Título: Collor quer voltar a Alagoas
Autor: Azedo, Luiz Carlos
Fonte: Correio Braziliense, 19/03/2009, Política, p. 08

Ex-presidente admite candidatura ao governo de seu estado. Em entrevista à TV Brasil, ele diz que se arrepende do que prefere classificar de ¿bloqueio¿ das poupanças e que caiu por falta de respaldo político

Humilde nas atitudes, arrependido pelos erros cometidos, contido nas palavras sobre os ex-desafetos, o ex-presidente Fernando Collor de Mello (PTB-AL) está de volta à política como quem refaz os próprios passos. Não admite uma futura candidatura à Presidência, mas é candidatíssimo ao governo de Alagoas, no qual se notabilizou como ¿caçador de marajás¿, a ponto de transformar o pequeno estado do Nordeste numa catapulta para o Palácio do Planalto. ¿Do jeito que as coisas estão, vou acabar sendo candidato ao governo¿, admite Collor, em razão do desentendimento entre o governador alagoano Teotônio Vilela Filho (PSDB) e o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (PMDB), outro cacique da política local.

Collor explica que Renan apoiou a eleição de Vilela com o compromisso de ele não concorrer à reeleição, mas o atual governador de Alagoas gostou do cargo. Como Renan discorda da condução dada ao governo local pelo tucano, quer que o ex-presidente da República dispute o governo estadual. Collor gostou da ideia e está animado. Passou dois anos se fingindo de morto no Senado Federal: ¿Eu tenho um perfil mais Executivo, precisava me ambientar mais, conhecer melhor a Casa¿. Voltou ao primeiro plano da política nacional ao assumir a presidência da Comissão de Infraestrutura do Senado, uma posição estratégica em razão do poder de examinar as nomeações para as agências reguladoras e fiscalizar a execução das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), principalmente nas áreas de energia, transporte e habitação.

Para ocupar o cargo, derrotou a ex-líder do PT no Senado, Ideli Salvatti (SC), com o apoio de Calheiros e do ex-presidente José Sarney. Até hoje não digeriu as declarações do líder do PT, senador Aloizio Mercadante, que classificou de ¿espúria¿ a aliança entre Collor, Renan e Sarney. ¿Ele não olha para o lado, precisa dobrar a língua quando vier falar sobre isso¿, comenta, numa mal-disfarçada irritação com um velho desafeto. Mercadante se notabilizou como deputado durante a CPI que apurou o caso PC Farias e implodiu seu governo.

O cargo de presidente da Comissão de Infraestrutura faz parte da estratégia de reconstrução da carreira política interrompida pelo impeachment, no auge do poder, e de construção da sua candidatura ao governo de Alagoas. Durante seu mandato na comissão, serão apreciadas 22 novas indicações de diretores das agências reguladoras e o andamento das obras do PAC, sob comando da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, candidata à sucessão de Lula, que conta com a simpatia de Collor.

Autocrítica Ontem, durante entrevista à TV Brasil, Collor passou a limpo sua breve passagem pela Presidência da República, num depoimento pautado pela autocrítica. A começar pelo confisco das cadernetas de poupança, no primeiro dia de governo, que jogou na lona o prestígio que havia conquistado em boa parte do eleitorado. ¿Quando apresentei o plano, o Luiz Eduardo (Magalhães) e o (Ricardo) Fiúza sugeriram que mandasse as propostas para o Congresso, mas os membros da equipe econômica fizeram sinal negativo com a cabeça¿, conta, arrependido. Segundo ele, porém, não houve um confisco. ¿As cadernetas foram bloqueadas¿, minimiza.

Outros ¿tropeços¿, na Presidência, foram admitidos por ele. ¿Naquela época, querendo fazer os ajustes de forma rápida, equivoquei-me. Certamente, eu não teria adotado um programa econômico que causasse tanto desassossego¿, revê. Esse é um dos ¿erros cruciais e fatais¿ que admite ter cometido. O principal deles, porém, foi ¿a falta de diálogo com a classe política e com São Paulo¿. Segundo Collor, essa foi a principal causa de sua deposição. ¿Um presidente da República, no presidencialismo, precisa conversar o tempo todo com os políticos, os empresários, a sociedade civil¿, explica. Considera-se, por isso, um grande injustiçado. Avalia que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o presidente Lula também teriam sido cassados se não contassem com o apoio político. Argumenta que tomou as medidas que julgou necessárias no Ministério Público quando surgiram as denúncias contra seu ex-tesoureiro de campanha, Paulo Cesar Farias, mas não teve respaldo político para enfrentar a crise.

-------------------------------------------------------------------------------- Memória Impeachment após dois anos

Prefeito de Maceió nomeado pelo regime militar em 1979, deputado federal em 1982 e governador de Alagoas em 1986, Collor foi o primeiro presidente da República eleito pelo voto direto desde o golpe de 1964. Jovem, não completou o mandato. Foram dois anos de crise na Presidência, que assumiu surpreendendo o país ao bloquear todo o dinheiro das contas-correntes e poupanças de empresas e pessoas físicas. A medida foi taxada de confisco. O país estava à beira do colapso, com uma inflação de 30% ao mês. Collor criticou a indústria automobilística brasileira por seu atraso tecnológico e abriu a economia do país aos investidores estrangeiros. Histriônico, gostava de chamar a atenção da opinião pública por meio de um comportamento inusitado para o cargo, como pilotar motos potentes pelas avenidas de Brasília e andar de jet-ski no Lago Paranoá, um luxo para a época.

Denúncias de corrupção, de favorecimento pessoal, escândalos envolvendo a vida pessoal: sua imagem foi desconstruída no plano político pela mesma mídia que incensou como candidato. Seu tesoureiro da campanha, Paulo César farias, montou um grande esquema de corrupção que acabou denunciado por um irmão do presidente, Pedro Collor, já falecido, que administrava as empresas da família em Alagoas. O caso virou uma CPI no Congresso. O golpe de misericórdia foi dado pelo ex-motorista dele, Eriberto França, que acusou Collor de se beneficiar diretamente do esquema de corrupção montado pelo ex-tesoureiro. Nas ruas, jovens de todo o país pediam a deposição do presidente: ¿Fora Collor¿.

O ex-caçador de marajás renunciou à Presidência em agosto de 1992, mas o Senado decidiu votar o impedimento e Collor teve os direitos políticos cassados por oito anos. O vice-presidente Itamar Franco assumiu o comando do país. Em 2006, Collor voltou ao Senado, a Casa que o condenou e agora o reabilita como senador por Alagoas.