Título: Pacote precisa atrair consumidores
Autor: Doca, Geralda; Bôas, Bruno Villas
Fonte: O Globo, 12/12/2008, Economia, p. 31

Fecomércio-RJ: vendas do varejo podem subir 0,5 ponto percentual em 2009.

RIO e BRASÍLIA. As novas medidas anunciadas ontem pelo governo precisam atingir a confiança do consumidor, dizem especialistas. Caso contrário, o pacote pode não ser suficiente para estimular o consumo e reduzir os efeitos da crise financeira global, alertam os analistas.

Segundo Miguel Ribeiro, vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), as medidas são positivas. Isoladas, contudo, não estancam os efeitos da turbulência financeira no país:

- Para as pessoas voltarem a comprar, precisam se sentir confortáveis, e não temerosas, em relação ao emprego.

Vendas de imóveis podem permanecer em queda

A menor arrecadação do governo pode ser compensada, caso as medidas sejam suficientes para estimular a economia, acrescentou Ribeiro:

- Se a economia crescer, vai gerar maior arrecadação. Mas essas medidas, sozinhas, não vão trazer a tranquilidade nem a arrecadação de que o governo precisa.

O presidente do Sinduscon-SP, Sérgio Watanabe, disse que as medidas são importantes, mas as vendas de imóveis podem permanecer em queda se a confiança do consumidor não melhorar.

- As medidas vão facilitar o pagamento das mensalidades do financiamento, por exemplo. Só que produto e crédito não serão suficientes se o nível de confiança permanecer lá em baixo. Nesse caso, o consumidor não vai comprar seu apartamento, sua casa. Não vai se endividar a longo prazo - disse Watanabe.

Segundo a Fundação Getulio Vargas (FGV), a confiança do consumidor brasileiro atingiu no mês de novembro o menor nível da série, que foi iniciada em setembro de 2005. Com 96,9 pontos, o índice medido pela FGV apresentou um recuo de 4,2% em relação a outubro (quando bateu 101,1 pontos) e de 15,2% sobre o mês de novembro do ano passado (quando registrou 114,3 pontos).

Já os cálculos preliminares feitos pelo economista Gabriel Santini, da Fecomércio-RJ, mostram que o pacote anunciado ontem pode elevar em 0,5 ponto percentual o crescimento das vendas do comércio brasileiro no próximo ano - de 5,5% para 6%. Para o economista, as medidas são importantes porque beneficiam principalmente as famílias da classe C, que respondem por 42% da população brasileira. Esse benefício vem, por exemplo, da redução de 15% para 7,5% na alíquota de quem ganha entre R$1.434 e R$2.150 mensais. No caso dos automóveis, contribuiu ao zerar a alíquota do IPI para carros de motor 1.0, que são os mais consumidos.

- As medidas têm impacto direto e abrem caminho para uma mudança na expectativa do consumidor. Com mais dinheiro no bolso, ele pode perceber que o cenário está mudando, melhorando, e consumir mais - disse Santini.

Segundo Gilberto Braga, professor de finanças do Ibmec, as alterações no IR tendem a liberar recursos não só para o consumo. Podem, por exemplo, reforçar o orçamento e fazer com que o consumidor pague dívidas.

- O efeito dessa medida é mais duradouro que o das demais - afirmou.

Redução do IOF não é fator fundamental para crédito

Braga acrescenta que as mudanças do IOF vão reduzir o custo do crédito para a pessoa física, já que a tributação cairá de 3% para 1,5%. Porém, para ele, essa redução não é fundamental para estimular a concessão de crédito no país.

- O IOF não é um quesito para as pessoas pegarem um crédito, mas sim o valor total do empréstimo. É claro que a medida ajuda, o governo está no caminho certo, mas ainda será necessária uma cesta de medidas para segurar a crise - disse Braga, para quem as medidas voltadas para a compra de carros são um "socorro pontual". - É um impacto localizado: as pessoas não compram carros todos os dias.

As centrais sindicais acham que o governo deveria ser mais ousado e lamentam que o corte do IPI não tenha sido condicionado à manutenção do emprego.

- Não foi o que a gente queria, mas o pacote é razoável. Na questão do IR poderia ter sido melhor. E no caso da redução do IPI para as montadoras, faltou a garantia do emprego - disse o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva.