um inquérito para investigar a origem do dinheiro. O MPF quer saber se Quadrado cometeu algum crime financeiro, a exemplo dos que é acusado no processo do mensalão.

A Polícia Federal de Guarulhos deve entregar, também nos próximos dias, o relatório sobre o inquérito que apura crime de falsidade ideológica contra Quadrado. Por enquanto, o único indício contra o dono da corretora Bônus-Banval é ter mentido na declaração de bens no retorno ao Brasil.

Enivaldo Quadrado é um dos 39 réus no processo que apura um suposto esquema de desvio de verbas públicas por integrantes do PT para o pagamento a parlamentares que votavam a favor das propostas do governo no Congresso.

A corretora de Quadrado, a Bônus-Banval, teria sido usada pelo lobista Marcos Valério de Souza para movimentar recursos do esquema.

Assessor parlamentar também foi preso com dólar na cueca

Ao recusar o pedido de prisão provisória de Quadrado, o juiz Viáfora argumentou que ele é réu em um processo que pode revelar "crimes contra o sistema financeiro nacional e de "lavagem, ou ocultação de bens, direito e valores".

No sábado, Quadrado foi preso no aeroporto de Cumbica quando voltava de Portugal com 361 mil escondidos sob a roupa, inclusive na cueca. Em depoimento à PF, ele disse que usaria o dinheiro para comprar carros.

O advogado de Quadrado, Antonio Sérgio de Moraes Pitombo, divulgou nota ontem afirmando que obteve cópia dos autos do inquérito policial somente às 18h30m de ontem e por isso não poderia detalhar a defesa de seu cliente. Segundo a nota, "imprecisões e incoerências constantes no auto de prisão em flagrante precisam ser devidamente esclarecidas".

Não foi a primeira vez que alguém envolvido com o mensalão escondeu dinheiro sob as roupas. No dia 8 de julho de 2005, no auge do escândalo, o assessor parlamentar José Adalberto Vieira da Silva foi preso quando tentava embarcar no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, com R$209 mil em uma pasta e US$100 mil escondidos na cueca. Ele trabalhava no gabinete do então deputado estadual do Ceará José Nobre Guimarães (PT), irmão do então presidente nacional do PT, José Genoino. Guimarães foi posteriormente absolvido em processo parlamentar na Assembléia Legislativa do Ceará, mas isso não impediu que Genoino fosse derrubado da presidência do PT.