Título: Precisamos fazer uma mudança estrutural e ampliar os esforços
Autor: Barbosa, Adauri Antunes
Fonte: O Globo, 12/12/2008, O País, p. 4

RETRATOS DA EDUCAÇÃO: Estudo mostra melhoria, mas ainda longe das metas.

Problema é maior no ensino médio, "que não prepara alunos para o mundo"

Houve melhorias na educação brasileira entre 2005 e 2007, mas poderia ter sido melhor, segundo a avaliação do presidente executivo do Todos pela Educação, o educador Mozart Neves Ramos. O movimento, que reúne iniciativas públicas e privadas, divulgou ontem o seu primeiro estudo com uma avaliação da educação do país com base em metas que devem ser atingidas até 2022. Em entrevista ao GLOBO, Mozart diz que não tem "a menor dúvida" de que os principais problemas da educação no país hoje são a aprendizagem e o ensino médio. Segundo ele, os jovens não são preparados pela escola e acabam marginalizados, vítimas das drogas e dos traficantes.

Adauri Antunes Barbosa

Qual a principal conclusão do relatório?

MOZART NEVES RAMOS: Que a educação no Brasil melhorou de 2005 para 2007, mas infelizmente em uma velocidade muito aquém da desejada. Precisamos fazer um esforço muito maior. As expectativas que temos para o futuro precisam ser revigoradas por medidas importantes que possam levar à valorização do professor, do acompanhamento da aprendizagem, do mérito, do desempenho dos nossos alunos. Então, precisamos fazer uma mudança estrutural. Algumas delas já estão em curso, mas precisamos ampliar esses esforços.

Qual é a situação mais grave que o relatório mostra?

MOZART: Não tenho a menor dúvida de que é a questão da aprendizagem e do ensino médio. É ali onde se dilui o pouco que nós conseguimos lá na base. Vamos precisar fazer um esforço concentrado no ensino médio.

Qual é a situação do ensino médio no país?

MOZART: O ensino médio brasileiro não tem cara, não tem identidade, não prepara o jovem para o mundo. O jovem quer uma escola que caiba na vida, uma escola em que ele possa fazer o ensino médio, possa ir para a universidade ou para o mundo do trabalho. Hoje o ensino médio é um exemplo de desmotivação total do jovem. Por isso o abandono é tão grande. Faltam professores. Estudo do Conselho Nacional de Educação mostra um déficit de 250 mil professores. Falta também qualificação para os professores. É preciso ter uma estrutura curricular atraente no ensino médio. Temos uma estrutura de 10, 11 disciplinas que não conversam entre si. Falta interdisciplinaridade, falta articulação com a educação profissional, falta a escola em que o jovem se sinta atraído para freqüentar. E ainda precisamos de estrutura: laboratórios de ensino, de informática, bibliotecas atualizadas.

Isso significa que o jovem não está sendo preparado?

MOZART: Não é à-toa que no Brasil se pratica o que nós chamamos de enxugar gelo. As taxas de homicídio de 18 a 24 anos são assustadoras. É exatamente esse jovem que não está mais na escola, deixou a escola sem aprender, que não conseguiu ir para o mundo do trabalho, não conseguiu ter acesso à universidade. Esse jovem está marginalizado, exposto à droga, ao traficante. E é onde começa esse processo de enxugar gelo. Temos que botar mais polícia na rua, mais carro de polícia... Temos mais é que investir na educação. Uma escola em que o jovem se sinta atraído, que seja motivadora para ele. Daí a gente vai começar a ajeitar esse edifício que está torto.

Como melhorar esses índices para se chegar às metas de melhoria na educação?

MOZART: A melhora gradual significa um esforço maior. Passar de 3 para 3,5 é um esforço, mas passar de 5 para 5,5 é um esforço ainda maior. E de 7 para 7,5, aí o esforço é redobrado. Então, precisamos compreender as vitórias eventuais que tivemos em alguns indicadores, como atendimento e fluxo escolar. Na verdade, precisamos olhar com mais cuidado para a aprendizagem, que é o nosso calo, nosso grande desafio, e para isso nós precisamos fazer uma política mais integrada, um sistema nacional de educação, um regime de colaboração entre estados e municípios para que de fato a gente tenha uma qualidade sistêmica na educação.

É mais difícil para alguns estados atingir as metas?

MOZART: Há um esforço natural de alguns estados, mais do Norte e do Nordeste, que estão alcançando suas metas. Isso é importante, deve-se estimular, mas não se deve repousar nessa vitória de hoje porque são metas ainda muito simplórias, não tão ambiciosas. E a gente precisa chegar às metas daqueles que estão hoje no topo, que é o Distrito Federal, onde temos o melhor desempenho. Mas os dados mostram, por sua vez, que o Distrito Federal não está conseguindo chegar às suas metas. Então, há vitórias importantes naqueles que estão com desempenhos mais simples, não tão ambiciosos, mas é preciso não descansar. É preciso trabalhar mais e mostrar melhor resultado daqui por diante.